Christina Aguilera, em paz com o passado, volta ao espanhol depois de 20 anos

Cantora lança o EP, primeiro de uma trilogia em que retorna à língua de 'Mi Reflejo', álbum que fez sucesso em 2000

  • LUCAS BRÊDA
Publicado em 14/02/2022 às 13h27
A cantora Christina Aguilera  está de volta com o EP

A cantora Christina Aguilera está de volta com o EP "La Fuerza", que marca o retorno da artista à língua espanhola . Crédito: FramePhoto/Folhapress

Nos últimos dias, um nome conhecido voltou a frequentar a parada de sucesso de música latina da Billboard. A cantora Christina Aguilera está de volta com o EP "La Fuerza", que marca o retorno da artista à língua espanhola mais de duas décadas depois de "Mi Reflejo", seu primeiro --e, até então, único-- álbum não cantado em inglês.

"É algo que quero fazer há 20 anos, desde que lancei meu primeiro álbum em espanhol. Mas estou feliz que estou fazendo ele agora, porque tenho uma percepção mais profunda --tendo sido mãe, tendo a carreira que tive, tendo meio que feito as pazes com meu passado. Há muito mais camadas em relação ao que quero fazer e falar", diz Aguilera.

Com seis faixas, "La Fuerza" é o primeiro de uma sequência de três EPs, a serem lançados nos próximos meses, em que a cantora americana volta a olhar suas raízes equatorianas. "Mi Reflejo", segundo disco de Aguilera, saiu em 2000 com músicas inéditas e regravações em espanhol de hits em inglês do álbum anterior, como "Genie In a Bottle". "Mi Reflejo" fez tanto sucesso que até hoje figura entre os discos com mais semanas no topo da parada latina da Billboard.

Desde então, Aguilera construiu uma carreira no mercado americano e, por isso, precisou passar por uma espécie de imersão na música latina, em Miami, há cerca de um ano, antes de gravar "La Fuerza". "Entrei completamente num mundo em que me permiti ser vulnerável, explorar, aprender, ser rodeada pelos mais talentosos e incríveis artistas, cantores e compositores. Não há nada como a música latina no mundo. Nada que incorpore tanta força e energia vital", diz.

Filha de pai equatoriano, que atuava no exército dos Estados Unidos, e mãe americana de ascendência europeia, tradutora de espanhol e violinista, ela conta que precisou enfrentar medos para gravar as novas músicas. "Não é minha primeira língua, então pode ser meio assustador. Mas não fiquei travada por esse medo, porque é algo que quero explorar também para meus filhos, mostrar que apesar de não ser 100% confortável para mim --como seria em inglês--, mas é uma parte de mim, da minha história, da minha ascendência."

"Cresci ouvindo espanhol em minha casa, minha mãe fala espanhol fluente. Então, é algo que é parte da minha infância. Também queria fazer isso de uma maneira autêntica, incorporando a música em espanhol que ouvi ao longo dos últimos 20 anos, que passei a conhecer e explorar melhor, de Chavela Vargas a ser inspirada por Frida Kahlo. São coisas que não me influenciariam se eu tivesse feito esse álbum antes, porque pude explorar mais profundamente a música e a cultura latina para poder chegar nesse ponto."

"La Fuerza" é calcado nas sonoridades contemporâneas do reggaeton, mas também traz uma balada ao piano, "Somos Nada", e uma espécie de ranchera, "La Reina". "Não queríamos só fazer o que está fazendo sucesso no momento. Queria me aprofundar e fazer isso da maneira correta, usando influências que são importantes para mim. Usei essas referências e os músicos certos para chegar na raiz do que eu estava buscando. Realmente voltei a me apaixonar música", diz a cantora.

"Pa Mis Muchachas", single de maior audiência de "La Fuerza", traz Aguilera convidando outras cantoras latinas, entre elas a estrela em ascensão argentina Nathy Peluso, a conterrânea Nicki Nicole e a americana com ascendência mexicana Becky G. A música e o clipe tratam exatamente dessa união feminina.

"Uma coisa que aprendi sobre mulheres latinas é que somos superfortes e queria abordar isso em 'Pa Mis Muchachas', fazer homenagem às minhas raízes, à herança da mulher latina como arquétipo de força e representar que somos a espinha dorsal de nossas famílias, as que nutrem, que cuidam. Mas também temos que ser os pilares da força, e queria mostrar que está tudo bem ser vulnerável, ter os momentos em que precisamos nos reabastecer e ajudar umas às outras. No vídeo, a mensagem é que sou uma mulher forte hoje porque uma mulher forte antes de mim me ensinou a ser forte e outra antes dela também a ensinou", diz.

Uma das questões que surgiram para Aguilera durante a feitura do disco foi sua relação com o pai, Fausto, de quem herdou o sobrenome e o manteve mesmo após a pressão da indústria para que ela trocasse o nome artístico por outro mais comum para o mercado americano. Em entrevistas e músicas --como "Oh Mother", de 2006--, ela já disse que, além de ausente, o pai abusava psicologicamente e fisicamente dela e da mãe durante sua infância.

Agora, diz Aguilera, ela fez as pazes com o passado. "É uma história verdadeira e algo contra o que sempre batalhei. Sempre tive meus problemas de relacionamento com meu pai, tenho muitas memórias que são complicadas e já falei sobre o que aconteceu na minha infância. Não tenho medo de falar porque acredito que tenho essa voz por alguma razão. Então, se tem alguém que esteja passando por essas coisas na vida, posso ajudar jogando luz em assuntos que não são confortáveis", diz. "Sendo mãe, fiz as pazes com meu passado. Abandonei muitas coisas."

Aos 41 anos, ela também se lembra de quando despontou como estrela pop na virada do século, recém-saída da adolescência, e gravou "Mi Reflejo". "Era a bebê Christina", ela ri. "Também estava em Miami, gravei tudo lá. De novo, quando estou cercada pela língua espanhola, o que não acontece na minha vida atualmente, ativa algo que está embutido em mim para o resto da vida. As turnês que fiz com 'Mi Reflejo' em territórios latinos foram muito incríveis para mim. Não há nada como a energia das plateias latinas."

"E por causa da minha infância, [essa experiência] me leva diretamente a momentos importantes da minha vida, memórias de que gosto. É por isso que foi muito importante ter feito esse disco agora. Consigo vivenciar isso tudo com outro olhar em relação ao que eu tinha quando eu tinha, sei lá, acho que não tinha nem 20 anos de idade! Era uma loucura."

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