Restaurantes turísticos, via de regra, oferecem área kids, ar-condicionado, estacionamento, música excessivamente alta e comida contestável - quase necessariamente nessa ordem.
Na contramão dessa via, sempre que viajo, fujo das armadilhas feitas para bocas turísticas e, imediatamente após o desembarque, tento me camuflar como nativo legítimo em algum mercado popular de comidas - afinal, para mim, a melhor forma de entender como funciona uma cultura ainda é pela observação atenta sobre como ela mastiga.
Uma vez na capital mexicana, fiz questão de explorar a riqueza dos aromas picantes em muitos desses centros populares de comida nos quais defendo minha proposta de “área adults” aos que já se livraram da síndrome de Peter Pan: no mercado de Coyoacán, uma iguaria realmente apreciada pelos locais formada por tortilla crocante de milho, avocado, cebola, tomate, coentro, sal, pimentas e...chapulines!
Uma farta tostada repleta desses gafanhotos fritos, muito consumidos em certas áreas do México, me conectou ao fatídico pensamento de que ali eu estava também deglutindo a família do atrapalhado protagonista daquele que foi o seriado mais debochado de Chespirito que vi na infância, o Chapolin - não contavam com a minha astúcia!
Tostada com chapulines, gafanhotos consumidos em certas áreas do México. Crédito: Arquivo pessoal
Já conheci e estudei uma dezena de culturas que reconhecem insetos em dietas passadas e contemporâneas; talvez por isso penso que não seria de bom tom chamar de exótica uma concepção de comida que é apenas diferente da que representa a minha e a de todos aqueles que gostam de chupar pata peluda de caranguejo recém-saído da lama…
A comida mexicana está para muito além da propaganda feita pelo vizinho fronteiriço: moles, atoles, memelas, tlayudas, tetelas, huaraches, tamales, nopales, tacos de canasta e, claro, mezcal. Se não puder devorar a cidade de Oaxaca, sugiro viajar em cada um desses pratos pelo menos entre os registros no Google.
Ainda no México, em mercados mais turísticos, vi também ofertas de outros artrópodes, como escorpiões e aranhas, além de baratas e besouros que passam longe de cardápios cotidianos entre os antojitos mexicanos: pura enganação para quem costuma pagar caro por experiências plásticas de viagem - e olha que eu não estou falando de ir pra resort em Cancún.
Ao perceber essas trapaças culinárias da insetolândia mexicana para viajantes, reconheço um mercado composto por estranha zona de novos patrimônios alimentares fantasiosos que evocam leituras controversas nas memórias sobre uma sociedade que já não conta nem mais com o Chapolin para defender sua própria tostada… será que essa já não seria a hora para que “criemos cânico?”
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