Bolsas despencando em todo o mundo, dólar subindo na relação cambial de vários países, desabastecimento de peças, acessórios e componentes eletrônicos fabricados na China ameaçando linhas de montagem em várias nações e colocando em risco o emprego de milhares de trabalhadores... Tais efeitos colaterais do novo coronavírus na economia reacendem o conceito de acrônimo difundido há 30 anos para alertar sobre as incertezas e riscos do mundo pós-guerra fria: Planeta VICA, ou Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo, tema que abordei em recente artigo.
A verdade é que, em meio à prioritária estratégia de saúde pública internacional e no âmbito de cada nação para conter uma potencial pandemia e surtos regionais, é necessário desenvolver “vacinas” contra a instabilidade provocada por situações como a presente proliferação de uma doença contagiosa, que, felizmente, conforme se concluiu até o momento, apresenta baixo índice de letalidade.
Fica muito claro que o organismo econômico global está imunodeprimido, pois apresenta sintomas de abatimento e debilidade ante a sinalização de um risco como o do Covid-19, que sequer se concretizou -- e esperamos que seja controlado e sanado sem provocar mais danos às pessoas e à saúde pública.
Focando as reflexões sobre essa questão na realidade nacional, é oportuno analisar, no contexto do temor global relativo à nova doença, a perda de competitividade de nossa indústria nas últimas décadas, por conta dos altos impostos, insegurança jurídica, infraestrutura deficiente, burocracia e tantos outros entraves responsáveis pelo estratosférico “custo Brasil”, o qual foi calculado em um adicional de R$ 1,5 trilhão por ano, quando comparado com a média dos 36 países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). É o que revelou estudo recente feito pelo Boston Consulting Grupo, em uma ação envolvendo a Sepec/ME, MBC e 12 associações de classe.
O problema, que se reflete, dentre outras consequências, na queda das exportações de bens com maior valor adicionado, na perda de investimentos, na redução da participação do setor no PIB e no aumento da importação de numerosos produtos manufaturados, pode agravar-se ante fatores como a ameaça de uma pandemia. Se países de alta renda e elevada capacidade competitiva estão apreensivos, o que dizer daqueles que, como o nosso, ainda estão em busca do desenvolvimento e vêm enfrentando crises e prolongada retração do nível de atividade?
Não está ao nosso alcance impedir o surgimento de novos vírus, evitar intempéries ou fatos insólitos como um conflito bélico envolvendo outras nações, fatores que, como se percebe neste momento, acabam provocando desequilíbrios no comércio e nas cadeias internacionais de valor.
Porém, podemos e devemos buscar soluções para “imunizar” ou pelo menos reduzir substancialmente a suscetibilidade de nossa economia frente a riscos circunstanciais do Planeta VICA. Daí a importância das reformas estruturais já realizadas (trabalhista e previdenciária, por exemplo) e das que precisam efetivar-se, em especial a tributária.
Assim, é muito importante neste momento a sintonia entre os Três Poderes, de modo que prevaleçam os interesses de toda a nação. Afinal, é premente fortalecer a indústria e todos os setores de atividade, recuperando nossa capacidade de disputar mercados em todo o mundo, por meio do aumento de nossa produtividade e competitividade sistêmica, retomar altos níveis de investimentos e criar empregos em larga escala, mantendo-nos fortes na bonança e nas tempestades.
Não construiremos uma nação rica, mais justa e menos desigual se seguirmos com baixa competitividade e demasiadamente sensíveis a fatores inusitados ou extraordinários. Se vivemos no Planeta Vica, precisamos estar sempre preparados para suas intermitentes surpresas, tendo um projeto de nação bem fundamentado e executado com precisão.
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O autor é o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit)
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