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Publicado em 15 de setembro de 2023 às 14:59
Grandes clássicos do cinema nacional ganharão exibição, com entrada franca, em Vitória e Vila Velha, com a chegada da mostra itinerante A Cinemateca é Brasileira ao Espírito Santo.
Na capital, as sessões fazem parte do 30º Festival de Cinema de Vitória, que começa na segunda (18) e segue até sábado (23) com programação e atividades totalmente gratuitas em vários pontos da cidade.
Com o patrocínio estratégico do Instituto Cultural Vale e curadoria da Cinemateca Brasileira, a programação passeia por diferentes momentos históricos, propostas estéticas e abordagens temáticas, demonstrando a riqueza do cinema brasileiro ao longo dos mais de um século de história. Os longas apresentam um recorte da produção brasileira dos anos de 1929 a 2022.
A seleção da capital capixaba traz os filmes imperdíveis, que prometem causar grande impacto ao serem conferidos na tela grande, como "São Paulo: a Sinfonia da Metrópole" (1929), de Rodolfo Lustig e Adalberto Kemeny, produção realizada nos primeiros tempos do cinema brasileiro; "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), o mais conhecido trabalho de Glauber Rocha, que concorreu no Festival de Cannes; "O Bandido da Luz Vermelha" (1968), de Rogério Sganzerla, clássico do cinema marginal; "Cabra Marcado para Morrer" (1984), de Eduardo Coutinho, documentário dos anos 1980 que causou grande impacto no mundo todo; e "Marte Um" (2023), de Gabriel Martins, filme exibido no Festival de Sundance e premiado no Festival de Gramado. As sessões acontecem de 19 a 23 de setembro, de terça a sexta, às 14 horas, e no sábado, às 13 horas, no Sesc Glória.
É impossível destacar apenas um título em meio a essa paleta de clássicos, mas - com toda a correria do festival - se for preciso selecionar algo para ver entre tantas opções, vá pelo certo: "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964).
A obra-prima surrealista de Glauber Rocha, um dos projetos que firmou a base do Cinema Novo, se destaca pela ousadia narrativa e perfeição técnica (a começar pela aridez da fotografia de Waldemar Lima) que servem de plataforma para o realizador baiano colocar em prática sua crítica social em relação à exploração do povo em meio à pobreza do sertão nordestino.
Segundo Glauber, as metáforas também servem como um libelo contra o colonialismo, sendo baseada no pensamento do teórico argelino Franz Fanon, autor de "Os Condenados da Terra" (1961).
Na trama, a trajetória de Rosa (Yoná Magalhães) e seu marido, o vaqueiro Manuel (Geraldo del Rey), que assassina o patrão explorador. O casal busca refúgio em uma comunidade messiânica de Monte Santo, Bahia, formada por seguidores do Beato Sebastião (Lídio Silva). A pregação do líder, um personagem que encarna o messianismo nordestino, anuncia a transformação do mundo e o fim do sofrimento dos pobres.
Em Vila Velha, a mostra A Cinemateca é Brasileira contará com outros títulos, mas não menos representativos. Entre os selecionados, "Carnaval Atlântida" (1952), de José Carlos Burle e Carlos Manga; "Jeca Tatu" (1959), estrelado pelo inesquecível Mazzaropi, "O Pagador de Promessas" (1962), de Anselmo Duarte, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976), de Bruno Barreto, "Central do Brasil" (1998), de Walter Salles, vencedor do Urso de Ouro em Berlim (trailer), "Bacurau" (2019), de Kleber Mendonça Filho, e "Ilha das Flores" (1989), premiado curta de Jorge Furtado.
As sessões, sempre gratuitas, acontecem de 26 a 30 de setembro, no Cine Teatro Estação Cidadania Ilha das Flores, no CRAS Ilha das Flores. Os "mais espertos" podem se agendar e conferir as mostras de Vix e VV, sem perder um único (e imperdível) filme.
Maria Dora Genis Mourão, Diretora Geral da Cinemateca Brasileira, destaca a importância da mostra itinerante para a cultura do país, como também sua potência em descentralizar o fazer audiovisual fora do eixo Rio/São Paulo.
"Mostramos também um pouco do trabalho da Cinemateca, que se destaca pela preservação da identidade do audiovisual brasileiro. O Brasil precisa ver esses filmes de perto e nada melhor do que essa itinerância. A mostra casa perfeitamente com outras ações que estamos desenvolvendo, como o 'Projeto Nitratos', que restaura filmes raros do cinema brasileiro produzidos em nitrato de celulose, muitos ainda da fase silenciosa", adianta a gestora.
A convite do Instituto Cultural Vale, HZ visitou a Cinemateca Brasileira, em São Paulo, e pode conferir a execução do "Projeto Nitratos". Trata-se de uma inestimável iniciativa de preservação e acesso aos primórdios do cinema brasileiro. O trabalho viabiliza a conservação e catalogação de uma coleção de três mil rolos de imagens, como cinejornais, documentários, ficção, filmes domésticos e publicidade, produzidos entre as décadas de 1910 e 1950, muitos remanescentes do cinema silencioso.
É a primeira vez em 65 anos que a Cinemateca recebe recursos especificamente para tratar o conjunto da coleção de nitratos, a mais antiga e frágil da produção nacional. A iniciativa inclui ainda a digitalização de títulos para difusão e ações de formação técnica e cultural. Para se ter ideia da preciosidade, a instituição guarda os rolos em estações, como se fossem bunkers, longe da luz e da umidade, trancadas entre grades e de acesso ultra restrito, pois o material é altamente perecível e inflamável. HZ entrou em uma das salas e teve poucos segundos para registrar o momento em uma foto.
Na coleção de Nitratos, estão filmes raros, como "Ciclo Recife" (1923-1931), Cinejornais do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo (1938-1946), Cinejornal da Agência Nacional (a partir de 1946), documentários como "São Paulo, a Symphonia da Metrópole" (1929), e o primeiro longa-metragem de animação da história do Brasil, "Sinfonia Amazônica" (1953). A expectativa é que a conclusão da primeira parte do projeto se dê em um ano.
"Estamos ao lado da Cinemateca por entender a importância da casa da produção audiovisual brasileira, uma das maiores instituições do gênero no mundo, que preserva, também, um retrato da nossa própria identidade. Por isso atuamos em iniciativas pela sustentabilidade e modernização do espaço e pela salvaguarda de seu acervo, em especial a coleção de filmes em nitrato de celulose, de valor inestimável", diz Hugo Barreto, diretor-presidente do Instituto Cultural Vale, que é patrocinador estratégico da Cinemateca Brasileira. Na ação, foram investidos cerca de R$ 13 milhões, via Lei Rouanet.
Importante ressaltar que os três mil rolos guardados pela instituição correspondem praticamente à totalidade das obras remanescentes do cinema antigo no Brasil, pois a Cinemateca, a partir da criação do seu Laboratório de Restauro, em 1976, passou a concentrar todos os títulos sobreviventes em arquivos e cinematecas do país.
* O repórter viajou a São Paulo a convite do Instituto Cultural Vale
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