Na rede estadual, há investimento em tecnologia, principalmente no ensino integral
Na rede estadual, há investimento em tecnologia, principalmente no ensino integral. Crédito: Sedu/ Divulgação

Novo Ensino Médio no ES quer aproximar escolas à realidade dos alunos

Escolas capixabas, tanto da rede pública quanto do ensino particular, têm investido em iniciativas que abordam temas sociais, culturais e ambientais nas salas de aula

Tempo de leitura: 5min
Vitória
Publicado em 23/12/2022 às 08h45

O pedagogo e filósofo Paulo Freire, patrono da educação brasileira, acreditava que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.” Ele defendia que o saber não se limita a aprender determinadas matérias, mas vai além: é o saber da vida, para a vida. “Educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade”, dizia.

É nesse sentido que muitas escolas do Espírito Santo, tanto da rede pública quanto particular, têm investido em mudanças no modelo educacional, com iniciativas que abordam temas sociais, culturais e ambientais. Não apenas para lapidar grandes profissionais no futuro, mas também para formar cidadãos conscientes, inseridos nas questões relevantes da atualidade.

A implementação do Novo Ensino Médio vai ao encontro dessa proposta, ao trazer a diversificação curricular e o desenvolvimento do projeto de vida dos estudantes. As mudanças — que abrangem todo o Brasil — têm o objetivo de aproximar a escola da realidade dos jovens, ampliando suas percepções para o mundo do trabalho e para a vida em sociedade.

Na rede pública estadual, que atende, prioritariamente, alunos do ensino médio, o secretário de Estado da Educação, Vitor de Angelo, explica que o projeto tem, como uma de suas novidades, a criação de uma etapa do currículo que é flexível, chamada de itinerário formativo. É uma trilha, escolhida pelo aluno, conforme seu interesse, suas aptidões e objetivos.

“Existe um núcleo comum, que é a formação geral básica, e tem o itinerário de aprofundamento, que são essas trilhas. E nós, na Sedu, criamos, como um desses itinerários, o de educação ambiental, por exemplo, um dos mais procurados pelos estudantes.”

Os itinerários ofertados pela rede estadual são: Mídias Digitais: Linguagens em ação!; Educação Financeira e Fiscal; Terra, Vida e Cosmo; Modernização, Transformação Social e Meio Ambiente; Humanidades e Relações Socioambientais; Narrativas Socioliterárias: Literatura, Arte e Ciências Humanas Escrevem o Mundo; O Esporte, a Ciência e as suas Linguagens; Energias Renováveis e Eficiência Energética; Aspirações Docentes; e Formação Técnica e Profissional.

Segundo o secretário, a formação que aborda o meio ambiente é uma das mais relevantes, porque é muito sensível no debate atual. “Sabemos bem que a questão ambiental passa também pelas ações no campo da educação. Nós, no ensino médio, tivemos a oportunidade, do ponto de vista do currículo, de inserir, de forma explícita, uma parte inteira dedicada a trabalhar esse tema, o que mostra bem a ênfase, a preocupação e o espaço que a gente tem buscado dar a ele.”

O secretário cita outro exemplo, que envolve uma contrapartida do desastre de Mariana (MG), a maior tragédia ambiental do Brasil provocada pelo rompimento da Barragem do Fundão, em 5 de novembro de 2015. A Fundação Renova — responsável por gerir os programas de reparação, restauração e reconstrução das regiões impactadas pelo acidente — é obrigada a fazer ações de compensação. E uma delas, aqui no Espírito Santo, acontece no âmbito da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), que, em parceria com o Ifes, está promovendo cursos de aperfeiçoamento, especialização, mestrado e doutorado na área de educação ambiental. Um projeto com um investimento superior a R$ 10 milhões, como informa De Angelo.

Ele espera que esse interesse dos alunos pelo meio ambiente esteja sendo despertado realmente por uma conscientização. “E, se for isso, ela não começa de agora, é produto de uma trajetória anterior, que não necessariamente vem da nossa rede estadual, porque certamente os municípios estão fazendo suas ações.”

E, de acordo com De Angelo, para além da educação, as pessoas acabam sendo despertadas para alguns temas por diversas influências. “Lógico que a educação tem um papel importante, mas não tem um monopólio disso. Quero acreditar que, na trajetória desses estudantes como cidadãos e como estudantes, ou na nossa rede ou em outras, eles acabaram sendo despertados para a importância desse tema. E depois acabam encontrando espaço e destaque no currículo quando chegam ao ensino médio.”

Vitor de Angelo

Secretário de Educação do ES

"Você subsidia o profissional de conhecimento técnico e teórico para, justamente lá na ponta, ele conseguir desenvolver um projeto de forma concreta e em qualquer componente curricular"
Secretário de Educação do Espírito Santo, Vitor de Angelo
Secretário de Educação do Espírito Santo, Vitor de Angelo. Crédito: Divulgação | Sedu

Isso também vale para outros temas, como os que englobam a consciência social. As iniciativas se fragmentam, porque as escolas realizam os seus próprios projetos; não emana da Sedu um projeto, necessariamente, como explica De Angelo. O que parte da secretaria são diretrizes, orientações para o desenvolvimento de determinadas políticas, além de subsídios para essas políticas, especialmente o da formação.

“Você subsidia o profissional de conhecimento técnico e teórico para, justamente lá na ponta, ele conseguir desenvolver um projeto de forma concreta e em qualquer componente curricular. De Matemática, estudando quem eram, por exemplo, as mulheres negras de expressão no campo da matemática, até o mais óbvio, que é estudar as relações étnico-raciais e de gênero no campo das ciências humanas e sociais”, enfatiza.

Ele destaca, entre essas diretrizes, a reestruturação da Gerência de Educação do Campo, Indígena e Quilombola (Geciq). “No âmbito da Geciq, nós criamos, já em 2019, no mês da consciência negra, uma iniciativa chamada Ceafro, Comissão Permanente de Estudos Afro-Brasileiros, um espaço justamente para pensar políticas públicas voltadas para a promoção de igualdade racial, tanto para o combate à discriminação étnico-racial.”

Outra ação pioneira da Sedu, realizada em 2021, foi uma formação com os profissionais que integram a Superintendência Regional de Educação (SRE) São Mateus, para a construção do Caderno da Gestão para Equidade Racial, em parceria com Instituto Unibanco. Trata-se de uma estratégia de intervenção pedagógica, que tem como objetivo promover e fortalecer políticas para a educação das relações étnico-raciais, como o enfrentamento ao racismo nas escolas da rede.

“Não é do nosso interesse observar só o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). É melhorar o desempenho escolar como um todo e melhorar ainda mais o desempenho daqueles que, excluídos socialmente em função de questões étnico-raciais, acabam tendo um resultado inferior. Esse é o objetivo da política. E, para falarmos de equidade, podemos testar vários recortes: equidade entre regiões, entre escolas públicas e privadas, entre escolas da rede estadual, porque existem, sim, umas muito melhores do que outras. Então, importa melhorar e melhorar tudo junto, para diminuir as desigualdades.”

Vitor de Angelo informa que o projeto está sendo levado para todas as regionais e, pouco a pouco, a Sedu vem desenvolvendo trabalhos bastante consistentes. “Não é em três, quatro anos que a gente vai superar essas diferenças, afinal, elas têm 500 anos. Mas existe uma política intencionalmente estruturada nessa direção, para o combate, para a diminuição e, como todos gostariam, para a extinção desse tipo de desigualdade étnico-racial.”

Já em relação à questão do combate à diferença de gênero, ele cita uma ação para além da Sedu: a Agenda Mulher, que se desdobra em várias secretarias, incluindo a de Educação.

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