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Publicado em 4 de dezembro de 2021 às 14:29
Neste final de semana acontece em São Paulo a Pop Plus, a maior feira de moda e cultura plus size da América Latina. Em sua 9ª edição, o evento pretende ser mais do que uma iniciativa comercial e de mercado. A Pop Plus é uma oportunidade para reforçar o debate público contra um dos preconceitos mais normalizados em nossa sociedade, a gordofobia.
"Eu comecei a atuar contra a gordofobia por meio da moda. Lembro de ser rejeitada em lojas de roupa e de ser agredida verbalmente apenas por ser gorda. Por isso, criei a feira pensando em pessoas como eu. Não apenas para discutir questões ligadas à vaidade e beleza, mas para tratar de dignidade", disse a fundadora da Pop Plus, Flávia Durante, de 42 anos.
Assim como a feira Pop Plus, outras iniciativas de combate ao preconceito foram criadas por quem já vivenciou a gordofobia. Graças ao trabalho de uma série de militantes (principalmente mulheres), o tema vem ganhando uma importante visibilidade.
Um bom exemplo é o da psicóloga especialista em transtornos alimentares e de imagem, Gabi Menezes, de 30 anos, uma das principais vozes contra a gordofobia. "Fui ao médico para investigar um incomum atraso menstrual. Entrei no consultório e o médico nem sequer me examinou. Por ser uma mulher gorda, ele foi logo me dizendo que eu tinha problemas de tiroide", contou.
O rápido diagnóstico estava errado. O que o médico não cogitou é que Gabi estava grávida. "Foi um caso claro de gordofobia. Você vai ao consultório e o médico, sem nenhum exame, já pressupõe que você tem um problema relacionado ao peso. A narrativa de alguns profissionais é que o corpo gordo é sinal de doença. É contra esse preconceito que lutamos", comentou Gabi.
A experiência foi um dos fatores que incentivaram a psicóloga a criar o projeto Saúde Sem Gordofobia (@saudesemgodofobia), que tem como foco principal a divulgação de profissionais que oferecem um atendimento empático a pessoas gordas. Na internet, o projeto organiza um banco de dados com mais de 600 médicos.
Outra ação importante de combate à gordofobia foi criada pela modelo e bacharel em Direito Rayane Souza, de 31 anos. Ao observar a forma como as pessoas gordas eram tratadas em seu ambiente profissional e acadêmico, ela decidiu montar um projeto de combate à gordofobia no âmbito jurídico, o Gorda na Lei (@gordanalei). Basicamente, o Gorda na Lei oferece informações sobre possíveis ações judiciais contra atos de gordofobia. Na página do movimento, é possível encontrar informações sobre como agir em caso de gordofobia no trabalho, na internet e em outros setores.
Em sua primeira experiência como professora de ioga, em uma aula pública para centenas de pessoas, Vanessa Joda, de 41 anos, contou que muitos decidiram ir embora assim que souberam que ela seria responsável pela condução dos exercícios. "Eles viram uma professora gorda e decidiram que eu não tinha competência para dar aquela aula", completou.
Depois dessa experiência, Vanessa criou um curso de formação de professores de ioga focado em pessoas gordas, outras minorias ou fora dos padrões estabelecidos. O Yoga Para Todes (@yogaparatodesbrasil). O projeto também promove algumas aulas gratuitas e outros eventos.
Já a jornalista Pollyane Marques, de 35 anos, lembra do que passou nos tempos de faculdade. "Me diziam para eu aprender a escrever muito bem - porque como gorda eu nunca iria trabalhar em TV", falou. Como jornalista profissional, Polly criou o projeto Viaja Gorda (@viajagorda) - com conteúdos sobre viagens e turismo.
"Para a pessoa gorda, o setor impõe muitas dificuldades. Tem quem não pegue avião porque tem medo de não conseguir acessar o banheiro. Também não vai para um hostel porque não pode escolher ficar na parte de baixo de um beliche", ressaltou Polly.
Em setembro, o Recife se tornou a primeira capital brasileira a aprovar leis contra a gordofobia - leis que, entre outras coisas, garantam às pessoas gordas carteiras escolares adequadas Já em São Paulo, no início de novembro, o tema rendeu um debate na Comissão de Legislação Participativa, na Assembleia Legislativa. A conferência tratou dos desafios enfrentados pelas pessoas gordas em transportes públicos, restaurantes, teatros, cinemas e outros espaços.
Você que leu essa matéria até aqui pode estar se perguntando: e os homens? É muito mais difícil encontrar homens dispostos a falar sobre o tema: "Os homens falam menos por conta do machismo O tema mexe com questões ligadas à masculinidade, como se o gordo fosse assexuado, como se não pudesse desempenhar sexualmente por ser gordo", observa o servidor público federal e organizador da feira Pop Plus no Rio, Franz Wasielewski Borborema, de 44 anos. "Na hierarquia social, o homem gordo vem por último. Por isso, muitos se calam", avalia.
A MindMiners, uma startup de tecnologia especializada em pesquisas digitais, ouviu mil pessoas sobre o tema. De acordo com os resultados, 62% já usaram algum termo ou ditado gordofóbico. A mesma pesquisa apontou que 51% já foram vítimas de gordofobia. Entre elas, 57% não tiveram suporte de amigos ou família.
"A gordofobia é um estigma estrutural institucionalizado em todos os setores da sociedade. Ele aparece na linguagem, na família, na escola, na medicina, na mídia e na cultura. A gordofobia está na forma como a sociedade se organiza e pensa sobre todas as coisas", afirmou a filósofa e ativista Malu Jimenez, de 50 anos. "Um dos primeiros passos seria normalizar a palavra ‘gorda’. Eu não sou obesa. Obesidade é doença. Também não sou plus size. Eu sou gorda", completou.
Ainda sobre linguagem, a doutora em comunicação Agnes Arruda, de 37 anos, aponta os estereótipos incorporados pela sociedade. "O gordo é feio; magro é bonito; magro é o correto, o gordo é o errado. Desta forma, qualquer violência em relação ao corpo gordo acaba se tornando aceitável", acrescentou.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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