Nunca abandonei a máscara, mas a gente costuma pagar pelas atitudes dos irresponsáveis que não usam, principalmente em lugares fechados. Crédito: Agência Brasil
O exame confirma o que evitei desde o início da declaração de que estávamos sob o signo da pandemia. Chegou, infelizmente, a minha vez de vivenciar no corpo, e também na alma, todos os efeitos do novo coronavírus.
Tudo que li, ouvi e acompanhei se manifesta agora enquanto sigo em isolamento. Os sintomas, que tomam a forma de gripe, apesar de saber que são coisas bem distintas, me obrigam ao esforço dobrado para o que me é simples. Preciso ter força até mesmo para ler e escrever. A minha esperança é que vai ser rápido graças às três vacinas que tenho no braço, e breve estarei pronta para voltar à rotina. Nunca abandonei a máscara, mas a gente costuma pagar pelas atitudes dos irresponsáveis que não usam, principalmente em lugares fechados. Fiquei vulnerável. Todos estamos.
Lugar de recomeços
Enxergo esse momento como mais uma chance de recomeçar, reconhecendo que a dor física é grande, mas a dor na alma quando se tem covid-19 é muito maior. E o medo é real. Eu me junto a todos que passaram pelo contágio e penso em todas as pessoas, principalmente as próximas de mim, que perderam a luta. A vida.
A coragem abriu espaço na marra por aqui e minhas companhias são os amigos on-line que me dão dicas de como atravessar o abismo com mais ferramentas e de como utilizá-las. Aquele acalento de quando o dia se vai e as incertezas e melancolias não encontram lugar. As melhores dicas vieram da querida Maria Flávia, especialista em ter covid-19 e em combatê-lo. A experiência de quem já teve o vírus conta muito também, apesar da doença se manifestar de maneira diferente em cada um, sempre tem uma receitinha que vale fazer para amenizar os sintomas. Mensagens de carinho e melhoras, foram outro remédio importante. O interfone que toca para avisar que tem encomenda no elevador ou na minha porta, mimos que esquentam o coração nessas horas de ausência. Água de coco, chá de camomila, que fiquei sabendo que é anti-inflamatório. Inalação, analgésico, pastilha, celular e água, completam meu kit sobrevivência para esses dias.
De janela e peito abertos
A febre esquentou o corpo, a tristeza e angústia. Tudo isso bateu com a covid-19. Minhas emoções entraram em ebulição e mais uma vez usei a lupa para refletir sobre tudo e todos que me rodeiam. Quase um balanço de fim de ano, uma limpeza interna. A fé precisou ser fortificada e minhas velinhas e terço andaram em minha cabeceira à noite.
O medo nem sempre é fácil, derruba e dói. Dói reestruturar a morte entendendo a finitude da vida. O coronavírus nos embaraça, desordena, atordoa, nos limita. Abro a janela para entrar a esperança, é o sol esquentando esse desamparo das horas e encorajando os recomeços.
Por fim, poesia
Assim vou em frente, com o protocolo de sobrevivência, paciente e conciliando alívios com lamentos, porém, sempre acreditando bem mais no poder de viver. E é com fala da Gilse, no livro Só restou a poesia, da escritora Maria Flavia Bastos, que encerro o texto e os dias de contágio. Um livro que revisitei, partilhei afetos, que deu lugar para minhas dores, e levou minha cura para o campo das urgências. Por causa dele eu resolvi escrever, e por causa dele aprendi a compreender o som do sol.
“Eu nunca mais permiti fechar minhas janelas – mesmo quando elas se tornavam frestas – para ter certeza de que o sol veio. É ele que me faz acreditar que ainda restou poesia”.
Saúde!
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