Roberto Carlos decreta o fim de sua paciência com fãs em show nostálgico e vigoroso

Abertura de temporada em São Paulo teve letra esquecida e ares de anticlímax, ambos salvos por voz firme e melodiosa

  • BRUNO CAVALCANTI
Publicado em 29/07/2022 às 08h24
Roberto Carlos joga as tradicionais rosas sem muita animação em show

Roberto Carlos joga as tradicionais rosas sem muita animação em show. Crédito: Reprodução

"Suítes", o novo show de Roberto Carlos, apresentado na casa Vibra São Paulo na noite desta quarta-feira, na zona sul da capital paulista, não é um espetáculo inédito. E isso não é novidade.

Há pelo menos três décadas, o Rei vem reciclando velhas emoções testadas à exaustão sob uma lona de clássicos infalíveis de seu repertório. Eles fazem a felicidade de suas fiéis súditas que, desde as jovens tardes de domingo, mantém intacto o reinado do compositor.

É justamente para elas que o rei regeu o coro masculino ao final dos versos de "Desabafo", para mostrar que quem manda é o público feminino na trajetória deste intérprete que, aos 81 anos, já não apresenta mais a vitalidade física de outrora, mas ainda se mantém como um dos principais cantores da música popular.

Afinado, Roberto Carlos entrou em cena com meia hora de atraso, o que se tornou mero detalhe para o público que (não) lotou a maior casa de shows da cidade no momento em que o cantor deu voz aos primeiros versos do fox "Emoções". Antes, a plateia já havia cantado em uníssono "Como É Grande o Meu Amor por Você" em versão instrumental regida pelo fiel maestro Eduardo Lages.

Tanto o público quanto o cantor se mostraram tensos no primeiro bloco do show, resultado de um vídeo que viralizou nas últimas semanas, quando ele mandou um rapaz calar a boca enquanto cantava. O rei se desculpou, e os súditos aplaudiram, mas nem mesmo o calor da plateia ajudou Roberto, que se desentendeu com a letra de "Além do Horizonte".

Ele não desistiu e foi até o fim. Momento menor em um show de duas horas em que o cantor não se privou de lançar mão de algumas pérolas do seu arsenal de hits. Assim foi com "Como Vai Você", "Ilegal, Imoral ou Engorda" e a insuperável "Detalhes".

Se o jogo já é conhecido, as emoções seguem reais. É o que demonstraram as lágrimas que brotaram durante o coro espontâneo ao longo de "Olha" e a voz marejada ao falar da amiga Isolda, autora de um de seus maiores sucessos, "Outra Vez".

Mesmo com fôlego limitado, que impossibilitou as notas mais altas de "Lady Laura" e levou o cantor a deixar o palco para recarregar as baterias durante a longa introdução de "O Calhambeque", Roberto Carlos segue como intérprete magnético, capaz de intensificar as nuances de "Sua Estupidez" e fazer crescer "Fera Ferida", mesmo que o arranjo pouco inspirado pensado por Eduardo Lages jogue contra.

A mise-en-scène adotada ao longo de "Esse Cara Sou Eu" e "Mulher Pequena", cantada em ritmo de marcha-rancho, desvia a atenção de essas serem duas canções menores, que não resistem à comparação com os clássicos. Por outro lado, "Cavalgada" segue uma grande canção que se ressente de uma interpretação mais enfática à altura do excelente arranjo, repetido desde meados dos anos 2000, quando ganhou ares de rock sinfônico.

Acompanhado por nada menos do que 14 músicos, o Rei se mostrou fiel às súditas, mas não manteve o jogo de cintura quando elas se levantaram espontaneamente durante a penúltima canção da noite, "Como É Grande o Meu Amor por Você", em direção ao palco.

"Vocês se adiantaram", gracejou o cantor, que logo se corrigiu, dizendo que "tudo bem, hoje pode". O bom humor durou pouco. Bastou o coro feminino atacar os versos da canção de 1967 que o músico já avisou, "desde que vocês fiquem quietinhas".

Voltando aos palcos de forma esporádica, talvez Roberto Carlos ainda precise se reacostumar com a avidez dos fãs que sonhavam com o reencontro. Ao final do show, ao som de "Jesus Cristo", o rei ralhou mais uma vez e se recusou a dar uma rosa a uma fã que tentou puxar a flor de sua mão. Ele também não ficou feliz ao tentar entregar uma rosa a uma criança e ter suas tentativas insistentes frustradas pelo grupo de mulheres.

Embora tenha terminado com ares de anticlímax, "Suítes" ainda é a prova de que o cantor sabe reciclar como ninguém velhas emoções possíveis só naquelas canções, com uma horda de fãs que não se importam em ver o mesmo repertório cantado com as mesmas intenções desde que seja pela voz firme e ainda melodiosa de um Roberto Carlos que não deixou seu carisma morrer.

"Suítes" conta com sessões em São Paulo nos dias 28 e 31 de julho, desta vez no Espaço Unimed, além de 5 e 6 de agosto, antes de partir para o Recife, nos dias 12 e 13 de agosto, e para uma turnê no México. A partir de setembro, o show volta ao Brasil e passa por Ribeirão Preto, Campinas Goiânia, Recife e, finalmente, volta a São Paulo para mais duas datas, em 5 e 6 de novembro, também no Espaço Unimed.

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