A recente condenação do deputado federal Daniel Silveira pelo STF e o posterior decreto editado pelo presidente da República perdoando o parlamentar têm gerado discussões infindáveis e análises de diversos tipos. Resumidamente, temos o seguinte: o Supremo condenou Daniel Silveira a oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, por crimes de incitação à abolição violenta do Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo.
Para a maioria dos ministros, as declarações que motivaram a denúncia da PGR não foram apenas opiniões relacionadas ao mandato e, portanto, não estão protegidas pela imunidade parlamentar nem pela liberdade de expressão.
E aqui está o ponto de partida: a liberdade de expressão possui limites, ela não é absoluta. No Brasil, não se pode dizer ou publicar o que quiser irresponsavelmente. Basta pensar, por exemplo, nos crimes contra a honra e no crime de ameaça.
Segundo ponto: em 2019, após instauração do inquérito, o ministro Alexandre de Moraes foi designado pelo ministro Dias Toffoli como autoridade investigadora dos ataques ao STF e da divulgação de fake news. Inquérito instaurado de ofício e com a designação de um ministro que passou a determinar as diligências, com buscas e apreensões e até mandados de prisão, sem pedido do MPF ou da autoridade policial? Nada mais inquisitivo.
Terceiro ponto: o deputado federal foi condenado a oito anos e nove meses de reclusão e o tribunal determinou a suspensão dos direitos políticos e a perda do mandato parlamentar. Logo em seguida, o presidente editou o decreto que perdoou Daniel Silveira. A graça possui previsão constitucional e legal e o presidente pode concedê-la. Ela é individual, não se confunde com o indulto (coletivo), afasta os efeitos primários da condenação (pena), mas não os efeitos secundários, como a obrigação de reparar os danos oriundos do crime e a inelegibilidade. Extingue-se a punibilidade, ou seja, o réu deixa de cumprir a pena, mas os efeitos secundários permanecem.
Quarto ponto: na ânsia de perdoar o aliado político, o presidente editou e publicou o decreto antes de transitar em julgado a decisão do STF, atuando quase como uma instância revisora do tribunal. Um vício grave que pode gerar a nulidade do ato. Quanto a eventual crime de responsabilidade do chefe do executivo, parece pouco provável. Quinto ponto: A jurisprudência do STF admite ser possível controlar judicialmente a legalidade de um decreto de indulto, mas não o seu mérito.
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Ponto final: difícil saber qual será o desfecho deste imbróglio, mas já está claro que: (a) quando se trata de persecução penal no Brasil, os fins justificam os meios (basta lembrar da Lava Jato); (b) quando virou réu, o deputado admirador da ditadura e defensor do AI-5 e de torturadores se transformou em um fervoroso defensor dos direitos e garantias constitucionais; (c) ao imunizar Daniel Silveira, o presidente favoreceu “a impunidade de um criminoso condenado” e, finalmente; (d) a justiça criminal é seletiva; como disse Eduardo Galeano, ela “é como uma serpente, só morde os pés descalços”.
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