A vitória de Arthur Lira (PP) na Câmara e de Rodrigo Pacheco (DEM) no Senado e os lances que precederam as eleições de ambos no Congresso na última noite (1º) garantem a Bolsonaro o apito amigo na regra do impedimento. O impeachment, que já não era uma possibilidade tão robusta, torna-se por ora ainda mais distante com a ascensão patrocinada dos novos presidentes das Casas.
A descomunal autoblindagem promovida pelo governo foi de deixar de queixo caído até a mais fisiológica das figuras do Legislativo, com direito a barganhas à luz do dia e liberação de R$ 3 bilhões em emendas que arregalou os olhos dos parlamentares e fragmentou o nome de Baleia Rossi (MDB), candidato de Rodrigo Maia (DEM). Na Câmara, Lira (e Bolsonaro) ganhou com um placar elástico em primeiro turno: 302 votos dos 513 possíveis. A chamada “nova política” nem no discurso superficial entrou em campo e até a criação de mais três ministérios foi cogitada pelo Planalto.
Por trás de tudo isso, há as ingerências. Todo esse aparato de defesa visa a encobrir as imprudências, negligências e imperícias de um Executivo que vem conduzindo as medidas na pandemia com uma série de atos asfixiantes de desrespeito à vida humana. As mais de 200 mil mortes pela Covid-19 por si só seriam suficientes para, ao menos, uma movimentação maior do Congresso se o jogo fosse jogado à luz do regulamento.
O fim do auxílio emergencial – somado à má vontade para aquisição das vacinas e à desestruturação no sistema de saúde que resultou na falta de oxigênio nos hospitais de Manaus – levou a um processo acelerado de queda de popularidade de Bolsonaro, que ainda assim mantém um secto de 30% a 35% fechando nesse apoio de modo aparentemente incondicional. Fica a pergunta: o que mais um gestor poderia fazer para ser “cancelado” por seus simpatizantes restantes?
Na recente democracia brasileira, a triangulação que culmina em impeachment é formada por crise econômica, baixíssima popularidade e gente (muita gente, um mar de gente!) nas ruas. Diferentemente da saída de Collor e o injusto processo contra Dilma, baseado em pedaladas (?), ainda não temos os dois últimos pilares desse tripé. Ainda.
Crise, temos de sobra. Se a voz dos descontentes engrossar e os panelaços se fizerem ouvir de forma mais incidente e incisiva em Brasília, aí sim o cenário pode se reverter a ponto de Arthur Lira se sentir obrigado a pautar o processo de impeachment por pressão do mesmo Centrão que representa e que o projetou ao cargo de presidente na Câmara, a posição estratégica para a manutenção ou não de um chefe do Executivo no poder.
Com sua habitual lógica não ideológica e altamente pragmática, é esse bloco que não tem fidelidade canina a nada e a ninguém que exerce grande peso nos rumores e rumos do país. A disposição em drenar com suporte bilionário a candidatura de Lira diz muito sobre as cenas dos últimos dias e a aliança consolidada, com debandada do DEM e de outras siglas da coalizão em torno de Baleia Rossi.
Bolsonaro, por enquanto, se safa, mas ele que não pense que suas jogadas estão imunes a penalidades máximas. O apito amigo de Lira na arena é uma mão na roda por ora, mas o VAR das ruas é quem enquadra os players nos poderes e decreta o impedimento. A partida vai até 2022.
O autor é mestrando em Administração Estratégica do Setor Público e Privado pela Fucape, cofundador do Projeto Universidade Para Todos e ex-deputado estadual
Este vídeo pode te interessar
LEIA MAIS ARTIGOS
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.