"Os Primeiros Soldados", de Rodrigo de Oliveira, terá estreia mundial em festival na Alemanha

Produção, que aborda o início da epidemia de HIV/Aids no Estado, participa, em novembro, do 70° Festival Internacional de Cinema de Mannheim-Heidelberg, um dos mais tradicionais do país germânico

Vitória / Rede Gazeta
Publicado em 23/10/2021 às 15h43
Filme capixaba

Filme capixaba "Os Primeiros Soldados", de Rodrigo de Oliveira, fará sua estreia mundial no Festival Internacional de Cinema de Mannheim-Heidelberg, na Alemanha. Crédito: Felipe Amarelo

Após ganhar uma retrospectiva na Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, o cineasta capixaba Rodrigo de Oliveira lançará mundialmente seu novo longa-metragem, "Os Primeiros Soldados", no Festival Internacional de Cinema de Mannheim-Heidelberg, um dos mais tradicionais da Alemanha que, em 2021, chega a sua 70º edição, a partir de 11 de novembro.

Para se ter ideia do feito conseguido por Oliveira (premiado pelo documentário "Todos os Paulos do Mundos"), o longa capixaba dividirá os holofotes com novos projetos de diretores consagrados, como o italiano Michelangelo Frammartino, premiado no Festival de Cannes com a obra-prima "As Quatro Voltas", que apresentará o esperado "Il Buco"; o mestre de cinema social francês Stéphane Brizé ("Em Guerra"), que exibe "Un Autre Monde"; e o novo trabalho da inventiva francesa Lucile Hadžihalilović ("Inocência"), que faz sua estreia em produções faladas em inglês, com "Earwig" (que acabou de ser laureado no recém-encerrado Festival de San Sebastián).

"Um longa-metragem capixaba nunca chegou tão longe no mundo e isso é um privilégio, uma responsabilidade. Vivemos um momento de internacionalização do nosso cinema, com curtas exibidos recentemente em Berlim e Roterdã e agora estamos com um longa num festival imensamente tradicional, com 70 edições e um dos mais antigos do mundo. Mannheim-Heidelberg foi muito importante para a produção brasileira entre os anos 1960 e 1980, mas nossa participação reduziu muito nas últimas décadas. Portanto, sentimos esse desejo de redescobrir um espaço importante para o cinema nacional em um dos maiores mercados do planeta, a Alemanha", adiantou Rodrigo de Oliveira, em primeira mão, ao "HZ". Abaixo, veja o primeiro clipe do filme.

"O convite para a estreia mundial veio carregado também de um alívio, porque seguramos o filme para escapar dos festivais on-line, fundamentais nesse período de pandemia. Acreditamos sempre na vocação de público de 'Os Primeiros Soldados', pois trata-se de um projeto pensado para ser comunicativo, popular e compartilhado em comunidade", pontua o realizador.

"Não passava pelos nossos sonhos que, ainda em 2021, estrearíamos em um festival presencial, para grandes plateias e, sobretudo, na competição principal, dividindo espaço com nomes estabelecidos no circuito, como Michelangelo Frammartino, que venceu um prêmio na competição de Veneza recentemente, e Alina Grigore ("Blue Moon"), que, recentemente, recebeu a Concha de Ouro em San Sebastián. A sensação é a de que o nosso 'pequeno filme' já não é mais tão pequeno assim e também está pronto para deixar de ser nosso e passar a ser do mundo".

SENSIBILIDADE

Rodado com recursos do Funcultura/ES e do Fundo Setorial do Audiovisual, "Os Primeiros Soldados" foi gravado no Centro de Vitória, em 2019, contando também com locações em Domingos Martins. A produção é da Pique-Bandeira Filmes. Parte da cena LGBTQIAP+ capixaba da época foi reconstruída em estúdio e cenários, em especial a tradicional Boate Eros, localizada no Parque Moscoso (Vitória) e que funcionou até o início dos anos 2000.

A trama faz uma (necessária) radiografia "afetiva-social" do início da epidemia de HIV/Aids no Estado, nos anos 1980, quando causa e efeitos da doença eram praticamente desconhecidas, com a síndrome sendo considerada um tratado de morte e marcada por muito preconceito e estigma.

Sem dar spoilers (please!), podemos adiantar que a história se passa na capital capixaba, na virada de 1983, quando um grupo de jovens LGBTQIAP+ celebra o réveillon. O biólogo Suzano (Johnny Massaro, que em breve estará em "Verdades Secretas 2") sabe que algo de "muito terrível" começa a transtornar seu corpo.

O desespero diante da falta de informação e do futuro incerto aproxima o rapaz da artista transexual Rose (Renata Carvalho) e do videomaker Humberto (Vitor Camilo), igualmente doentes. Juntos, tentarão sobreviver à primeira onda da epidemia de Aids. Ainda no elenco, nomes de peso, como Clara Choveaux (que brilhou no francês "Tirésia", de Bertrand Bonello) e Higor Campagnaro, capixaba premiado em Gramado por sua atuação em "Um Animal Amarelo", de Felipe Bragança.

Johnny Massaro interpreta Suzano, no filme capixaba

Johnny Massaro interpreta Suzano, no filme capixaba "Os Primeiros Soldados". Crédito: Felipe Amarelo

"O drama de homens e mulheres vitimados no começo da epidemia é invisível no cinema brasileiro e latino americano. Essa narrativa é dominada pelas versões americanas e europeias da crise. A oportunidade aqui é a de explorar um território intocado e, por essa razão, conseguir escapar dos clichês do tradicional 'filme de Aids', que tendem a dar uma visão muito restrita dessas histórias. 'Ignorância' é um tema central no nosso filme e eu gosto de pensar que ele propõe um 'pacto de ignorância' com o público", adianta o realizador, logo explicando seu ponto de vista.

"Suzano, Rose e Humberto, os três protagonistas que vivem com HIV, têm pouco ou nada de informação sobre o que está acontecendo com seus corpos ou sobre como reagirão a isso. Eles convidam o público a embarcar no desconhecido e compartilhar  da jornada rumo à descoberta e ao conhecimento. Em troca, a plateia precisa ignorar os clichês que estão acostumados a esperar deste tipo de experiência. A palavra 'Aids', por exemplo, é dita pela primeira vez apenas nos últimos cinco minutos do filme. Tanto personagens quanto espectadores estão livres para navegar este universo e suas inúmeras complexidades", complementa Oliveira.

No Festival Internacional de Cinema de Mannheim-Heidelberg, "Os Primeiros Soldados" concorre ao prêmio principal, ao lado de outros 16 filmes de 21 países. Na premiação, mais de € 50 Mil. Rodrigo de Oliveira, produtores e parte do elenco viajam para a Alemanha e acompanham a primeira exibição do longa, em 12 de novembro.

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