Desde quando minha memória pode alcançar a minha infância, o mar sempre me atraiu. Ir à praia esteve entre os meus programas favoritos. Imerso nessa relação é que, há dez anos, subi em uma prancha e iniciei a prática de stand up paddle (SUP). Não parei mais de andar sobre a água e recentemente fitei as velas coloridas que passavam em minha frente, pensando: “Quem sabe um novo esporte?”. Aceito o desafio, matriculei-me em um curso de windsurf e, desde então, não largo a prancha e nem deixo de me transportar com reflexões, as quais compartilho a seguir, para meu ambiente de trabalho: a sala de aula.
Primeiramente, o windsurf e minhas tantas outras experiências me mostram que aprender é um ato de coragem. Ouvir o instrutor, levantar-me e me manter equilibrado na prancha, vendo a vida por um outro ângulo, não é fácil. As quedas são inevitáveis e constrangedoras. Já cheguei a achar que as pessoas na areia estavam apostando quantas vezes eu ainda cairia na aula.
Lembrando dos meus alunos, é impossível não pensar: quantas vezes eles erram? A sala de aula exige a coragem do encontro com a ignorância e a curiosidade, que equivale à fome, como sabiamente sugeriu Rubem Alves, levando o aluno ao desconhecido e o trazendo de volta mais forte e rico. No mar, lógica e inteligência corporal cinestésica entram em cena para que se possa velejar com sucesso. Mas para isso é preciso estar no mar, imerso de destemor para cair, levantar e seguir.
Aprender também requer resiliência. A queda em si, no windsurf e geralmente na vida, é bem rápida, e as sensações evocadas – falta de controle (paixão do ser humano), erro e falta de competência – mostram que persistir, levantar uma vela encharcada e retomar o equilíbrio e o rumo é ainda mais difícil, apesar de ser o único caminho que temos para enfim velejar. Quando iniciei as aulas de windsurf optei pelas avulsas. Depois, apesar de inúmeras quedas, fiz um pacote de cinco, mais cinco, mais dez e, quando vi, o vento já tinha me levado. Lidei com os mesmos erros e, consequentemente, as mesmas correções e explicações do meu paciente professor, comprovando que explicar é uma coisa, aprender é outra, estando o sucesso nesse processo.
Além disso, aprender ainda requer flexibilidade. No windsurf, pelo menos para um iniciante como eu, a falta de vento é tão desafiadora quanto o excesso dele. Certo dia me vi preso entre píeres e sem vento. O professor aproveitou para me ensinar a manobra de “caçar a vela”. Com muito esforço, retornei para a praia, atrasando, entretanto, a aula seguinte.
Descansado, fiquei a refletir quantas vezes, como professores ou alunos, não respeitamos os limites de um dia ruim, impondo um planejamento feito sob outras condições. O que fazemos quando o ideal não está presente? O quão flexíveis somos para alternar os planos, fazer os desvios e as paradas não planejadas para que possamos chegar onde miramos e, sobretudo, para que a jornada seja significativa?
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São mesmo infinitos os caminhos da aprendizagem, aconteçam elas no mar, no ar ou na terra. O papel do professor, combinando técnica, paciência, companheirismo e comprometimento com o aprendiz, sendo a primeira ou a última aula do dia, é determinante. A receptividade do aluno, aliando curiosidade, coragem, resiliência e flexibilidade, também. O sucesso de qualquer processo de aprendizado está nesse encontro nas diversas escolas da vida.
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