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É senador da República pelo Espírito Santo; advogado, professor de Direito e delegado aposentado da Polícia Civil. É casado com o Rodrigo e pai do Gabriel e da Mariana

Adoção tardia: entre tantas escolhas, opte pelo amor

Ao saber que seria pai pela primeira vez,  senti a maior emoção da minha vida. Fui recebido pelo Gabriel no abrigo. Naquele dia, foi ele quem abriu a porta da instituição. Ninguém tinha nos apresentado, mas o meu coração de pai sabia que era ele

  • Fabiano Contarato É senador da República pelo Espírito Santo; advogado, professor de Direito e delegado aposentado da Polícia Civil. É casado com o Rodrigo e pai do Gabriel e da Mariana
Publicado em 25/05/2024 às 10h00

Adoção é um ato revolucionário de amor. Um amor que não tem cor, não tem sexo, não tem idade. Um amor que simplesmente existe. Adotar é escolher o afeto incondicional. Hoje, cerca de cinco mil crianças e adolescentes estão em algum abrigo do Brasil, sendo 65 delas no Espírito Santo, em busca um lar, uma família e uma nova história. A maioria tem entre 8 e 17 anos, idades menos procuradas pelos adotantes. A cada “não” que esse grupo recebe, uma oportunidade de construção de família e de amor é frustrada. Precisamos nos unir, incentivar e reconhecer iniciativas de pessoas e de instituições que estimulam a adoção e, mais ainda, a adoção tardia.

Sei que o processo de adoção nem sempre é fácil. Passei por ele duas vezes para conseguir construir a minha família. A mim, aos meus filhos e ao meu marido, a vida foi dura ao nos negar o reconhecimento e ao nos impor sistemáticos percalços. Nossa trajetória foi, muitas vezes, marcada pela dor e pela exclusão. O que era espontâneo e simples para muitos, como uma certidão de casamento, para nós era um conjunto de sucessivas batalhas e dificuldades.

Enfrentei, inclusive, a conduta homofóbica de um promotor de Justiça do Espírito Santo no processo de adoção. O promotor fez comentários homofóbicos ao se referir a mim e ao meu marido. O Estado foi condenado a nos indenizar pelas falas preconceituosas do promotor. E ele foi punido administrativamente com cinco dias de suspensão do cargo.

Em resposta, encaminhei ao Conselho Nacional do Ministério Público e ao Conselho Nacional de Justiça uma recomendação para que membros do Ministério Público não se manifestem de forma contrária à adoção de crianças e adolescentes apenas com base na orientação sexual dos adotantes. Recentemente, por unanimidade, os pedidos foram acatados e essa é uma importante vitória para permitir que casais do mesmo sexo consigam finalizar processos de adoção e não deixar que o preconceito enraizado impeça as crianças de terem a oportunidade de fazerem parte de uma família.

Apesar de todas as dificuldades que enfrentamos durante esse processo, a recompensa foi ainda maior que os desafios. Os obstáculos da moral, das leis, da violência e da negação da nossa legitimidade como Família, assim, com “F” maiúsculo, nos fez mais unidos e fortes. Nosso amor não vislumbrou barreiras, não enxergou cor, classe social ou gênero: só se guiava pelo desejo sincero de estarmos juntos, sermos e fazermos uns aos outros plenos e felizes.

Ao saber que seria pai pela primeira vez, em março de 2017, senti a maior emoção da minha vida. Fui recebido pelo Gabriel no abrigo. Naquele dia, foi ele quem abriu a porta da instituição. Ninguém tinha nos apresentado, mas o meu coração de pai sabia que era ele. Eu sabia que, sim, eu estava diante do meu filho. Tremia o corpo todo de tanta emoção e felicidade.

Depois disso, eu e Rodrigo seguimos na fila de adoção e Deus mais uma vez nos abençoou. Em 2020, Gabriel ganhou uma irmã, a Mariana. Os meus filhos são a razão da minha vida. Como disse o poeta Wystan Hugh Auden, “são o meu Norte, o meu Sul, meu Leste, meu Oeste, minha semana de trabalho, meu domingo de descanso, meu meio-dia, minha meia-noite, minha conversa, minha canção”

Família
O senador Fabiano Contarato com o marido, Rodrigo Groberio, e os filhos Mariana e Gabriel. Crédito: Arquivo familiar

Hoje, sou a pessoa mais feliz do mundo ao lado dos meus filhos. Mariana é a alegria das nossas vidas. Gabriel é a razão das nossas vidas. Mas nem todas as crianças e adolescentes que buscam uma família conseguem um lar. No processo de adoção dos meus filhos, percorri inúmeros abrigos e vi como são deixados ali.

São muitos episódios de rejeição, começando, muitas vezes, pelos pais biológicos. A cada dia, quando uma criança ou um adolescente acorda e não encontra o outro que estava ali, porque o outro foi adotado, é mais uma perda. A cada aniversário que passam no abrigo, a data, que deveria ser motivo de alegria, vira motivo de repulsa, porque vão diminuindo as possibilidades de adoção.

Pensando em amenizar a dor dessas milhares de crianças e adolescentes, instituímos, em 2021, um importante projeto para premiar e incentivar a adoção tardia. O "Prêmio Adoção Tardia - Gesto Redobrado de Cidadania" busca trazer um reconhecimento simbólico a pessoas ou instituições que desenvolvem ações, atividades e iniciativas que estimulem a adoção tardia – de crianças com mais de 3 anos – ou crianças e adolescentes com irmãos, com deficiência, doença crônica ou necessidades específicas de saúde. A nossa intenção é divulgar e fomentar as boas práticas para o incentivo da adoção tardia.

E a quem tem interesse ou já está na fila da adoção, o que posso dizer, com toda a certeza do mundo, é que, ao adotar, você receberá o milagre da vida, do amor e da realização da sua própria humanidade. Repito: adoção é um ato revolucionário de amor!

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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