• Maria Sanz

    É artista e escritora, e como observadora do cotidiano, usa toda sua essência criativa na busca de entender a si mesma e o outro. É usuária das medicinas da palavra, da música, das cores e da dança

Crônica: Fazer a própria verdade nem sempre é fácil

Publicado em 25/09/2022 às 05h00
Dúvida, verdade

Crédito: Pixabay

Nota de abertura: fazer a própria verdade nem sempre é fácil... Segredo talvez seja saber (meditar?) lidar com os momentos de dor, enquanto perseguimos aquilo que nos faça acordar com sentido.

  • "A felicidade também é estarmos preocupados só com aquilo que é importante. O importante é desenvolvermos coisas boas, das de pensar, sentir ou fazer".
  • Valter Hugo Mãe


Então felicidade envolve ação! Simples: fazer pensamentos, sentimentos e coisas – de filhos às obras de arte, passando pelos bolos e penteados. – Seria fácil, se acaso não julgássemos e fossemos julgados.

Mas como se livrar do olhar do outro?

Olhar, no sentido de forma, cor, estilo.

Livrar, no sentido de se libertar – da comparação ao desejo de ultrapassar.

Sabe aquilo de se espelhar, coisa que fazemos desde os primeiros que amamos – com nossos pais, por exemplo? Pode cristalizar em nós o bom e velho mecanismo da imitação. Ora, se é natural ter o outro por modelo, então como se livrar dessa fórmula que, até certa altura parece prudente, sadia e tal, mas passa a ser uma espécie de autocomiseração no final?

Eu que sou mais para desorganizada, sem muito padrão e geneticamente indisciplinada, sofro de verdade. Vejo as pessoas capazes – aquelas que seguem numa linha vida-toda, na estética limpa, sem borrão, com perícia e destreza, elevando o padrão – tento imitar, falho e me pergunto: por que eu não?

Ser torta é um jeito. (Já entendi). Ainda assim... Às vezes duvido. De qualquer maneira, faço! (E torço para que dê certo). Invento que "desse jeito tá bom" e vou. E quando essa minha invenção cola, evito preocupações à toa... Fico feliz. Mas nem sempre foi assim.

Certa vez quando estudava moda, veio dar aula para gente um artista. Seu nome era Ronaldo Fraga e ele parceria falar de um lugar denso, desde dentro dele mesmo. E propôs um exercício de criação. Eu, que muito tinha me encantado pelas histórias daquele mestre, esqueci de fazer minha verdade e me fixei no desejo de ser aprovada – quem sabe reconhecida, talvez elogiada... Pronto, bastou. (Você sabe, neste quesito basta tentar para não conseguir).

Qualquer esforço para se ajustar ao olhar do outro, envenena a chance de atravessá-lo. Porque para penetrar o olhar (e o peito) alheio faz-se necessário desajustá-lo – em algum sentido.

Detalhe: pense comigo, é por isso que a paixão, certas pessoas, alguns filmes, poesias, a arte contemporânea, etc., etc., podem ser tão difíceis de compreender quanto de serem ignoradas. Porque, apesar de indecifráveis, deixam marca.

Voltando ao caso, fiz um trabalho bem bonitinho, sem grande perícia, correto, provável, chato. O professor não só não aprovou, como também se irritou e disse, na frente de todo mundo, que esperava mais de mim. Nunca me esqueci. Foi difícil ouvir, mas absolutamente necessário. (Gratidão, Maestro).

Resta que não viemos ser aprovados... Realizar é a grande tarefa. Explorar, experimentar, fazer, fazer, fazer até encontrar "o fazer" que nos realize (em troca) e, enfim, se torne nossa verdade.

Nota de rodapé: o que chamamos de verdade não passa de uma interpretação que prevaleceu às outras. Disso a gente sabe.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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