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É jornalista, editor-chefe da TV Gazeta, g1es e globoesporte.com

É hora de o Brasil encarar a mentira

Contar mentira nunca encontrou amparo legal, nem moral. Espalhar mentira e ganhar dinheiro com isso, menos ainda. É chegada a hora de deputados e senadores criarem leis para punir com rigor quem produz e quem dissemina fake news

  • Bruno Dalvi É jornalista, editor-chefe da TV Gazeta, g1es e globoesporte.com
Publicado em 17/05/2024 às 10h00

A semana chega ao fim com um importante movimento em defesa da democracia e contra a propagação das fake news. A Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), que representa 17 mil emissoras da América do Norte, América Central e América do Sul, sugeriu novas regras para proteger a produção de notícia e a sociedade. A ideia é que o texto sirva de base para criar leis que regulamentem o setor e punam quem propaga mentiras.

Em anos eleitorais como 2024, é gigante o desafio de garantir informação correta e preservar a verdade. Aumentam as disseminações de notícias falsas produzidas por movimentos organizados populistas ou por gente comum, que apropria-se do ilegítimo direito de postar “o que vem à mente”. Estão criadas as famosas e perigosas fake news, que geram debate, polemizam, chamam a atenção e, por isso, são potencializadas pelo algoritmo.

Produzida por grupos ou pelo cidadão, a mentira se espalha. O caminho é sempre muito parecido. A mensagem é composta, na maioria das vezes, por fragmentos de fatos reais, tem um texto categórico, convincente e que desperta no receptor o estímulo de distribuir como forma de alertar, prevenir, proteger ou chamar a atenção.

Fake news tumultuam a rotina social, descredibilizam as instituições democráticas, tiram o foco de problemas graves, geram likes e seguidores, e rendem muito dinheiro. Quanto maior o número de compartilhamentos e visualizações, maior é a receita que entra nas plataformas via anúncio ou impulsionamento. O ambiente digital é terra fértil à perversão e ao crime.

Rádios e TVs, por exemplo, têm as atividades regulamentadas por lei e podem ser punidas judicialmente pelo que produzem e publicam, bem diferente das grandes empresas de tecnologia que administram as plataformas e redes sociais. As big techs não têm as atividades regulamentadas, podem disseminar qualquer conteúdo sem revelar quem produziu e divulgar informações falsas sem o risco de serem responsabilizadas.

O documento feito pela Associação Internacional de Radiodifusão propõe responsabilizar a distribuição dos conteúdos, criar regras transparentes de publicidade e de concorrência e garantir a remuneração do conteúdo jornalístico que é monetizado pelas plataformas sem nenhuma remuneração ao produtor. É uma nova chance para que parlamentares brasileiros retonem esse debate tão essencial a democracia.

A Associação alerta que as redes sociais se tornaram fóruns de debate para defensores da igualdade e da liberdade. Mas criaram bolhas de isolamento e fontes de desinformação que ameaçam a democracia e a estabilidade das nações.

Educação midiática; fake news
Fake news. Crédito: Freepik

“É fundamental que se tenha um mínimo de regulação. Não de conteúdo. Jamais admitiríamos regular conteúdo ou impedir qualquer conteúdo de ser publicado. Agora, quem publica e tem isso como atividade empresarial, tem que ser responsável pelo produto que entrega. Qualquer negócio no mundo é assim”, defendeu o presidente da AIR e vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet.

Combater a notícia falsa é dever de todos nós, cidadãos, mas especialmente do Congresso, que tem agora uma nova proposta para analisar e dar uma basta na proliferação de tanta mentira. A grande questão é que tenta-se, a todo custo, misturar a regulamentação das big techs com uma possível censura. Qualquer tentativa de relacionar os dois temas só pode partir daqueles sem compromisso com a verdade.

O pretexto de ferir a liberdade de manifestação é a principal justificativa para não regulamentar as redes sociais. Ora, TVs e rádios são reguladas. E são livres! Mas devem seguir a lei. A liberdade de expressão, a oposição política ou qualquer manifestação de indignação, não é sinônimo de permissão para mentir ou violar direitos alheios.

Em 2023, o ministro do STJ Humberto Martins trouxe lucidez ao debate quando escreveu que “os direitos à informação e à livre manifestação do pensamento, apesar de merecedores de relevante proteção constitucional, não possuem caráter absoluto, encontrando limites em outros direitos e garantias constitucionais não menos essenciais à concretização da dignidade da pessoa humana, tais como o direito à honra, à intimidade, à privacidade e à imagem”.

No português claro: contar mentira nunca encontrou amparo legal, nem moral. Espalhar mentira e ganhar dinheiro com isso, menos ainda. É chegada a hora de deputados e senadores criarem leis para punir com rigor quem produz e quem dissemina fake news.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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