Enquanto escrevo esta reflexão, uma polêmica relacionada à variação cambial tomou conta da semana tendo como capítulo final a queda do dólar. Aparentemente uma reversão do movimento de alta, numa reação do mercado ao anúncio do governo federal de que vai manter e cumprir a meta fiscal, que numa comparação simples nada mais é do que o cuidado que precisamos ter na vida pessoal e nas empresas com os gastos. Quando gastamos mais do que devemos e podemos, nos endividamos e desorganizamos enquanto famílias, empresas e governo.
As turbulências dos últimos dias, embora possam ter base real, foram em grande parte influenciadas por declarações do presidente Lula, na linha da polêmica que ele trava publicamente, desde o início do seu governo, com o presidente do Banco Central. É preciso separar muito bem as coisas. "Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa".
Vamos aos fatos! Se há unanimidade no Brasil é de que as taxas de juros são obscenas, inibindo investimentos, travando o crescimento e a geração de empregos e oportunidades. E o dólar alto impacta na inflação, aumentando preços e reduzindo a capacidade de consumo das pessoas. Outra questão é de como devemos enfrentar o assunto. Não será com bravata ou com populismo que esse desafio será superado, mas sim com a sequência das importantes reformas que podem ajustar o Estado Brasileiro para que ele possa devolver, em investimentos, a alta carga tributária que os brasileiros pagam.
Nos últimos anos o Brasil tem realizado uma série de reformas institucionais que atualizam e modernizam o ambiente econômico do país, entre as quais se insere a autonomia do Banco Central. Em 2017 houve a Reforma Trabalhista, em 2019 a Reforma Previdenciária, em 2021 entrou em vigor a Nova Lei do Gás, em 2023 o Novo Marco Legal do Saneamento e em andamento a Reforma Tributária com expectativa que possa simplificar, desburocratizar e garantir transparência aos impostos no Brasil, que como o próprio nome diz, se fosse bom não seria imposto, seria voluntário.
Instituições como Itamaraty, Forças Armadas e o Banco Central são de Estado e não de governos, não devendo atender aos interesses de curto prazo dos governantes de plantão.
A Lei de Independência do Banco Central foi sancionada em fevereiro de 2021. A partir de então o BC deixou de ser formalmente vinculado ao Ministério da Economia, e tornou-se uma Autarquia de Natureza Especial, com autonomia técnica, operacional e financeira. Outra mudança essencial foi estabelecer que não haja coincidência dos mandatos dos diretores com o do Presidente da República. A missão do BC explicitada na lei é de “assegurar a estabilidade de preços, mas também deverá zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego.”
A autonomia do BC e o Sistema de Metas de Inflação asseguram previsibilidade e evitam intervenções políticas e eleitoreiras na política monetária. Não faltam exemplos disto na história do Brasil e de diversos países, com um resultado em geral nefasto. Pode-se discordar de aspectos da condução da gestão do BC sobre a taxa de juros e de câmbio e também pode e deve-se questionar o equívoco do presidente Roberto Campos Neto de participar de atividades de cunho político, eleitoral e partidário, o que é incompatível com o cargo que ocupa. Mas, no geral, a sua administração no BC é reconhecidamente consistente.
Neste contexto, as falas do presidente Lula sobre a atuação do Banco Central parecem estar deslocadas da realidade. Como se fizessem parte de um mundo imaginário, que desconsidera as restrições e desafios do mundo real e que acredita que tudo só depende de nossos desejos. E que por sua vez acabam alimentando um quadro de insegurança e incertezas nas previsões de futuro.
Afinal, não se trata da manifestação de qualquer ator, mas do principal mandatário do país. Desnecessário e improdutivo. Vamos travar o bom debate.
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