Sou testemunha, como filha adotiva, de que, quando se decide pela adoção, o desejo de ter um filho transcende aos laços sanguíneos e se sustenta em vínculos enraizados em forte sentimento de conexão entre pessoas: o amor, o cuidado, o acolhimento, o pertencimento que se multiplicam a partir de um encontro proporcionado pela vida.
Quando falamos em maternidade, geralmente associamos o conceito à experiência que a mulher tem após gerar e dar à luz um bebê. Só que essa percepção, fundamentada na nossa cultura e nos nossos costumes por diversos fatores sociológicos e históricos, pode estar limitando a compreensão sobre as maravilhas e as dificuldades que envolvem o tema.
Resumir a maternidade ao feito de “gestar” seria uma forma de classificar e restringir o amor maternal, limitando-o apenas ao vínculo biológico e sanguíneo - uma vez que nem toda mulher pode/deseja dar vida a uma criança.
Com frequência, também testemunhamos um outro tipo de cobrança social fincada em estereótipos: as mulheres que se tornam mães por meio da adoção são, frequentemente, questionadas sobre o quão a maternidade é uma experiência real em suas vidas.
Precisamos quebrar preconceitos e buscar mais informação. Essa conscientização permite entender que uma mulher dar à luz é algo tão natural quanto adotar quando se assume o compromisso parental. Ou seja: o que torna a mulher mãe é um conjunto de ações concretas baseadas na existência do amor ao filho, seja essa experiência viabilizada pela adoção ou não.
Ser mãe é, antes de tudo, doação. Algumas mães têm a possibilidade de doar literalmente seu corpo. Doa-se o ventre, local seguro para que o feto se desenvolva até ter a capacidade de viver fora daquele espaço protegido e caloroso. Outras têm esse abrigo uterino transferido para a esfera simbólica do sentimento, do coração, do profundo desejo de amar uma vida gerada no ventre de outra mulher.
É preciso construir a visão de que esse ato de amor ocorre também na chamada adoção tardia: quando famílias adotam crianças em idade mais avançada, dando oportunidade de um novo futuro a pessoas suscetíveis de continuar no abandono e na privação afetivos por estarem fora de padrões estéticos e etários que, ainda hoje, geram preferência por bebês recém-nascidos e de cor branca.
Sabemos que nem sempre a gestação desperta o lado maternal da mulher, mas entendo e percebo que o exercício diário de cuidar da criança faz florescer o sentimento da maternidade. O ato de gestar é apenas biológico, enquanto que a maternidade é emocional, é envolvimento, é entrega, é preenchimento.
Maior alegria não é perpetuar como herança o vínculo sanguíneo ou a semelhança física, mas nutrir a sensação de ter um filho nos braços e nos abraços de acolhimento e de pertencimento amorosos. A maternidade surge, nesse sentido, como o despertar para SER efetivamente uma mãe em uma plenitude que ultrapassa o papel social: aquela que ama se dedica ao compromisso de criar, educar e preparar para o mundo o ser humano que está sob seus cuidados.
É o jeito de acolher e a decisão de amar que fazem a diferença. Sem amor não haveria mãe nem pai. Sem acolhimento seria impossível haver a família, seja ela constitutiva das múltiplas formas possíveis.
Neste Dia das Mães, desejo que todas as mulheres que vivenciam a maternidade sintam-se encorajadas na missão de educar seus filhos para a vida, conscientes da importância de manter sempre o coração aberto, buscando conhecimento, trocando experiências, ajudando a desconstruir tabus e travas que, muitas vezes, são barreiras que impedem a experiência da adoção e a construção de uma história linda, inspiradora e transformadora em família.
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