O governador Renato Casagrande (PSB) encerra, em 2023, o primeiro ano do terceiro mandato à frente do Poder Executivo estadual do Espírito Santo. Em 2026, ele não poderá tentar a reeleição. Mas, com planos de eleger um sucessor, não pretende deixar de lado investimentos e aportes em inovação e inteligência artificial. Nem a pauta do meio ambiente. Uma demonstração disso foi o que o chefe do Executivo capixaba contou nesta entrevista exclusiva para o Anuário de A Gazeta:
“Nós vamos usar o Fundo Soberano para que possamos nos associar a empresas que queiram gerar energia renovável no Estado. Nós já usamos o fundo para incentivar inovação tecnológica, aportamos R$ 250 milhões. E vamos lançar essa linha para energia renovável, inclusive hidrogênio verde. Vai ser no ano que vem (2024) o início da aplicação desse recurso”, adianta o governador.
Outra aposta é no uso da tecnologia para identificação e na segurança pública. Depois das câmeras que localizam, automaticamente, placas e outras características de veículos — o Cerco Inteligente —, a ideia é que elas passem a fazer a leitura biométrica facial, ou seja, que saibam discernir quem está andando nas ruas apenas pela imagem do rosto da pessoa.
A digitalização dos serviços públicos, que devem, quando possível, ser oferecidos apenas por um aplicativo, também está na lista. Confira a entrevista:
No final de 2022, o senhor afirmou que 53% dos cerca de 500 serviços ofertados pelo governo estadual já eram fornecidos digitalmente. Como está isso hoje?
Vai estar disponível para a população em 2024 um sistema que integrará todos os serviços num único endereço. Você terá acesso a todos os serviços que podem ser oferecidos de forma digital, exceto aqueles que não são possíveis, como os exames de saúde. Hoje, já digitalizamos 60% de tudo o que é possível. Para que a pessoa não precise ir ao Detran, por exemplo. Estará tudo em uma plataforma só. E temos investido em tecnologia também na área da segurança pública.
O senhor se refere ao Cerco Inteligente?
Sim, é uma ferramenta extraordinária de investigação. Nós já recuperamos mais de 600 carros roubados ou furtados, só por meio do Cerco Inteligente. E tem sido base de informação para os delegados trabalharem, para identificar veículos utilizados por criminosos. Isso é inteligência artificial na veia, porque não fica ninguém acompanhando [em tempo real]. Você só lança no sistema os dados que precisa e eles vão aparecendo. Nós também temos um centro integrado de análise telemática, da Polícia Civil, que tem dado excelentes resultados na investigação, especialmente na busca de descapitalizar o crime. E compramos dois comparadores balísticos, que possibilitam identificar a arma e o projétil, saber de onde veio a bala. Isso vai ser cada vez mais um investimento nosso. Também vamos começar a fazer a identificação facial.
Como será esse processo de identificação facial?
O Cerco Inteligente identifica características de veículos e agora vai reconhecer também pessoas. Estamos fazendo um cadastro novo. Temos um novo sistema de identificação civil e criminal, novas identidades digitais, que permitem mais qualidade no cadastro e nas fotografias. Vamos começar cadastrando toda a população carcerária, 23 mil pessoas. E o novo sistema (de carteira de identidade digital) permitirá a identificação facial. Isso vai ajudar a encontrar pessoas desaparecidas, perdidas, e também pessoas que cometem crimes, procuradas pela Justiça, que estejam cadastradas no nosso sistema.
Em outros países, ao ser implementada essa tecnologia, houve problema na identificação de pessoas negras, pois os testes foram feitos apenas com brancos, e as câmeras não identificavam as pessoas corretamente...
Não tem possibilidade de isso acontecer. O programa identifica pessoas com suas características, independentemente da cor da pele. O sistema, hoje, é preciso.
Ainda sobre tecnologia, mas quanto a empresas e meio ambiente, o senhor havia dito que o Espírito Santo iria incentivar empresas que desenvolvessem hidrogênio verde…
Nós vamos usar o Fundo Soberano para que possamos nos associar a empresas que queiram gerar energia renovável no Estado. Já usamos o fundo para incentivar inovação tecnológica, aportamos R$ 250 milhões. E vamos lançar essa linha para energia renovável, inclusive hidrogênio verde. Vai ser em 2024 o início da aplicação desse recurso. O Fundo Soberano será sócio dessas empresas, sempre de forma minoritária. Vai aportar recursos durante cinco anos e depois capitalizar o fundo novamente. Isso tem funcionado bem em outras modalidades. Queremos ter um hub de empresas de tecnologia, estamos incentivando empresas locais e acabamos de abrir o hub de inovação na Praça Costa Pereira. No ambiente de negócios em tecnologia, temos diversos instrumentos e investimentos do setor público e também do setor privado, como o Base 27 e outras empresas, investindo em inovação na Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo) e no Ifes (Instituto Federal do Espírito Santo). É um ambiente muito rico.
E como está a questão dos ônibus elétricos no Sistema Transcol? Atualmente, apenas uma linha opera com veículo elétrico, a Terminal de Laranjeiras-Terminal de Campo Grande, certo?
São quatro veículos, em uma linha. Estamos discutindo a logística de abastecimento, o grande problema do ônibus elétrico é o abastecimento. Estamos discutindo com a EDP a carga de energia e um local para abastecermos e, depois disso, vamos poder ampliar o número de ônibus elétricos no Estado. Mas pode ser que o hidrogênio verde chegue mais rápido e talvez não tenhamos de ampliar tanto os ônibus elétricos. Queremos que o Espírito Santo seja um produtor de hidrogênio verde e, talvez, com um custo menor. Podemos ter uma frota do Transcol com ônibus elétricos, com ônibus movidos a hidrogênio verde e alguns com um combustível de transição, que é o gás. É mais rápido, barato e mais fácil colocar um conversor a gás no ônibus a diesel. Então, pode ser que transformemos alguns veículos a combustão em ônibus a gás natural, que é uma fonte forte de energia com menos emissão de poluentes.
Mudando de assunto, agora para a política, o senhor, no mandato passado, foi governador enquanto Jair Bolsonaro (PL) era presidente da República. Agora, o presidente é Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O Partido dos Trabalhadores é um aliado do governo estadual. O governo federal, por sua vez, tem enviado ministros para cá com frequência. Mas, além de relações políticas cordiais, isso rende dividendos práticos para o Espírito Santo?
A ministra Simone Tebet (Planejamento) esteve aqui e nós entregamos 1.537 casas em Aracruz, em uma parceria entre os governos municipal, estadual e federal. A ZPE (Zona de Processamento de Exportação) de Aracruz é uma demonstração de boa vontade do governo federal. A solução da BR 101, que está prestes a acontecer, também é uma demonstração de articulação. A ferrovia EF 118 é uma expectativa real. A contratação do projeto de duplicação e ampliação da BR 262 está em execução. A contratação do projeto da BR 259, que liga Colatina à divisa com Minas Gerais, Baixo Guandu e Aimorés, está em execução. E inauguramos agora, em dezembro de 2023, o Contorno do Mestre Álvaro, na Serra. Para nós, o ano foi de muito sucesso, de muita conquista. Graças à presença minha, do (vice-governador) Ricardo Ferraço e da nossa bancada (em Brasília) na articulação com o governo federal.
E como está a articulação com os demais governadores do Sudeste e do Sul, no Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) ? O governador Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, chegou a dizer que os governadores dos Estados dessas regiões apoiariam um nome de direita para a Presidência da República em 2026, algo do qual o senhor discorda…
Ele sabe que o consórcio não é para isso, mesmo que, tirando a minha posição, todos (os governadores do Sul e do Sudeste) tenham sido eleitos no alinhamento com o então presidente Bolsonaro. Acho que ele (Zema) está compreendendo que o papel do consórcio é de aperfeiçoar políticas públicas e não ter opinião nem posição eleitoral.
Em relação à reforma tributária, os interesses do Espírito Santo não coincidem muito com os dos outros Estados do Sul e do Sudeste…
(Quanto à reforma) eu me articulo mais com outros Estados, como Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, e menos com os do Sul e do Sudeste, que têm interesses diferentes. Qual a principal preocupação com a reforma tributária para o Espírito Santo? Estou preocupado porque a média de receita, a partir do ano 2032, será o ICMS de 2024 a 2028. Das 27 unidades da federação, 18 já aumentaram a alíquota. Isso dará a esses Estados uma média maior. [Espírito Santo é um dos que aprovou o novo percentual. Quando a entrevista foi concedida a reforma não havia passado no Senado nem o Estado havia aprovado uma nova alíquota para o ICMS].
Mas o Espírito Santo tem expectativa de aumento da arrecadação de ICMS a partir de 2024…
Mas eles (os 18 Estados) aumentaram a alíquota modal. Passaram de 18% para 20%, de 17% para 19%... Tem Estado, como Sergipe, que foi a 22%. Eles aumentaram para compensar a perda de ICMS com a redução no combustível, na energia elétrica e na comunicação e também para aumentar a sua média, já pensando na média (de ICMS) de 2024 a 2028. E os outros Estados do Sul e do Sudeste não fizeram isso. Estamos avaliando quanto nós perderemos a partir de 2032. [A conta já foi feita e, de acordo com a Secretaria de Estado da Fazenda, o Espírito Santo perde R$ 20 bilhões com a entrada das novas regras tributárias para o país que estabelecem a unificação dos impostos].
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.