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Publicado em 1 de abril de 2022 às 12:01
Chico César e Geraldo Azevedo, dois ícones da MPB e, por consequência, da música nordestina. Duas vozes de gerações distintas, mas de talento inquestionável, promovem um verdadeiro encontro de titãs no espetáculo "Violivoz", que desembarca em Vitória (para deleite dos capixabas!), neste domingo (3), a partir das 19h, no Espaço Patrick Ribeiro.
Como o nome sugere, a apresentação abusa do tom intimista, no estilo voz e violão. No repertório, do cancioneiro de Geraldo Azevedo, aparecem "Táxi Lunar" (talvez seu clássico marcante), "Moça Bonita", "Dia Branco" e "Bicho de Sete Cabeças"; já "Deus Me Proteja", "Pensar em Você", "Onde Estará o Meu Amor" e "Reis do Agronegócio", vem do "baú de sucessos" de Chico César.
"Mama África", grande hit do paraibano, não fica de fora e ganha companhia de "Pra Não Dizer que Não Falei das Flores", de Geraldo Vandré. A faixa, lançada em 1968, ano de forte repressão política, especialmente com o AI-5, virou hino de resistência contra a ditadura militar.
Lançada em agosto de 2020, durante o período de isolamento social por conta da Covid-19, "Nem na Rodoviária", primeira parceria da dupla, também está no setlist.
Em bate-papo com "HZ", Geraldo falou do surgimento da parceria aplaudida pelos fãs. "A ideia nasceu de um encontro informal na casa de Chico, depois do show de lançamento do meu EP "É o Frevo, É Brasil", em São Paulo. Ficamos tocando juntos e surgiu a vontade de levar esse encontro pro palco em algum momento. Isso aconteceu um ano antes da pandemia", relembra Azevedo.
"A previsão era lançar a turnê em maio de 2020. Gestamos essa ideia por muito tempo até conseguirmos estrear o show em outubro de 2021, um ano e cinco meses depois do previsto. Em fevereiro, tivemos que adiar muitos shows novamente por conta da variante Omicron. Agora, estamos voltando à estrada com a agenda cheia e muito felizes", responde, empolgado.
Por ser um encontro muito desejado, Geraldo e Chico César se debruçaram sobre o repertório do espetáculo com esmero. Sem dúvidas, foram horas pensando - e decupando - sobre cada faixa.
"(O repertório) Foi se desenvolvendo pelo afeto ao trabalho um do outro. Cada um escolheu o que queria cantar e fomos agrupando as canções naturalmente. Muitas são atemporais e combinam entre si. Originalmente, havíamos pensado em fazer um rodízio no palco, como fazemos em outros projetos coletivos. Mas para o 'Violivoz' decidimos que estaríamos juntos no palco o show todo, cantando e tocando juntos as músicas de ambos", explica Azevedo.
Geraldo, de 77 anos, com forte influência da MPB em sua formação artística, e Chico, de 58, vindo e uma geração marcada pela força do rock, mesclam no palco um pouco de suas referências.
"O fio condutor que une os nossos trabalhos é o violão brasileiro. Ambos somos muito influenciados pela forma de tocar o instrumento, bebemos da mesma fonte. A nossa música tem uma interseção natural. Por exemplo, "Pensar em Você" é filha de "Dia Branco". O universo da canção é feminino, e uma vai dando cria à outra", filosofa Azevedo.
"A gente conseguiu criar diálogos entre nossas canções, alguns até impensáveis. A gente se apropria muito um das canções do outro e essa integração nos inspira muito. Além do mais, o canto do Chico é muito importante. Ele tem uma tessitura de voz muito ampla. Sinto que existe uma conexão entre as nossas vozes. Quando Chico canta, parece que a minha voz vai mais além".
E a troca de elogios foi mútua. Também em bate-papo com "HZ", que, nesse caso, "jogou nas 11", Chico César expressou toda sua admiração em relação ao colega de turnê.
"Acompanho a carreira do Geraldo desde o início. Além das músicas que falavam do meu universo, o espírito de partilha e parceria, de fazer algo junto, me chamou atenção. Ele me ensinou ainda cedo o poder de uma canção composta e tocada tendo o violão como base, me ensinou o valor dos projetos coletivos e que é possível viver de nossa arte até perto dos 80 anos com bastante vivacidade e dignidade. O trabalho dele frutificou e ajudou a moldar uma nova geração da qual faço parte", explica.
Após dois anos de pandemia da Covid-19, perguntamos a Chico César se seu processo criativo mudou nesse período, até por conta da adaptação à chamada "nova realidade".
"Fiz umas 100 músicas sozinho e mais umas 20 com Zeca Baleiro, umas tantas que mandei pra Bethânia. Fiz várias com Fausto Nilo, com Bráulio Bessa… O que me salvou, acho, foi que minha subjetividade estava muito alimentada da vida antes da pandemia. Rapidamente, me vi num lugar de escuta mais do que de fala, como uma caixa de ressonância dos afetos e de crítica que a sociedade estava gerando naquele momento", conta, parando para pensar antes de continuar desenvolvendo a linha de raciocínio.
"Eu 'tava' com uma antena, com uma esponja pegando tudo. No geral, estava mesmo ativo, com a energia lá em cima. Então comecei a trocar a noite pelo dia e logo estava compondo sobre muitas coisas, não só sobre a pandemia. Compus canções de amor, críticas, de protesto, frevo… A vida é amiga da arte e ambas não começaram agora e também não vão terminar conosco. Elas vêm de antes da gente e também já estão na frente da gente. O que estamos fazendo agora já é vida lá na frente, já está vivo lá. A gente é que talvez não esteja", complementa, em tom existencialista.
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