A maioria deve conhecer o clássico jargão parental que diz “me dê o respeito!”, que está sempre agregado a uma grande exclamação. Mas, afinal, o que significa a palavra “respeito”, principalmente quando estamos diante da educação que os pais dão aos filhos? Por certo, entre as muitas palavras polissêmicas existentes, o termo “respeito” está entre elas. Apenas para se ter uma ideia, muitos são os sentidos encontramos no próprio dicionário.
Por aqui, é possível se ater à sua noção referente ao substantivo masculino que consiste no “sentimento que impede uma pessoa de tratar alguém mal, de ser malcriada ou de agir com falta de consideração na maneira como se comporta com os outros; estima, afeição, consideração, reverência”, que, por vezes se coliga com a perspectiva relacionada à “obediência diante de algo ou alguém; acatamento, submissão: respeito às leis, à religião, a Deus” e à “apreensão ou sensação de medo”. Conectado, mas com nuances distintivas, respeito também significa o “sentimento que faz com que alguém não diga ofensas, insultos; apreço” e que “leva alguém a tratar as outras pessoas com grande atenção e profunda deferência”.
Bem vistas as coisas, o “respeito” está umbilicalmente correlacionado com as mais variadas formas de educação dos filhos ao longo das gerações. A partir de intensas pesquisas que correlacionam o modo de educação conferido pelas pessoas inseridas na geração dos babyboomers às geração posteriores, isto é, X ou Y/Millennials, que correspondem a parcela dos atuais adultos, pode-se concluir que houve uma mudança na forma pela qual os pais educavam seus filhos antes e agora, com base na mesma ótica do “respeito”.
Ao se analisar a temática, tem-se que a educação dada aos babyboomers - filhos das pessoas inseridas na denominada geração silenciosa/veteranos (nascidos até 1946) - foi em muito pautada no conservadorismo, na hierarquia, na obediência às regras e na verticalização entre os papéis sociais da família (inclusive entre pais e mães).
Nessa época, como a criança e o adolescente não eram vistos como efetivos sujeitos de direito (inclusive pela lei), era comum a ocorrência de imposições de respeito na mesma ótica hierarquizada familiar existente, isto é, de cima para baixo. Os filhos precisavam respeitar os seus pais, sob pena de punições bastante agressivas, como as palmatórias ou o popular castigo de ajoelhar no milho.
OS BABYBOOMERS
Diante de tamanha severidade, os babyboomers (nascidos entre 1946 a 1964) mudaram a sua forma de educar os filhos. Não só de educar, mas também de se relacionar consigo e com o mundo, já que estes foram os personagens centrais das principais mudanças sociais ocorridas na segunda metade do século passado e que, sem dúvida, impactaram fortemente a forma pela qual a sociedade é hoje (cita-se, por exemplo, que as principais leis sobre divórcio são datadas da segunda metade do século passado, bem como a configuração social e familiar que confere uma maior emancipação feminina).
De acordo com a literatura da filósofa e professora Tania Zagury, no livro “Filhos adultos mimados, pais negligenciados”, a tônica da educação conferida pelos babyboomers aos seus filhos foi a liberdade (de ser, de dizer, de se relacionar).
A importância da liberdade para esse segmento geracional também foi percebida pela antropóloga Mirian Goldenberg (no livro “A invenção de uma bela velhice”), no desenvolvimento de estudo que constatou que houve uma remodelação da própria perspectiva do envelhecimento pelos babyboomers, correlacionando com uma maior felicidade e, principalmente, liberdade. A liberdade, então, é um valor que pode ser associado aos babyboomers em diversas searas.
Não se deve esquecer, contudo, que a referida liberdade também se correlaciona com a noção de respeito parental. Contudo, diante da perspectiva existente à época, à qual se tentava romper, a liberdade não refletia necessariamente uma mudança na ótica do respeito. Isso significa que, embora os pais conferissem maior liberdade às decisões dos filhos, o relacionamento ainda era pautado na hierarquia, isto é, pela ótica de que, naquela relação, os filhos é que deveriam respeitar os pais.
Após os babyboomers, a literatura aponta pela existência da geração X (nascidos entre 1965 e 1980) e a geração Y, popularmente alcunhados de millennials (nascidos de 1981 a 1996). São parcela das pessoas atualmente adultas (não ainda catalogadas como idosas), mas com características geracionais bastante distintas, já que a primeira segue mais a linha da geração passada (dos babyboomers), enquanto a segunda rompeu em muito com as nuances das gerações anteriores, até mesmo em razão da vivência imersa na tecnologia desde tenra idade e, consequentemente, da absorção de noções e valores que passaram a ser “quase globais” (ao menos no ocidente) a partir de então.
OS MILLENIALS
E invadindo os valores geracionais dos millennials, literaturas mais contemporâneas a respeito de educação dos filhos traz uma mudança no que se tinha por “respeito”. É o caso de Philippa Perry (no livo “O livro que você gostaria que seus pais tivessem lido e seus filhos ficarão gratos por você ler”) que em muitas passagens sustenta que o respeito, para muito além de se relacionar à forma de deferência que os filhos dão aos pais, está muito mais ligada à forma pela qual os pais educam seus filhos, isto é, respeitosamente.
Em específico, uma linha de educação infantil adquire relevância no caso, que é a denominada “disciplina positiva”, pautada na educação respeitosa, que “significa, de fato, respeitar a criança e tratá-la com a mesma importância e consideração que eu gostaria de ser tratado”, e, diante disso, a relação paterno-filial é pautada em conexão, cooperação e comunicação.
Pode-se concluir, portanto, que dos babyboomers aos millenials, muitas características mudaram. E, dentro delas, também a forma pela qual os pais enxergam a educação dos filhos. O respeito, antes muito pautado na própria hierarquização existente na família daquela época, altera se para um respeito muito mais democratizado, também em consonância com a família da atualidade, onde há uma maior igualdade e preservação de direitos de todos os seus membros.
Dessa maneira, cogita-se, assim, que as gerações mais antigas pautavam a educação dos filhos com base em um respeito hierarquizado, ou verticalizado, enquanto as gerações mais recentes se relacionam com os filhos a partir de um respeito democratizado, ou horizontalizado.
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Alerta-se, por fim, que tal percepção não agrega nenhum qualificativo intrinsecamente positivo ou negativo, já que estamos diante de experiências familiares profundas e que levam consigo uma série de subjetividades inatas e meandros bem particulares. Ambas as formas de respeito seguiram as premissas ideológicas de suas respectivas eras e apresentavam adequação a partir daquele contexto social. Logo, a forma de manifestação do cuidado pode ter mudado, mas isso não significa que alguma seja superior a outra. Assim, percepções geracionais devem ser objeto de constante estudo e análise, mas, em momento algum, de embates.
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