Um dos principais eventos literários do ano, a Festa Literária Internacional de Paraty começa neste sábado, 27, sua segunda edição virtual consecutiva, por força das restrições sanitárias da pandemia.
Pela primeira vez na história, a organização da Flip elegeu um tema geral para a festa em vez de um autor homenageado. A programação toda girará em torno da relação da literatura com as plantas e a floresta.
"Na pandemia, a humanidade reduziu sua mobilidade e experimentou temporalidade menos frenética, que são características mais associadas ao reino vegetal", diz o manifesto divulgado pelo evento. "Chegou a hora de pensar e aprender com as plantas."
Terceiro dia da 15ª Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), realizada na cidade de Paraty, no sul fluminense, em 2017. Crédito: Bruno Santos/Folhapress
Também é inédita a curadoria feita por cinco intelectuais de diversas áreas, quando a Flip tradicionalmente convidava uma pessoa para ocupar a posição.
A autodenominada "floresta curatorial" é composta pelo antropólogo Hermano Vianna, colunista deste jornal; a educadora e editora Anna Dantes, o escritor Evando Nascimento, doutor em filosofia; o antropólogo João Paulo Lima Barreto, do povo tukano, do Alto Rio Negro; e o professor de literatura Pedro Meira Monteiro, da Universidade Princeton.
Em entrevista a este jornal, os curadores afirmaram que a Flip deste ano é uma plataforma para lançar uma ideia, assumindo a vanguarda no debate sobre a virada vegetal, que propõe dar centralidade à visão das plantas.
As dezenas de autores convidados passam todos, de alguma forma, por essa discussão. Houve um esforço ainda de misturar diferentes áreas em cada mesa, pondo a ciência para conversar com a literatura, a poesia com a ficção, a música com a filosofia.
As 19 mesas da programação, que se estendem por nove dias seguidos até 5 de dezembro, poderão ser vistas gratuitamente pelo canal do YouTube da Flip.
Acompanhe a seguir a programação dia a dia, com a listagem dos principais autores e livros desta edição, assim como todas as reportagens e resenhas que este jornal publicou recentemente sobre eles.
Sábado, 27 de novembro
- 16h: A abertura da programação trará o líder indígena Carlos Papá e a educadora Cristine Takuá conduzindo uma cerimônia guarani. A festa traz ao centro o conceito de "Nhe'éry", termo que literalmente significa "onde as almas se banham" e é usado pelo povo guarani para designar a mata atlântica, bioma em meio ao qual está a cidade de Paraty.
- 18h - Mesa 2 - Literatura e plantas
- O botânico italiano Stefano Mancuso, que publicou "A Planta do Mundo" e "A Revolução das Plantas" pela editora Ubu, conversa com Evando Nascimento, um dos curadores do evento, que é pioneiro na pesquisa sobre literatura pelo viés das plantas e acaba de lançar pela Record "O Pensamento Vegetal".
Domingo, 28 de novembro
- 16h - Mesa 3 - Naturalismo e violência
- Micheliny Verunschk, poeta e romancista elogiada por "O Som do Rugido da Onça", publicado este ano pela Companhia das Letras, conversa com o franco-senegalês David Diop, autor que venceu o prêmio International Booker por "Irmão de Alma", que saiu no Brasil pela editora Nós. A casa publica em breve também seu ensaio "A Porta da Viagem sem Retorno". Os dois autores pautam a violência colonial. Enquanto a pernambucana fala sobre o desterramento de crianças indígenas brasileiras, Diop fala da participação de soldados da costa ocidental africana na Primeira Guerra Mundial.
- 18h - Mesa 4 - Folhas e verbos
- Edimilson de Almeida Pereira, que venceu esta semana o prêmio São Paulo de literatura pelo romance "Front", da editora Nós, conversa com a francesa Véronique Tadjo, autora de origem marfinense. Seu livro "Na Companhia dos Homens", ainda não publicado no Brasil, conta o massacre de uma aldeia pelo ponto de vista de um baobá, enquanto os poemas de Pereira também trazem a conexão da ancestralidade negra com o mundo vegetal.
Segunda, 29 de novembro
- 18h - Mesa 5 - Plantas e cura
- João Paulo Lima Barreto, um dos curadores da festa literária e fundador do Centro de Medicina Indígena, discute os saberes dos povos originários nesse campo com a ecóloga australiana Monica Gagliano e a agricultora Silvanete Lermen.
Terça, 30 de novembro
- 18h - Mesa 7 - Zé Kleber: micélios
- O biólogo britânico Merlin Sheldrake, que expôs seu estudo sobre a importância dos fungos para o mundo no recém-lançado "A Trama da Vida", da editora Fósforo, dialoga com o cientista paratiense Jorge Ferreira.
- 20h - Mesa 8 - Tecnobotânicas
- Giselle Beiguelman, professora da Universidade de São Paulo e autora de "Políticas da Imagem", da Ubu, discute com K. Allado McDowell, pessoa não binária especialista em tecnologia e inteligência artificial que trabalhou por anos no programa Artists + Machine Intelligence do Google.
Quarta, 1º de dezembro
- 18h - Mesa 9 - Fios de palavras
- O poeta carioca Leonardo Fróes, uma das maiores referências brasileiras na realização de literatura inspirada pela botânica, completou 80 anos em 2021 e ganhou uma coletânea abrangente na editora 34. Ele participa da mesa ao lado das também poetas Júlia de Carvalho Hansen e Cecilia Vicuña, chilena que articula na literatura e nas artes plásticas a resistência à ditadura pinochetista e a representação dos povos indígenas do país.
- 20h - Mesa 10 - Utopia e distopia
- A escritora canadense Margaret Atwood, autora da distopia "O Conto da Aia" e da sequência "Os Testamentos", publicadas pela Rocco, é uma das convidadas de maior destaque da edição deste ano. Ela divide a mesa com o cientista brasileiro Antonio Nobre. Atwood deu uma entrevista à Folha em setembro, na qual comparou a cultura do cancelamento ao totalitarismo, rebateu críticas de viés racial a sua obra e discutiu o que mudou no mercado editorial ao longo de seus 60 anos de carreira.
Quinta, 2 de dezembro
- 18h - Mesa 11 - Botânicas migrantes
- A palestra reúne duas autoras que publicaram romances de destaque este ano. A angolana Djaimilia Pereira de Almeida trouxe ao Brasil pela Todavia seu romance "A Visão das Plantas", destaque no prêmio Oceanos que conta a história de um ex-capitão de navio negreiro que se dedica ao jardim em sua aposentadoria. A autora, que tem publicado textos de ficção regulamente na Ilustríssima, explicou à Folha, na época do lançamento, o que a motivou a refletir de forma profunda sobre a questão da culpa e da consciência em um personagem tão aterrador. Já Elif Shafak, uma das escritoras mais lidas na Turquia, publicou pela HarperCollins o livro "10 Minutos e 38 Segundos neste Mundo Estranho", finalista do Booker que relata o feminicídio de uma prostituta e foi acusado em seu país de obscenidade. Em entrevista concedida em julho, ela discutiu as ameaças da censura e do populismo no mundo.
- 20h - Mesa 12 - Políticas vegetais
- O americano Kim Stanley Robinson, autor que faz ficção científica partindo quase sempre da catástrofe climática e que publicou "Nova York 2140" pela Planeta, conversa com a jornalista Eliane Brum, que publicou "Banzeiro Òkòtó: Uma Viagem à Amazônia Centro do Mundo" pela Companhia das Letras.
Sexta, 3 de dezembro
- 20h - Mesa 14 - Vegetalize
- A mesa reúne a sul-coreana Han Kang, da brutal sátira "A Vegetariana" e da trama política de "Atos Humanos", e a escritora brasileira Adriana Lisboa, que já ganhou o prêmio José Saramago e este ano lanlçou a coletânea de poemas "O Vivo", pela Relicário,
Sábado, 4 de dezembro
- 16h - Mesa 15 - Transflorestar - ato um
- O filme com direção, roteiro e atuação da compositora Iara Rennó estreia em meio à programação da Flip. Com participação de Curumin, Thalma de Freitas e Ava Rocha, Rennó se inspira no pensamento de intelectuais como Davi Kopenawa e Eduardo Viveiros de Castro para pensar novos mundos possíveis.
- 18h - Mesa 16 - Ouvir o verde
- O romancista chileno Alejandro Zambra, que pautou as plantas em livros como "Bonsai" e "A Vida Privada das Árvores", conversa com a poeta mineira Ana Martins Marques, que pensa a natureza em obras como "O Livro dos Jardins".
- 20h - Mesa 17 - Em busca do jardim
- A mesa traz o encontro entre duas das maiores autoras negras vivas, a brasileira Conceição Evaristo, de "Ponciá Vicêncio" e "Olhos d'Água", e a americana Alice Walker, vencedora do Pulitzer por "A Cor Púrpura".
Domingo, 5 de dezembro
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- 16h - Mesa 18 - Metamorfoses
- O filósofo italiano Emanuele Coccia, considerado um dos principais responsáveis por disseminar o conceito de "virada vegetal" que inspirou esta Flip a dar protagonismo às plantas, conversa com a cantora Adriana Calcanhotto, que construiu durante sua residência na Universidade de Coimbra o concerto-tese "A Mulher do Pau Brasil", de inspirações antropofágicas.
- 18h - Mesa 19 - Cartografias para adiar o fim do mundo
- Na mesa de encerramento, o líder indígena Ailton Krenak, autor de "Ideias para Adiar o Fim do Mundo" e "A Vida Não É Útil", publicados pela Companhia das Letras, pensa os desafios do país ao lado de Muniz Sodré, colunista deste jornal e autor de "Pensar Nagô" e "A Sociedade Incivil", editado pela Vozes. A conversa aproxima as raízes do pensamento indígena à do afro-brasileiro, com o objetivo de mapear futuros possíveis para o Brasil.
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