Em 5 de novembro de 2015, a barragem do Fundão, em Minas Gerais, rompeu-se e liberou toneladas de resíduos da mineração ao longo do Rio Doce. Os resíduos percorreram todo o rio, alcançando sua foz em Regência, em Linhares, e constituiu assim o maior desastre ambiental da história brasileira. Os principais responsáveis são as gigantes da mineração mundial: Vale S.A. e BHP Brasil. Juntas, elas detêm a Samarco S.A., empresa proprietária da barragem rompida.
Desde então, milhares de processos judiciais foram abertos. Muitos dos processos estão estagnados devido a manobras processuais e acordos não cumpridos. Quase oito anos após o ocorrido, a representatividade das comunidades afetadas no processo de reparação mostram-se ineficientes.
Embora o Rio Doce seja um dos rios mais monitorados atualmente, a recuperação ambiental de seu percurso apresenta um panorama desolador. E não há planos claros sobre como revitalizar o rio e suas margens. Iniciativas como o consórcio Rio Doce Mar, que envolveu universidades no monitoramento do impacto ambiental, foram interrompidas sem justificativa, mesmo com os indicativos de que o desastre tem consequências duradouras.
A relativa impunidade das empresas decorre, em parte, de acordos judiciais que assinaram com instituições brasileiras e que estão longes de serem cumpridos em sua íntegra. Acordos como o TTAC e o TAP empregaram técnicas avançadas de mediação. Nesse panorama, a Fundação Renova foi criada com a missão de remediar os danos.
Embora apresentada como uma solução inovadora, a fundação não cumpriu suas promessas, decepcionando as famílias afetadas. A atuação da Fundação Renova é frequentemente questionada quanto à sua independência e à gestão de seus recursos por instituições de justiça, vítimas e sociedade civil. A insatisfação com a falta de inclusão das vítimas no TTAC levou à criação de um adicional, o TACGov.
Somente em 2023, as disposições que se referem à assessoria técnica dos atingidos começaram a ser plenamente executadas. O surgimento de um novo sistema de indenização durante a pandemia, estabelecido pela 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, foi alvo de críticas. Esse sistema incentivou advogados a competir entre si, ampliando a confusão entre as comunidades afetadas.
Para tornar a situação ainda mais complexa, diante das falhas e conflitos observados, o Conselho Nacional de Justiça e o Supremo Tribunal Federal propuseram uma "repactuação", buscando mediar os termos acordados anteriormente. Os desafios persistem, com conflitos entre as partes envolvidas, predominância das mineradoras e estratégias burocráticas que complicam a reparação efetiva.
Diante dessa morosidade, em 2018, uma ação coletiva foi ajuizada na Inglaterra contra as empresas BHP Group PLC e BHP Group Limited e seu julgamento de responsabilidade acontecerá em outubro de 2024. A abordagem do sistema denominado "Novel" segundo críticos, não se alinha ao modelo de processo coletivo brasileiro. Em julho de 2023, uma revisão desse sistema pelo novo juiz da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte apontou vícios insanáveis, suspendendo-o e retomando a práxis processual para tutela coletiva de direitos.
A retomada das reparações via judiciário traz novos desafios. Se não for adequadamente gerido, o aumento no número de ações individuais pode agravar a desconfiança na justiça. Contudo, ao se voltar para o modelo brasileiro de processo coletivo, há esperança de que uma solução estrutural e representativa para as vítimas possa ser tomada, a partir do gerenciamento do caso diretamente pela Corte.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.