Julia Almeida lança EP "Samba na Sombra". Crédito: Sydney Porto
Se observarmos a arte como linguagem polissêmica (com vários meios e formas de expressão), é natural sintonizarmos música e literatura na mesma vibe. Com base nesse pluralismo, nasceu o segundo EP de Júlia Almeida, "Samba na Sombra", que tem como inspiração a poetisa Haydée Nicolussi (1905-1970), a primeira escritora modernista do ES, cuja obra ela pesquisa desde 2019.
O trabalho traz cinco faixas inéditas compostas no período da pandemia: "O Samba não Pode Parar", "Futuro de um Amor Pretérito", "Incendeia", "Festa do Samba" e "Águas de Oxum".
Todas as composições são de Júlia Almeida, sendo "O Samba não Pode Parar" e "Águas de Oxum" feitas em parceria com Sidney Porto. "Depois que gravei as cinco faixas, vi que foram compostas na pandemia e que tinham a ver com a superação de um momento difícil, e o samba é mestre nisso", comenta a artista.
Mas, onde entra a menção à eterna Haydée? O título do álbum é uma referência a "Festa na Sombra", livro publicado pela escritora em 1943. Da mesma forma, a faixa "Incendeia" promove uma homenagem à poetisa nascida em Alfredo Chaves, por meio de um samba cuja melodia aposta no verso "Quem Nasceu para Iluminar não pode ver sua Chama se Apagar".
"Num primeiro momento, minha pesquisa sobre Haydée Nicolussi enfocou a politização de sua escrita a partir de 1930, acompanhando sua trajetória nas sombras (fascismo crescente, Estado Novo, Segunda Guerra Mundial) dos anos 1930 até 1945", conta a compositora, que é professora do Departamento de Línguas e Letras da Ufes.
"Vi a relação estreita dela com outras escritoras e agora estou me aprofundando nisso, resgatando a memória dessas mulheres que foram muito revolucionárias no pensamento político, na inserção no campo literário, nos comportamentos e na vida social, produzindo obras que se comunicam e que constituem um discurso feminista importante", acrescenta.
RIO DE JANEIRO
Gravado no Apê Estúdio, na Lapa (RJ), com acompanhamento do produtor e multi-instrumentista Paulista, "Samba na sombra" descortina a potência criativa de Júlia Almeida e sua intimidade com o samba, gênero com o qual possui ligação desde a adolescência, quando se mudou com a família de Manhumirim (MG) para Niterói (RJ).
Ao longo das cinco faixas do álbum, percebem-se ecos de Dona Ivone Lara, Clara Nunes, Beth Carvalho, Cartola e Nelson Cavaquinho, entre outros sambistas que influenciaram Júlia.
Como estamos em épocas de "carnaval", é pertinente destacar "O samba não pode parar", que possui ritmo de samba-enredo. "O amor é aquilo que faz que a vida prossiga em paz/Que os dias de monotonia tenham uma razão de ser/Eu puxo, afino o cavaco, ela tira o pandeiro do sol/Fazemos um samba a dois por um tempo melhor pra nós".
Professora da Ufes, Júlia Almeida está lançando novo trabalho musical. Crédito: Sydney Porto
Em “Futuro de um amor pretérito”, a compositora brinca com as conjugações verbais para descrever um amor que fracassou. Outro destaque é a já citada "Incendeia", dedicada a Nicolussi. A faixa se revela um samba com sonoridade que lembra tempos idos e a melodia abrilhantada pelo coro.
Após a disponibilização do EP nas plataformas digitais, Júlia Almeida participa de uma roda de samba nesta sexta (22), às 18h, na quadra da Escola de Samba Unidos da Macrina, em Alfredo Chaves. Foi na cidade de Haydée Nicolussi, com a qual mantém laços afetivos, que ela compôs o material gravado no disco: "Durante a quarentena ficamos em Matilde (distrito de Alfredo Chaves) e a composição representou uma terapia naquele período", relembra.
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