Foi publicada nesta quarta-feira (29) no Diário Oficial a Portaria GM/MS n. 1.999/2023, que atualiza a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho. A referida norma regulamenta o inciso VII do §3º, art. 6º, da Lei n. 8.080/90 que prevê a edição periódica de lista oficial de doenças decorrentes do processo produtivo.
A lista anterior vigente era de novembro de 1999, Portaria GM/MS n. 1.339, incorporada à Portaria GM/MS n. 5/2017, que possibilita a revisão anual da listagem, mas que na prática não ocorria.
São praticamente duas décadas sem que a listagem refletisse a evolução da ciência e os entendimentos da Justiça do Trabalho relativos ao nexo causal ocupacional. Podemos citar, como exemplo recente, o adoecimento por coronavírus por trabalhadores na área da saúde, que adoeceram, alguns morreram e outros ainda possuem sequelas da doença, sem que houvesse sequer a emissão de CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), à revelia do estabelecido pelo parágrafo 1º, art. 2º, da Lei n. 14.128/2021, que presume a existência de relação entre o adoecimento por Covid-19 e o trabalho realizado por profissional da saúde.
A nova lista inclui a doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2 (cid U07.1) como doença relacionada ao trabalho, sem restringir aos profissionais da saúde, desde que o contato com o agente e/ou fator de risco biológico se dê em razão do trabalho.
A inclusão da Covid-19 como doença ocupacional na lista do Ministério da Saúde está em conformidade com o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que no último dia 7 identificou que havia nexo de causalidade entre o adoecimento por Covid-19 e, consequente, morte de uma auxiliar de lavanderia em um hospital.
A importância da atualização se dá exatamente pelo reconhecimento oficial de nexo de causalidade entre doenças e o trabalho, sendo que no caso exemplificado supra, quantos milhões de trabalhadores adoeceram, morreram e ainda possuem sequelas do coronavírus SARS-CoV-2 em decorrência de sua atividade laboral, sem que houvesse sequer a emissão de CAT e os benefícios previdenciários foram concedidos sem ter o trabalho considerado como causa.
A não identificação e classificação da relação de uma doença com o trabalho gera reflexos diretos não só na falta de reparação de trabalhadores e familiares, como no caso de óbito. Mas também evidencia o grande problema das subnotificações dos adoecimentos (estima-se que as notificações de adoecimentos em decorrência do trabalho representam um terço do número real), que refletem no não fidedigno mapa epidemiológico que orienta as políticas públicas de saúde do trabalhador.
Foram adicionadas 165 doenças à Lista de Doenças Relacionada ao Trabalho, merecendo destaques os transtornos mentais e comportamentais decorrentes de do uso canabinóides, cocaína, fumo, álcool, sedativos e hipnóticos, ansiedade, reações ao “estresse”, síndrome do esgotamento (Burnout), lesões provocadas por suícidio e etc.
Os adoecimentos mentais em decorrência do trabalho são habitualmente subnotificados, sendo um problema de saúde pública, mas também um problema social, visto que muitos trabalhadores são demitidos, após o adoecimento, e não conseguem voltar ao mercado de trabalho, ou, se voltam, não possuem a mesma capacidade de trabalho.
Outra grande inclusão na atualização da lista de doenças relacionadas ao trabalho é tratar dos agentes e riscos psicossociais do trabalho, com destaque para os relacionados à organização do trabalho (incluindo os modelos de contratação como terceirização, trabalho intermitente, MEI, pejotização e uberização, que muitas vezes precariza a saúde do trabalhador), relações sociais do trabalho, condições do meio ambiente do trabalho, interação pessoa-tarefa, jornada de trabalho, violência e assédio moral/sexual, discriminação, risco de morte ou de trauma no trabalho.
São inúmeras e relevantes as inovações trazidas pela Portaria GM/MS n. 1.999/2023, colocando uma luz sobre a importância de uma adequada classificação das doenças ocupacionais não só com objetivo de reparar os danos decorrentes do adoecimento ocupacional, mas principalmente sobre os agentes e fatores de riscos, que devem receber redobrada atenção dos profissionais que elaboram os laudos ambientais do trabalho, identificando adequadamente os agentes e riscos, propondo medidas de prevenção da saúde do trabalhador e zelando por um meio ambiente de trabalho seguro.
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