• Maria Sanz

    É artista e escritora, e como observadora do cotidiano, usa toda sua essência criativa na busca de entender a si mesma e o outro. É usuária das medicinas da palavra, da música, das cores e da dança

Crônica: Aos mestres, com carinho

Publicado em 31/07/2022 às 02h00
professor

Mestres são como portais, passagens só de ida. Depois de reconhecidos, nunca mais outra saída. Crédito: Shutterstock

Existe um tipo de intimidade que beira o estranhamento. É aquela que nunca costuma se dar sem doer – posto que é seu arauto um olhar tão desafiador quanto fundante.

Este tipo de relação de que falo jamais viceja gratuitamente. Ao contrário, ela é inaugurada por um dar de luz à alma, nova chama. Chamado.

É, o encontro com um mestre nunca acontece por força do acaso.

Nossos metres esperam... Não se contentam com os limites que inconsciente, sabiamente ou estupidamente escolhemos para dar forma a nós mesmos. Em verdade, eles sequer suportam conviver com a ausência do nosso “brilho possível”. Fato é que, nossos mestres sofrem (mais que a gente) com o contentamento descontente ao qual muitas vezes nos submetemos.

Não raro padecemos das virtudes da ingenuidade.

Mas os mestres sabem... Reconhecem e exaltam a exuberância de nossas almas. Apontam, desafiam, enfiam o dedo. Fazem doer, arder, instalam o medo (razão pela qual tantas vezes nos escondemos ou fugimos).

Mestres anônimos, outros, bem conhecidos. Seres raros com os quais nem sempre damos conta de conviver tão perto. Mas dos quais, ao mesmo tempo, também não conseguimos seguir separados. Magnetos. Precisamos deles – isso é sabido. Em algum lugar galáctico, deve estar escrito.

Engraçado, repare como nosso “estado aquém” os desperta. Involuntariamente evocamos sua presença diante da recorrência da nota sete (quando o que se deseja é o nove e meio).

“Coincidências”... Mestres são como portais, passagens só de ida. Depois de reconhecidos, nunca mais outra saída.

Olhar que conecta e inaugura o compromisso da tentativa na mesma medida que irrita. Claro, deixar o conforto do sete (por sinal, acima da média) para alcançar “noves” profundezas, implica em restaurar a potência, revitalizar os sentidos e esticar o alcance das pernas e do desejo.

Mestres nos propõe diálogos galopantes. Perceba.

São seres que reviram nossas cabeças. E não procuram entender a lentidão dos nossos processos – uma porque, pra eles, o brilho já é presente; outra, porque... Vai, anda, acelera! (Mestres nos empurram por sabedoria ou por pressa).

Como despertadores – detestáveis e absolutamente necessários – nos tocam na mesma medida que nos condenam: age!

Pessoalmente, tenho muitos mestres. Pessoas irrevogavelmente íntimas, das quais me afasto de tempos em tempos – seja para recobrar o fôlego, seja para dar nova partida. E na maioria, são assumidamente exigentes – raras vezes, meus raros nove e meio me renderam beijos.

Talvez por isso eu me torne assim, irremediavelmente nervosa na presença de um deles. Saber que ele me sabe, me desperta e me alerta, por fim, me desconserta.

Sem disfarçar, fico ansiosa de me amostrar, de provar qualquer traço evolutivo mais recente. Falo demais, tento brilhar, erro a mão, perco o tom. Eles, como bons mestres que são, fingem não se constranger com meu alarme e minha vontade de ser aprovada...

Envergonhada, fujo. Assumo.

Mas esse encontro que provoca o cruzamento do ego com a alma nunca falha. Vicejante, gera no mínimo uma semente criativa, uma nova chama de ação, inspiração, busca ou mudança.

Por isso, aos mestres de carne e osso, infiltrados na minha vida aqui na Terra, além de eterna gratidão pela conexão, dedico cada pilar e cada viga da minha obra em construção.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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