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É economista, professor universitário, pesquisador e doutor em Ciências Contábeis.

Afinal, quando vamos discutir seriamente o FGTS?

Ninguém perguntou ao balconista, enfermeiro, motorista, caixa ou qualquer outro funcionário CLT se ele topa pagar do bolso dele parte dos juros da compra de casa própria de outros brasileiros

  • Felipe Storch Damasceno É economista, professor universitário, pesquisador e doutor em Ciências Contábeis.
Publicado em 16/06/2024 às 10h00

Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou um julgamento iniciado em 2023 sobre uma ação impetrada em 2014: a constitucionalidade dos 3% na rentabilidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Pela decisão, não existe a obrigatoriedade constitucional de rentabilizar acima da inflação e proteger o patrimônio dos cotistas do fundo.

Primeiro, essa decisão evita uma insegurança jurídica enorme de extrapolar a compreensão para os fundos privados. Já pensou? Parece um absurdo cogitar essa possibilidade, mas estamos falando do Brasil.

Segundo, o STF decidiu que a rentabilidade mínima deve ser pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Agora, vamos pensar nos impactos gerados por essa decisão.

O governo suspirou aliviado! A decisão não é retroativa e todo aquele período em que fomos remunerados abaixo da inflação não será indenizado. Além disso, o ministro Barroso relatou o projeto e queria rentabilizar pela poupança, uma taxa de 6,17%, mais que o dobro do famigerado 3%. O IPCA ficou como um meio termo. Os trabalhadores melhoraram um pouco. Agora não vamos mais perder para a inflação, apesar da rentabilidade ainda não encher os olhos.

O FGTS é sempre um assunto polêmico. Ele cumpre um papel social de financiar o investimento imobiliário e tem rentabilidade baixa justamente para subsidiar essas linhas de crédito. É uma política pública que favorece quem adquire imóveis e o setor da construção civil. Claro que é um setor sensível da sociedade. Moradia é um assunto delicado e a geração de empregos é volumosa.

Outro ponto em defesa do FGTS é a necessidade de existir uma poupança compulsória para funcionar como um colchão para o período entre a perda do emprego e a realocação. Em um país que tem um nível de educação financeira bem baixo, essa política pública é bastante importante.

A questão a ser pensada é se o subsídio dado ao crédito imobiliário utilizando recursos dos trabalhadores é justo com os cotistas do fundo. Com certeza, ninguém perguntou ao balconista, enfermeiro, motorista, caixa ou qualquer outro funcionário CLT se ele topa pagar do bolso dele parte dos juros da compra de casa própria de outros brasileiros.

Agência da Caixa Econômica Federal; pagamento PIS/Pasep e FGTS
Agência da Caixa Econômica Federal; pagamento PIS/Pasep e FGTS. Crédito: Caixa/Divulgação

Não vejo funcionários do setor de construção reduzindo suas taxas de lucro para garantir maior venda de imóveis e mais emprego para o setor. Não acho que eles devam fazer isso, mas por que está tudo bem quando são os trabalhadores formais que pagam a conta?

Façamos uma poupança compulsória com rentabilidade justa para garantir o crescimento do patrimônio dos trabalhadores, usando Tesouro Selic ou algum ativo similar. Se o crédito imobiliário deve ser subsidiado, que seja pelo governo. Que seja feita uma discussão profunda sobre os gastos do governo, sobre prioridades e sobre os fundamentos do mercado de crédito e a compreensão dos motivos para o crédito ser tão caro no mercado brasileiro.

O argumento de rediscutir o subsídio imobiliário é polêmico, eu sei. A questão é que estamos fazendo 46 milhões de brasileiros serem prejudicados para favorecer um setor da sociedade. É muito cômodo para o governo continuar fazendo política pública com o dinheiro dos outros.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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