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Publicado em 13 de novembro de 2021 às 08:00
Imagine um lugar marcado pelo afeto e acolhimento, um "microcosmo" bucólico, que une paz, valorização da natureza e o amor à cultura, em seu sentido mais orgânico? Sim, esse lugar existe e não está muito longe da correria urbana da Grande Vitória.
Nem precisa "filosofar" para descobrir que estamos falando da Vila das Artes, em Jacaraípe, na Serra, um cantinho do bairro que reúne artistas e diversos ateliês abertos diariamente, onde as artes visuais reinam soberanas entre em quadros, mosaicos, bonecas, esculturas em formato surrealistas e peças confeccionadas com elementos encontrados na natureza. Tudo feito com simplicidade, esmero e carinho.
O vilarejo teve origem com a famosa Casa de Pedra, o ateliê mais antigo da região, construído na década de 1990. Os muros da residência foram feitos de raízes e pedras, dando a impressão de tratar-se de uma fortaleza.
Além de ser um patrimônio artístico da Serra, o espaço é referência para o turismo e o sistema educacional do município, recebendo escolas e promovendo oficinas culturais. Na Vila das Artes, o saber artístico (e o amor pela cultura) também é passado para as futuras gerações.
Na Casa, raízes e troncos reaproveitados são transformados pelas mãos "mágicas" de seu Nelso Ribeiro (também conhecido como Neusso). O formato das obras é livre e vai de cavalos surrealistas a figuras abstratas, como se fossem corpos que podem ser montados aos pedaços, numa citação ao clássico "Amor e Restos Humanos", do autor canadense Brad Fraser e adaptado para o cinema por Denys Arcand.
"Minha inspiração para construir as obras vem da mãe natureza. Recolho elementos que encontro nas ruas, como pedaços de madeira, e vou esculpindo as estruturas. Com o tempo, perdi a referência do que é feio ou bonito. A arte é superior a isso, é o reaproveitamento da natureza", afirma, em tom de poesia, Neusso, sempre disposto a apresentar a Vila a todos que a visitam.
Na Vila das Artes - que conta com cerca de nove estabelecimentos, sendo o recém-inaugurado Restaurante da Vila das Artes um dos chamarizes, reunindo artes visuais e culinária - a paixão pela cultura vem de mãe para filha. Como é o caso de Dida Áurea Thomé e Maria Marta Tomé, que, juntas, comandam o Espaço Ecoternura.
Dida, uma artista de palavras que sempre confortam, trabalha com raízes, pedaços de madeira, e cascas de coco, produzindo uma obra orgânica, com quadros e cartões multicoloridos. Algumas peças representam (de forma lúdica e sensível) as favelas dos grandes centros urbanos. Ela chegou a publicar um livro, "Ecoternura: Novo Ciclo", em que mostra suas obras em meio a poesias. A filha, Marta, Mestre em Artes Visuais, também embarca na vibe ecossustentável.
"Trabalhamos com a revitalização respeitosa de elementos naturais, como pedras e folhas. Um sentimento de ressignificação de materiais", explica.
Bem próximo à porta da casa, encontramos uma imagem pintada de São Francisco de Assis. "Ele é um exemplo a ser seguido por todos nós, pois teve uma vida integrada à natureza e aos animais", detalha Marta.
Em frente ao Ecoternura, bem do ladinho, entre a tranquilidade da rua e a presença de cachorros sempre esperando por atenção, encontramos Vera Silva, funcionária pública que se dedica ao artesanato há cerca de dez anos. Ela administra o atelier Arte de Viver.
"Trabalho com escultura de bronze, metal e alumínio, além de mosaicos e telas em acrílico. Gosto de fazer figuras femininas, pois representam a essência do amor", descreve Vera, que, ao lado da também artista visual Agda Matos, promove oficinas culturais.
"Ela faz um trabalho com bonecas africanas chamadas Abayomi, uma arte ancestral, criada por mulheres para acalentar seus filhos durante viagens a bordo dos tumbeiros, os navios que traziam escravos para o Brasil. Sem costura alguma (apenas nós ou tranças), as bonecas não possuem demarcação de olho, nariz nem boca", detalha.
Além de ancestralidade, a Vila das Artes inspira uma sensação de recomeço em muitos de seus moradores. Esse é o sentimento de Vera Ferreira, psicóloga que deixou a profissão e passou a viver do artesanato produzido por seu atelier (que leva seu nome). Vera, autodidata como muito dos moradores do vilarejo, se especializou em fazer trabalhos com conchas, ostras e sementes de ipê, que consegue da árvore plantada em sua casa.
"Estar aqui, respirando arte e ao lado de artistas, foi a forma que encontrei para ressignificar minha vida, um jeito alternativo de estar e pertencer ao mundo", filosofa, sempre com um delicioso (e afetuoso) cafezinho para oferecer a quem lhe faz uma visita.
Já ia esquecendo: nos fins de semana de novembro, o vilarejo está promovendo a Feira Cultural da Vila das Artes, que acontece aos sábados e domingos, até o dia 28. São oficinas, visitações e apresentações artísticas, com todas as atrações gratuitas. Quer oportunidade melhor para conhecer o local?
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