• Maria Sanz

    É artista e escritora, e como observadora do cotidiano, usa toda sua essência criativa na busca de entender a si mesma e o outro. É usuária das medicinas da palavra, da música, das cores e da dança

Crônica: Mais humano, menos macho

Publicado em 11/12/2022 às 10h00
Menino chorando, criança, lágrimas, triste

Crédito: Shutterstock

Todo homem um dia foi um menino que ouviu a frase: "você é um homem ou um rato?". É, "ser homem" não deve ser mesmo fácil...

Segundo a lógica mundana, meninos já nascem valentes. Poxa, varão não chora nem na maternidade! Não sente medo de nada; nem fala de amor (rá! que piada); nem um monte de coisas proibidas que, com o tempo, criam uma casca rígida – para um miolo fragilizado – por falta de orientações emocionais e falta de cuidado.

"Seja macho!". Essa é a ordem recebida ao longo da vida, e o menino escuta, a princípio, sem nem entender que raio é isso, mas vai, aos trancos e barrancos, descobrindo... É que o pai impõe, o tio zomba, o irmão compara, o vizinho bate, o colega aponta, e por aí ele vai virando "homem", assim, entre aspas.

Sabe lá o que isso significa para um menino? Ser obrigado a controlar e reprimir toda e qualquer emoção que brote? Engolir o choro e todo veneno proveniente de sentimentos confusos, ambíguos, às vezes malignos... É, tóxico, no mínimo.

Mas o mundo inteiro faz vista grossa... Só que depois cobra!

Agora me diga, como é possível esperar empatia de um sujeito que sequer pôde experimentar o medo, a angústia, a tristeza...? Se chorar não foi permitido.

Como esperar gentileza se o que sobra é raiva e ódio, desenvolvido às custas de repressão – quando não é porrada, literalmente?

Não por outra, é comum que os homens se percam nas drogas, que abrem espaço para alguma manifestação de sentimentos reprimidos, ou pior, que estreitam o laço com a anestesia, com o apagamento, com a morte.

Isso sem falar da sexualidade, completamente comprometida com os valores precários da pornografia e da má (péssima) orientação: "meu filho, mulher ou é pra comer, ou é pra casar, saiba distinguir".

Só que a mulher que ele aprendeu a desejar (assistindo aos vídeos), quase nunca se pareciam com aquelas que ele podia apresentar para a mãe, e essa é a razão para uma série de desilusões. Então o homem não sente tesão pela recatada, teoricamente ideal, mas pela outra, que ele, apesar de desejar, não consegue respeitar... E a que ele deve respeitar, não consegue desejar. – Pensa uma bagunça!

Fora o incentivo corporativo para a arte da canalhice... 'Ser homem é ser garanhão!' Eis uma doutrina-lixo. Nota: até parece gosto, mas em realidade, pra eles também é muito sofrido. Com a competição e a obrigação de se provar performático e viril, vem as mentiras, a contação de vantagens, a covardia... Entre outras atitudes vulgares que, com tempo, se tornam hábitos.

Nós mulheres, que já nascemos falando das nossas emoções, e montamos rodas de conversa desde o maternal (literalmente),  seguimos trocando, chorando juntas, se abraçando, se cuidando, ao invés de cobrar, apontar e julgar. Melhor seria assumirmos a responsabilidade de ensinar a eles essa possibilidade, porque enquanto os meninos estiverem proibidos de falar, impossibilitados de se abrirem, condenados ao machismo sistêmico, isolados e sofrendo calados, eles promoverão mais e mais sofrimento.

De modo que desbloquear as emoções é fundamental. Vou falar de novo, fun-da-men-tal.

Encontrar algum caminho, seja terapêutico, espiritual, seja relacional, qualquer processo de desnudamento, de abertura, de encontro com a própria vulnerabilidade. Essa é uma escolha. Uma responsabilidade: sair da negação e pedir ajuda. Aliás, pedir e depois dar conta de receber.

Cabe a todos nós o esforço de desconstruirmos o machismo, olhar para os próprios bloqueios e acessar a possibilidade de nos nutrirmos, nos equilibrarmos até nos tornarmos pais e mães capazes de criar meninos sadios... Eu acho! – Por homens mais humanos do que machos.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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