Com o avanço das energias renováveis, os impactos do petróleo no meio ambiente começaram a ser colocados em xeque. Apesar de ter transformado profundamente a economia capixaba, esse mercado é apontado como um setor produtor de matéria-prima para mercadorias que não têm papel num mundo mais sustentável. A partir dessa constatação, surge um questionamento: é possível que a “era do ouro negro” esteja perto do fim?
Especialistas afirmam que as empresas do ramo já se preparam para um cenário em que o combustível fóssil terá uma menor expressão na matriz energética do Espírito Santo e do planeta, a partir de 2035. Ou seja, ele não deve deixar de existir, mas precisará se esforçar para entrar em harmonia com a sustentabilidade, se quiser sobreviver.
Um dos principais motivos para esse mercado conseguir se sustentar, segundo avaliam, é a forte dependência dos produtos feitos à base do petróleo. Afinal, ele não é só usado em combustíveis, como também em plásticos, tintas, eletrônicos, entre outras mercadorias.
O professor de pós-graduação em Engenharia e Desenvolvimento Sustentável da Ufes Ednilson Silva Felipe destaca que será preciso uma mudança de comportamento das indústrias e das pessoas antes que o petróleo perca o protagonismo na matriz energética.
“Apesar de todos os aspectos negativos que acabamos conhecendo, você não altera o mercado de uma vez ou a percepção e o uso das pessoas. Uma transformação comportamental é muito mais complexa. Elas [energias renováveis] vão acontecer e, durante muito tempo, ficarão paralelas ao petróleo”, defende.
Produção em terra
De acordo com Ednilson Silva, diante desse cenário, os empreendimentos começaram a se mostrar mais preocupados com os impactos ambientais gerados. “Mas ainda é complexo para eles, pois precisam produzir o mesmo volume que o petróleo original. As empresas já estão pesquisando isso, investindo em vários laboratórios, porque elas sabem que essa mudança, embora seja lenta, vai acontecer”, completa.
Para o conselheiro da ES Gás e CEO da DVF Consultoria, Durval de Freitas, mesmo com essa mudança de cenário quanto ao petróleo, a expectativa é que a produção da Região Norte do Estado volte a crescer. A Bacia do Espírito Santo, principalmente no campo offshore, já produziu mais de 25 mil barris por dia. Hoje, esse número chega a pouco mais de 7 mil.
“Agora, com algumas privatizações na região, já estão ocorrendo vários investimentos e todas essas novas empresas estão seguindo os mais rigorosos critérios de preservação ao meio ambiente, tanto na parte de exploração, quanto de logística. Não sei se retornará aos 25 mil barris, mas a expectativa é até de superar”, afirma Durval.
Ainda de acordo com o especialista, devido aos resultados positivos da Bacia de Santos, no Rio de Janeiro, novas pesquisas para captar recursos do pré-sal no Espírito Santo podem ser deixadas de lado. “Lá na frente, o petróleo vai ter outros usos além da energia, o que continuará exigindo produção, mas a tendência capixaba é de se manter estável. No entanto, claro, quem pesquisa pode encontrar muitas novidades”, reforça.
Maria Quitéria
Um dos projetos mais importantes da Petrobras no Espírito Santo, a nova plataforma FPSO Maria Quitéria, que vai entrar em operação até 2024, deve seguir as iniciativas ESG (Environmental, Social and Governance, ou “ambiental, social e governança”, em português). A Yinson, parceira da petroleira na iniciativa, informou que tem a preocupação de “impulsionar proativamente as iniciativas ESG para cumprir a meta [...] de reduzir a intensidade de carbono em 30% até 2030”.
O investimento na embarcação, que faz parte do cronograma prioritário da estatal, é estimado em cerca de R$ 5,6 bilhões. Ela vai extrair óleo e gás da camada do pré-sal no campo de Novo Jubarte, na região petrolífera denominada Parque das Baleias, Litoral Sul do Estado, localizada na Bacia de Campos.
Ednilson Silva
Professor da Ufes
"Uma transformação comportamental é muito mais complexa. Elas [energias renováveis] vão acontecer e, durante muito tempo, ficarão paralelas ao petróleo"
Outros projetos
Uma das petroleiras instaladas no Estado que já se mostra preocupada com a sustentabilidade é a Equinor, uma gigante norueguesa que decidiu ampliar suas atividades. Procurada, a empresa afirmou que desenvolve um projeto de energia eólica offshore (no mar) para o Espírito Santo, cuja capacidade é de 2 GW.
Já o gerente de Relações com o Governo da Shell Brasil, Thomas Lucena, afirmou que a empresa também tem grande interesse na área e “por isso acompanha atentamente o avanço regulatório (da energia eólica), além de participar das discussões do setor”.
“Além de petróleo e gás natural / GNL, no Brasil, a Shell oferece energia elétrica por meio da Shell Energy Brasil e tem participação na Raízen, maior produtora de etanol de cana do mundo. Em outros países, a Shell já desenvolve projetos de geração de energia eólica e fotovoltaica”, ressalta.
A Petrobras destacou, em um comunicado, que tem a meta de “reduzir emissões absolutas em 25% até 2030” e que está desenvolvendo uma tecnologia para separação de óleo e gás no fundo do oceano, “que permitirá menor emissão de gases de efeito estufa para cada barril de óleo produzido e menores custos”.
ES ainda terá refinarias?
Quanto à existência de refinarias nos próximos anos, Ednilson Silva acredita que apenas um modelo de operação, ainda pouco popular, poderá ser rentável: as minirrefinarias. Tratam-se de indústrias que conseguem lucro com volumes menores de produção.
“À medida que esse modelo de negócio avançar e se tornar viável, podemos ter minirrefinarias não apenas no Espírito Santo, mas em vários outros Estados, para atender à demanda local. Tiraríamos da rodovia milhares de caminhões que transportam combustível de um lado para o outro, todos os dias. O impacto ambiental é menor”, detalha.
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