As notícias da última semana colocaram as mulheres em revolta nas redes sociais – com razão. Uma menina, de apenas 11 anos, engravidou de uma violência sexual e tentou exercer seu direito legítimo de interromper uma gestação que poderia ter consequências físicas para seu pequeno corpo de criança, mas sobretudo consequências psicológicas e sociais para o resto de sua vida.
É uma violência sem tamanho, e ela merecia ter tido seu pedido atendido prontamente, sem que a Justiça tivesse interferido, ainda mais da maneira que a juíza agiu – de forma vil e covarde incentivando que ela seguisse com a gravidez e chamando o estuprador de “pai”.
Por outro lado, temos a jovem atriz que também engravidou de um estupro. Ela descobriu já no final da gestação e optou por ter a criança e entregá-la para adoção. Foi desmoralizada, humilhada, julgada nas redes sociais. Teve sua vida exposta, divulgaram todas as informações sobre esse filho. A conclusão é que não importa o que fazemos, sendo mulher, a sociedade, as instituições e as leis já estão contra nós. Certo mesmo é ser homem.
Não há discussões sobre a ampliação do acesso a métodos contraceptivos. Não se coloca os homens nesta conversa, a carga é toda da mulher. Não querem ofertar educação sexual para as pessoas se munirem de informações e poderem realizar escolhas conscientes. Alguns lugares querem criminalizar a pílula do dia seguinte. Não se permite o aborto nem quando é caso previsto em lei. Uma vez que essa criança chega ao mundo, não há educação, saneamento, moradia, saúde, emprego, lazer, para ela e sua família. Não é sobre vidas, é sobre controle e manutenção de uma estrutura social, política e econômica machista.
A Pesquisa Nacional do Aborto, realizada pelo Anis Instituto de Bioética e pela Universidade de Brasília (UnB) em 2016, fala por si: uma em cada cinco mulheres fará um aborto até os 40 anos, sendo a maioria casada, com filhos anteriores, religiosas e usuárias de métodos contraceptivos. Isso significa que o aborto não tem rosto: todas nós conhecemos alguém que já realizou uma interrupção de gravidez e poderíamos também ser uma mulher que aborta.
A pesquisa traduz a realidade: independentemente da proibição, as mulheres abortam. Por isso, insisto, não é possível banir o aborto, apenas proibir que mulheres realizem abortos seguros, com auxílio médico, em ambientes adequados e apoio psicológico. Pense nisso. Aborto é questão de saúde pública, não cabe em Código Penal.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.