Esqueleto de concreto do Cais das Artes está inacabado na Enseada do Suá, em 2018 Crédito: Vitor Jubini
Com obras paralisadas desde 2015, um impasse na Justica e uma possibilidade de ser concedido a startups para que fosse finalizado, o Cais das Artes, que vive um espiral de indefinições e incertezas típicos de um dramalhão mexicano, começa a vislumbrar um final feliz. Em entrevista a "HZ", Luiz Cesar Maretto, diretor-presidente do Departamento de Edificações e Rodovias (DER-ES), afirmou que o reinício das construções, paradas após uma ação judicial, pode acontecer em meados do segundo semestre de 2022, sem definir precisamente um mês.
"Estamos tentando um acordo com o Consórcio Andrade Valladares (responsável para construir o empreendimento) para retomar as atividades. Como se trata de um acordo judicial, é impossível precisar uma data. Nossa intenção é que as obras sejam retomadas em meados do segundo semestre", adianta, anunciando que, na última quarta-feira (11), recebeu um documento do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, questionando o andamento das obras no Cais das Artes.
A título de curiosidade, até 2018, o Governo do Espírito Santo havia investido, ao todo, mais de R$ 129 milhões no complexo que seria o maior espaço cultural do Espírito Santo, que, inicialmente, tinha inauguração prevista para 2012, com obras iniciadas em 2010.
"Nosso objetivo é terminar o Cais das Artes. Acredito que, possivelmente, teremos que investir cerca de R$ 100 milhões para concluir o complexo cultural. Após o reinício das obras, a previsão de término é de 18 meses", informa Maretto.
Vista aérea do Cais das Artes, na Enseada do Suá, em Vitória Crédito: CLEFERSON COMARELA/VIXFLY DRONES
Na sequência, Mareto explicou como serão os próximos passos para tentar viabilizar a obra ainda no segundo semestre.
"Na próxima semana, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) vai nos entregar um estudo com um levantamento de todos os pagamentos já feitos em relação ao espaço, incluindo o que precisa ser executado, com seus devidos valores. Após isso, haverá uma avaliação jurídica em conjunto com a Secretaria de Estado de Controle e Transparência. Ainda em maio, devemos apresentar esse levantamento a Andrade Valladares e será aberto um acordo para o retorno das obras", adianta o gestor.
O projeto do aparelho cultural é assinado pelo renomado e premiado arquiteto capixaba Paulo Mendes da Rocha, morto em 2021 sem ver a construção finalizada. Luiz Cesar afirma que o planejamento original deve ser mantido. "A área que era originalmente destinada ao estacionamento também servirá, em parte, para uma praça de vivência", adianta.
O QUE FALTA NO CAIS DAS ARTES
Desconsiderando novas avaliações que podem revelar que o Cais das Artes necessite de algum tipo de recuperação por dano causado pela ação do tempo no período em que a obra ficou parada, a edificação ainda tem pendente a conclusão do teatro, museu e uma praça (que já estava prevista no projeto original).
Ao todo, o teatro teria 600 metros quadrados com 1,3 mil lugares e um vão livre de mais de 25 metros de altura até o teto. O museu compreenderia um espaço de 2,3 mil metros quadrados com auditório para 225 pessoas, cinco salas de exposições, biblioteca, cantina, recepção e cafeteria. Já a praça original foi projetada para ter cafeterias, livrarias e espaços para espetáculos e exposições ao ar livre.
EVENTO
Para discutir a ocupação do espaço após ficar pronto, a Secretaria Estadual de Cultura (Secult/ES) e a Universidade Federal do Espírito Santo promovem, entre os dias 17 e 19 de maio, o simpósio "Cais + Arte". O evento busca debater temas pertinentes às atividades dos futuros museu e teatro (a serem instalados no aparelho cultural), além de discutir um formato de gestão do espaço.
"Vamos participar do evento, especialmente nas visitas guiadas às obras. É importantíssimo promover um diálogo entre comunidade e poder público. Mesmo sendo impossível atender a todos os pedidos, defendo que a gestão administrativa deva ser terceirizada, especialmente se for coordenada por uma ONG ou produtora cultural. Eles têm mais mobilidade para a contratação de shows e eventos, fugindo da tradicional burocracia do poder público", complementa.
A PARALISAÇÃO
Maretto acredita que a construção está paralisada por uma ação política. "Em 2014, na gestão Renato Casagrande (PSB), eu era diretor do IOPES (Instituto de Obras Públicas do Estado do Espírito Santo). Terminamos a construção do Estádio Kléber Andrade e, no mesmo ano, houve um robusto avanço no Cais das Artes. No ano seguinte, o novo governo decidiu fazer algumas auditorias de contrato e mais de 80 obras foram paralisadas, incluindo o Cais das Artes", explica, dando mais detalhes sobre o processo de judicialização do complexo cultural.
"O contrato com a Andrade Valladares iria ser finalizado por prazo, em maio de 2015. Faltando cinco dias para encerrá-lo, a empresa não recebeu as mediações do ano (espécie de pagamentos mensais). Ao perceberem que o prazo estava vencendo, a empresa resolveu entrar na Justiça, o que fez o contrato ser suspenso", comenta.
O CAIS DAS ARTES ANO A ANO
2010
Oficialmente as obras começaram em 2010, no fim do segundo mandato do governador Paulo Hartung. O investimento total seria de R$ 115 milhões.
2012
A previsão de entrega do empreendimento estava prevista para 2012, mas a Santa Bárbara, construtora que executava os serviços, faliu e, com isso, o contrato foi reincidido.
2013
Neste ano, as obras foram retomadas após uma nova licitação que contratou o Consórcio Andrade Valladares - Topus.
2015
As obras foram realizadas até maio de 2015, quando sofreram nova paralisação. Depois disso, no começo de junho, voltaram a prosseguir, mas, no mesmo mês, pararam novamente. Ainda em 2015, o governo anunciou que teria que contratar uma nova empresa, a terceira, para finalizar a construção. A entrega ficaria para 2018.
2016
Em agosto foi feita uma nova licitação, mas para contratar uma consultoria de engenharia, que faria uma avaliação da obra e um balanço do que ainda precisaria ser feito. Neste ponto, o governo do Estado já previa gastar entre R$ 80 milhões e R$ 100 milhões a mais no orçamento.
Neste ponto, desde 2010, o que foi construído nem chegou a ser utilizado e já precisou de reparos devido à ação do tempo e abandono ao empreendimento.
2018
Já em 2018, em abril, o Instituto de Obras Públicas do Estado do Espírito Santo (Iopes) licitou uma nova empresa para gerenciar a obra. A Planesp Engenharia ganhou a chamada no valor de R$ 3,8 milhões para executar o serviço.
Em julho deste ano, Paulo Hartung e a Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas (Setop) anunciaram que as obras seriam retomadas em dezembro de 2018 e deveriam ser entregues até 2020. Até então, já havia sido gasto, ao todo, mais de R$ 129 milhões com o que era para ser o maior espaço cultural do Espírito Santo, inicialmente, com entrega prevista para 2012. Com a previsão de gastos divulgada naquela época, o valor total chegaria à casa dos R$ 229 milhões.
Em setembro, o governo lançou edital para licitar a empresa que terminaria as obras do empreendimento. Mas, em outubro, suspendeu o edital sem data para republicá-lo.
2019
Em março, o governo decidiu retirar mais de R$ 14 milhões que custeariam parte das obras de finalização do Cais das Artes para abrir um crédito suplementar à Secretaria de Estado de Saneamento, Habitação e Desenvolvimento Urbano. Ainda em março, o Iopes garantiu que iniciou um processo de levantamento do equipamento cultural para ver o saldo da obra e retomar a execução do projeto com a empresa Andrade Valladares - Topus, a mesma que cuidava do canteiro de obras em 2015.
2020
Em janeiro, o governo esperava retomar as obras ainda em 2020. Em entrevista à Gazeta, o secretário de Estado da Cultura, Fabrício Noronha, disse que iria, também, intensificar um debate com a sociedade artística para falar sobre o futuro uso do local. Sobre as obras, na ocasião, o titular da pasta reiterou a necessidade de o processo na Justiça se resolver.
2021
Em janeiro, o secretário de Cultura disse que o governo pretendia retomar a construção do Cais das Artes no primeiro semestre do ano. Na época, o governo estava em discussão para entrar em acordo com a empresa que processou o Estado na Justiça.
Em maio, o DER-ES disse que estava finalizando um acordo internamente com a empresa responsável pela obra. Porém, a resposta que viria em poucos dias nunca chegou.
Ainda sem acordo, o governador Renato Casagrande anunciou em dezembro que pensa em duas alternativas para ter o espaço finalizado: regulamentar um contrato de gestão, com ajuda do Tribunal de Contas, para se ter um acordo e resolver o problema jurídico; ou conceder um espaço do Cais das Artes para empresas de tecnologia fazerem um hub de startups e custeiem a finalização da obra.
2022
Em janeiro, o Instituto de Arquitetos do Brasil no Espírito Santo (IAB-ES) utilizou as redes sociais para se manifestar contra a utilização do Cais das Artes para outros fins que não sejam artísticos e culturais, questionando a ideia do governador Renato Casagrande (PSB) de conceder um espaço do aparelho cultural para empresas de tecnologia fazerem um hub de startups, possibilitando assim a finalização do aparelho cultural.
Em maio, a Secretaria Estadual de Cultura (Secult/ES) e a Universidade Federal do Espírito Santo lançam o simpósio "Cais + Artes", visando debater temas pertinentes às atividades dos futuros museu e teatro (a serem instalados no aparelho cultural), além de discutir um formato de gestão do espaço.
No mesmo mês, em entrevista a "HZ", Luiz Cesar Maretto, diretor-presidente do Departamento de Edificações e Rodovias (DER-ES), revelou que, se for feito um acordo com o Consórcio Andrade Valladares em maio de 2022, as obras podem ser retomadas em meados do segundo semestre. Ainda de acordo com o gestor, mais R$ 100 milhões devem ser investidos para a conclusão do complexo cultural