Segundo a cronista, a arte opera a reconciliação entre os princípios de prazer e de realidade. Crédito: Shutterstock
Somos todos regidos por uma engrenagem denominada por Freud como "princípio do prazer". Basicamente, o que o pai da psicanálise queria dizer é que nascemos empenhados em ganhar prazer e afastar o desprazer.
Assim, desde o nascimento, enquanto conhecemos e reconhecemos as diferenças entre o estado de prazer e o de desprazer, desenvolvemos registros que se tornam memórias, que por sua vez instrumentalizam a instauração de um "juízo imparcial" para resolver o que é verdadeiro ou falso na realidade.
De modo que todos os nossos processos mentais inconscientes funcionam a partir desse arranjo imaginário, que é sempre único para cada ser humano, ou seja, cada um de nós desenvolve um par de lentes únicas para enxergar o mundo, ou seja, uma "fantasia" própria para lidar com a vida.
Essa fantasia, que é uma espécie de anteparo para lidarmos com a realidade – invariavelmente insuportável para o psiquismo – tem a função de amparar imaginariamente nosso apego às fontes de prazer.
A substituição do princípio do prazer pelo "princípio da realidade" (sim ele também existe na teoria psicanalítica) só acontece na medida da introdução da educação, operada pelo educador que oferece seu amor como prêmio. Perceba, é mediante o recebimento de amor (confiança, presença, cuidado, etc.) que uma criança se deixa educar.
Mas, ainda que o desenvolvimento dos instintos do “Eu” comece a ser operado pelos limites da educação, os instintos sexuais se distinguem por serem automáticos… Por se comportarem autoeroticamente.
Achando satisfação no próprio corpo, os instintos sexuais não se submetem às limitações e frustrações que introduzem o princípio da realidade. Portanto, a sexualidade pode ficar refém da fantasia para sempre… pensa!
Talvez esse seja o ponto fraco na nossa organização psíquica, diz Freud… há uma conexão muito forte entre o instinto sexual e a fantasia. E assim, devido à continuação do autoerotismo ao longo da vida, mesmo os pensamentos que já haviam se tornado racionais podem voltar subitamente ao domínio do princípio do prazer.
E é por isso que algumas religiões impõe a repressão da sexualidade como salvação: propondo a renúncia absoluta do prazer nessa vida, em troca de renascimento numa vida futura.
Donde se conclui que só a arte salva! Pois a arte opera a reconciliação entre os princípios de prazer e de realidade.
Como o artista não abre mão da fantasia, mas constrói um produto de realidade, um produto social compatível, apreciável, desejável por outros, ele se torna uma espécie de herói.
Mas veja, isso só é possível porque o coletivo também experimenta um grau de insatisfação com as renúncias exigidas pelo princípio da realidade, e por isso se identificam com o “produto” da reconciliação criado pelo dom de resistir (estranhamente sábia) do artista.
Então, viva a arte!
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