Com show de Ed Sheeran, Rock in Rio Lisboa pende entre a sofrência e o rock

Festival, que ainda teve Evanescence, Scorpions e Jão, antecipa edição brasileira que celebra quatro décadas desde sua criação

Publicado em 17/06/2024 às 10h25
Ed Sheeran faz show na edição de 2024 do Rock in Rio Lisboa

Ed Sheeran faz show na edição de 2024 do Rock in Rio Lisboa. Crédito: Marcelle Tauchen/Divulgação

A décima edição do Rock in Rio Lisboa começou, neste último fim de semana, com uma amostra do que vai aparecer na Cidade do Rock carioca em setembro deste ano. Passaram pela edição portuguesa do festival artistas que têm viagem marcada para o próximo Rock in Rio no Brasil, como Ed Sheeran, Jão e a banda Evanescence.

O festival realizado em Lisboa, que ainda continua no próximo fim de semana, marca 20 anos da migração do evento brasileiro para Portugal. A estrutura foi erguida pela primeira vez no parque Tejo, que era um lixão a céu aberto até o ano passado, quando foi reformado para receber a Jornada Mundial da Juventude. Ali, em agosto, o papa Francisco celebrou uma missa para mais de 1 milhão de pessoas.

Agora, em vez de receber religiosos, os campos verdejantes ficaram repletos de fãs de rock e de sofrência romântica, cada uma dessas tribos num dia.

A programação do último domingo, foi mais mais pop e melosa, liderada por Sheeran, que na última década embalou incontáveis cerimônias de casamento com suas letras. O artista a todo tempo parou a apresentação para conversar com os fãs, explicando o contexto das canções e contando curiosidades.

Ele pediu que as lanternas dos celulares fossem ligadas em "The A Team", e depois organizou um cântico uníssono na apoteótica "Give Me Love". O britânico não deixou a atenção da plateia se dispersar ao espalhar seus hits ao longo da apresentação em vez de os concentrar no final, e o parque Tejo ficou lotado.

Antes dele, subiram ao palco os também britânicos Jake Bugg e Calum Scott, que falam de paixões em suas canções, e o brasileiro Jão, outro que canta os dramas do amor.

Jão, aliás, foi um dos primeiros brasileiros a cantar nesta edição na capital portuguesa. Ainda que muitos artistas do país façam sucesso em Portugal, caso de Anitta e Ivete Sangalo, o mesmo não pode ser dito a respeito dele. As fileiras da frente estavam repletas de fãs que sabiam cantar as letras, mas, do meio para trás, o público só balançava os ombros e boa parte estava sentada.

Este repórter questionou adolescentes e jovens adultos sobre a relevância do cantor entre os portugueses. Segundo eles, o artista toca nas rádios, mas não é tão conhecido. Seu alcance é incomparável ao de Anitta, eles dizem.

Não à toa, quem estava sentado levantou quando Jão tocou "Pilantra", parceria com a cantora. Os versos foram entoados baixinho, em uníssono, pelo público e os aplausos também foram tímidos.

Essa recepção morna também se estendeu aos outros artistas, embora Sheeran tenha empolgado mais. Os portugueses não são eufóricos como os brasileiros, que berram e pulam quase sem parar em shows de artistas estrangeiros. A timidez é estranha mas de certa forma benéfica, uma vez que era possível ouvir os artistas cantando com clareza, sem que os maus cantores da plateia atrapalhassem.

No último sábado, também houve recepções mornas à banda de rock Scorpions, há quase seis décadas em atividade, e ao Evanescence, que lançou hits de metal alternativo no começo dos anos 2000.

A escalação desse dia atraiu um público específico --o de roqueiros saudosistas. À tarde , quando o festival ainda estava vazio, passeavam pelo parque Tejo pessoas vestidas com camisetas dos Scorpions e de outras bandas de várias décadas passadas.

Havia bastante a fazer no espaço caso os artistas nos palcos não chamassem a atenção, já que o evento funciona em Lisboa nos mesmos moldes que no Rio de Janeiro --como um misto de festival de música e parque de diversões.

A tirolesa estava lá, passando em frente ao palco principal, além da roda-gigante. Foram espalhados estandes de marcas com jogos e distribuição de brindes. O campo do espaço ficou lotado --o que prejudicava a locomoção do público em alguns momentos, especialmente no final da noite. A visão dos palcos, no entanto, era boa, com elevações no solo que permitiam que o público mais afastado enxergasse os artistas, ainda que às vezes recorrendo ao telão.

O dia com Evanescence como um dos destaques acabou dando um vislumbre do que será a próxima edição do evento brasileiro, que também convidou Ed Sheeran e Jão para tocar no Rio de Janeiro.

A repetição de artistas entre os eventos de Brasil e Portugal faz parte do público desconfiar que o Rock in Rio fecha pacotes com os músicos --teoria negada em conversa com jornalistas brasileiros por Luis Justo, CEO da Rock World, empresa que organiza o festival.

"Às vezes calha de os artistas estarem na Europa na época do verão europeu e de olho na América do Sul para setembro. Quando isso acontece, ainda mais nesse ano que a gente está transmitindo alguns shows para o Brasil, ajuda a criar [expectativa] nos fãs brasileiros. Mas não é algo que a gente consiga planejar", ele afirmou.

No Brasil, as expectativas para a edição que comemora os 40 anos de criação do evento são altas, e o Rock in Rio criou um dia reservado somente aos artistas brasileiros. Além disso, convidou pela primeira vez cantores sertanejos, um pedido antigo do público.

A iniciativa trouxe acusações de que o festival estaria se descaracterizando e perdendo a sua essência roqueira.

"A pergunta não deveria ser 'por que sertanejo?', mas 'por que não sertanejo?'. É a música mais ouvida no Brasil", afirmou Roberto Medina, o criador do festival, em conversa com jornalistas brasileiros. "Tem uma coisa [de parte do público] com rock antigo que não tem nada a ver. Tem que ter todo mundo no festival. Dizem 'aquilo já foi rock, depois foi se transformando em pop'. É mentira", acrescentou o empresário, em Lisboa.

A família Medina ainda tocou, ao longo do fim de semana, em outros pontos polêmicos que cercaram a empreitada nos últimos anos. Roberta Medina, vice-presidente da Rock World, falou sobre a relação com Anitta, estremecida há dois anos quando a artista escreveu em suas redes sociais que só se apresentaria no festival se a produção desse aos artistas que falam português o mesmo respeito que tinha com os estrangeiros.

"Foi forte, precipitado e desnecessário. Não existe dizer 'nunca mais'. A gente acerta, erra e amadurece. Isso vale para todos os lados", afirmou Roberta Medina. "Se me perguntassem se quero a Anitta no Rock in Rio, as portas estão abertas. Agora, não foi legal [o que ela disse]. A gente fica um tempo de bode, mas por que as relações não podem se amadurecer?", acrescentou.

Roberta Medina ainda disse que consideraria abrir espaço para Drake no line-up mesmo depois de a família ter feito comentários negativos após sua apresentação em 2019. "Vai que ele amadurece, para de dar sustos e volta a ser bemvindo?", ela disse à imprensa.

O Rock in Rio Lisboa recebeu 80 mil pessoas em cada dia no último final de semana, que teve ingressos esgotados. Entre os brasileiros que se apresentam na próxima semana estão Ivete Sangalo, Luísa Sonza e os funkeiros Pedro Sampaio e MC Cabelinho. Os destaques internacionais são Jonas Brothers e Doja Cat. A próxima edição do festival está confirmada para 2026, segundo a organização.

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