No Brasil, 27 de setembro é o Dia Nacional da Doação de Órgãos. Embora a campanha mais conhecida seja o Setembro Amarelo, o mês também é marcado pela campanha de conscientização e sensibilização para a doação de órgãos, representada pela cor verde.
Assim como ocorre com tantas outras questões de saúde, é comum que as pessoas só se sensibilizem por grandes campanhas ou quando elas mesmas ou pessoas próximas são atingidas.
De acordo com dados divulgados neste ano, aproximadamente 65 mil pessoas estão na lista de espera do Sistema Nacional de Transplantes, o que demonstra que os índices de doação são muito inferiores à quantidade de pessoas que aguardam por um órgão. Dessa forma, estima-se que, a cada ano, 3 mil pessoas morrem enquanto esperam pelo transplante.
Para propor ações que busquem reduzir esses números e amenizar o sofrimento de quem necessita de um transplante, é preciso compreender o procedimento adotado no Brasil. Conforme o art. 4º da lei 9.434, a retirada de órgãos e tecidos, após a morte, para transplantes, depende de autorização da família da pessoa que faleceu. Ou seja, mesmo que o indivíduo tenha se declarado doador de órgãos, o que prevalece é a decisão da família.
Portanto, a recusa familiar é um dos principais obstáculos à doação de órgãos, o que contribui para o aumento da quantidade de pessoas na lista e, consequentemente, o tempo de espera. Essa recusa pode decorrer de diversas questões, como um medo infundado em relação à retirada de órgãos, a dificuldade em tomar mais uma decisão em um momento difícil ou, até mesmo, a falta de comunicação entre os membros da família. Afinal, a morte ainda é um tabu em nossa sociedade, o que faz com que, muitas vezes, as pessoas deixem de discutir ou compartilhar decisões sobre o que deve acontecer após a sua morte.
Mesmo nos casos em que o indivíduo tenha consciência de sua intenção em ser um doador post mortem, pode acontecer de simplesmente não informar à sua família, por esquecimento ou descuido, o que pode inviabilizar a concretização de sua vontade.
Atualmente, é possível registrar essa opção no documento de identidade ou por meio de uma Autorização Eletrônica de Doação de Órgãos, realizada de forma digital junto a um cartório. Entretanto, esses documentos não são suficientes para viabilizar a doação, caso os familiares não concedam sua autorização.
Diante disso, é oportuno adotar o modelo de consentimento presumido, como já ocorre em diversos países, como Portugal, Espanha, França e Itália. Quando se presume o consentimento para a doação de órgãos, esta passa a ser a regra. Caso não haja uma manifestação de vontade em contrário, todos os indivíduos são considerados doadores.
É importante ressaltar que a presunção do consentimento não obriga ninguém a doar. No âmbito desse modelo, deve haver um mecanismo que permita que qualquer pessoa manifeste sua vontade de não ser doadora de órgãos. Afinal, apesar de serem poucas as justificativas racionais para se negar a doar os órgãos de uma pessoa que já faleceu, é válida a oposição do indivíduo, por suas convicções, sejam elas da natureza que forem. Logo, as pessoas que assim desejarem terão a prerrogativa de se declararem não doadoras.
Ao adotarmos esse modelo, passaremos a evitar que doações de órgãos sejam impedidas em virtude de uma recusa familiar incompatível com a vontade da pessoa que faleceu. Busca-se, também, naturalizar o aproveitamento para transplantes dos órgãos das pessoas falecidas, salvando ou melhorando as condições de vida de outras pessoas, concretizando o princípio constitucional da solidariedade.
A proposta do consentimento presumido para a doação post mortem de órgãos já foi apresentada ao Congresso Nacional, por meio de diferentes projetos de lei, que foram reunidos, mas se encontram parados há mais de um ano. Para aqueles que aguardam sua vez na fila do Sistema Nacional de Transplantes, essa espera tem um peso redobrado.
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