• Patrícia Merlo
    Colunista

    Doutora em História Social/UFRJ, Professora da UFES, especialista em História da Alimentação.

O diplomata que usou a gastronomia para fazer da França uma potência

Publicado em 25/07/2024 às 18h46
Mil-folhas, sobremesa francesa

Mil-folhas é uma sobremesa clássica francesa. Crédito: Shutterstock

Paris, a Cidade Luz: pensar na capital francesa remete a um universo de arte, cultura e, claro, alta gastronomia. Na semana de abertura das Olimpíadas de Paris, convido você a uma viagem no tempo para desvendar como a cidade se tornou o epicentro de um novo campo, a Gastronomia Moderna.

Embora a cozinha sempre tenha sido um elemento fundamental na história da humanidade, distinguindo-nos como espécie, é crucial diferenciarmos esse termo da gastronomia. Esta, como a conhecemos hoje, é uma invenção francesa do início do século XIX. Ao contrário do que alguns imaginam, seu nascimento se deu em um período de profunda crise, no fim das Guerras Napoleônicas.

A França, derrotada, enfrentava um momento delicado. O Tratado de Paris de 1815 impôs perdas territoriais, financeiras e simbólicas, marcando o fim de uma era e o início de um período de instabilidade no país.

Nesse cenário, destacou-se Charles Maurice de Talleyrand-Périgord (1754-1838), astuto diplomata e figura proeminente da política francesa desde o final do século XVIII. Durante o Congresso de Viena (1814-1815), evento que redefiniu o mapa da Europa, Talleyrand desempenhou um papel crucial.

Dizem que quando o diplomata se preparava para partir para Viena, o rei Luís XVIII o procurou para lhe dar recomendações, ao que Talleyrand respondeu: “Majestade, perdoe-me, mas necessito mais de panelas do que de instruções”.

Ciente do poder da gastronomia como ferramenta de diplomacia, Talleyrand, com sua astúcia política, eloquência e conhecimento da geopolítica europeia, orquestrou banquetes extravagantes durante o congresso. A culinária francesa, servida com pompa e circunstância, tornou-se uma arma secreta para influenciar líderes e conquistar aliados.

Os banquetes de Talleyrand transcendiam a simples degustação de pratos. Eram experiências sensoriais completas, cuidadosamente planejadas para encantar e persuadir. Decorações elegantes, música ao vivo e um serviço impecável criavam uma atmosfera de requinte e exclusividade, conquistando paladares e vontades.

Através da gastronomia, Talleyrand entrelaçou diplomacia e geopolítica, criando um ambiente propício para a resolução de conflitos e influenciou na construção das novas linhas de forças que governariam a Europa.

Apesar das perdas, a França, graças à habilidade diplomática de Talleyrand e seus prazeres culinários, ganhou, nesse tema, ainda mais reconhecimento e prestígio internacional, consolidando-se como país líder cultural europeu. Foi assim que o campo gastronômico emergiu, disciplinando discursos e técnicas, cujo legado perdura até hoje. Vive la France!

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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