Posto que evoluir é se libertar desta pulsão profunda. Crédito: Shutterstock
Acredite, às vezes agradeceremos a quem não nos deu aquilo que pedimos.
É paradoxal, mas verdade. Pense comigo, o desejo representa a pulsão dos nossos instintos em sua eterna busca do “objeto” que irá aplacar a famigerada “falta”.
Mas perceba, não é porque ele atende pelo nome de desejo que ele obedece à mecânica do prazer... Não, ele não é garantia de contentamento. Às vezes, ao contrário, ele bem pode levar à dor e até mesmo ao desespero.
Pensando na origem da estrutura do desejo, é possível dizer que somos filhos do desejo de alguém – de uma ou duas pessoas. Alguém nos desejou ou nos deu permissão para nascer.
De modo que a nossa “qualidade psíquica” está intimamente atrelada aos desejos daqueles que nos originaram... Porque, a verdade é que não somos apenas autores de nossos desejos, somos também vítimas dos desejos alheios.
E sobre isso não existe defesa possível (a não ser a consciência). Falaremos disso mais adiante.
Voltando aos desejos, precisamos falar do melhor apontamento da belga Maud Mannoni, que decifrou o desejo que reina acima de todos os outros, na psique humana: “o desejo de ser desejado”.
No início do século passado, esta médica pediatra começou a estudar psicanálise na França e observou que “o desejo mais profundo do humano é ser desejado pelo outro”. E isso matou a charada!
Apontou o fato de que o grande “prazer de se sentir desejado”, ou seja, de ser o “objeto de desejo do outro” (isso que remonta exatamente aquilo que sentimos quando nascemos: um naco de carne profundamente desejado pelo outro), pode ser um prazer perigoso se perpetuado.
Posto que evoluir é se libertar desta pulsão profunda.
Evoluir é descobrir o prazer em “ser um sujeito” ao invés de um “objeto de desejo”.
Psiquicamente, tomar posse de si mesmo e se responsabilizar por isso, é o estado mais saudável possível. Enquanto seguir a vida “desejando ser desejado” pode virar uma grave patologia, uma doença mesmo.
Sobretudo porque, como dito no início, podemos ser vítimas do desejo do outro, que mesmo “sem querer” nos transmite seu desejo paradoxalmente.
Assim, por exemplo, a mãe com medo de que a filha engorde, acaba violentando-a com seu próprio conflito. Transmitindo, suponhamos, seu medo de que ela não seja uma mulher atraente. E assim, aos poucos a menina passa a sentir raiva dessa vigilância constante, raiva dos comentários e ameaças veladas da mãe.
Por fim, advinha? A menina finalmente “realiza o medo” dessa mãe, e engorda radicalmente.
Perceba, a filha enquanto “objeto dessa mãe”, não tem medo de perdê-la, mas de se perder como objeto do desejo dela. Entende?
Em nome do desejo da mãe, a menina se torna refém desse amor e de seus medos.
Ok, desejo é um tema bastante complexo... Mas honestamente acho importante ensaiar sobre ele. Primeiro porque seu único antídoto é, como havia dito, a consciência. Depois porque para conviver como nossos desejos precisamos aceitar nossa própria impotência, romper com nosso narcisismo e transcender o ego na busca do entendimento da gente mesmo.
A psicanálise ensina: “A raiva é filha do medo. O medo é o pai do desejo. A raiva e o desejo são irmãos.”
Então, de onde vem nossos desejos? Será que a gente quer isso mesmo?
Enfim, cuidar dos nossos desejos é tentar entendê-los. É olhar para eles e sublimá-los, se possível... Essa não é uma tentativa em vão, posto que há sim, um momento em que eles deixam de ser um comando e se tornam uma construção.
Este vídeo pode te interessar
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.
Se você notou alguma informação incorreta em nosso conteúdo, clique no botão e nos avise, para que possamos corrigi-la o mais rápido o possível