Projetada por Lúcio Costa, Brasília é única cidade moderna tombada como patrimônio mundial da Unesco. Ele dotou a Praça dos Três Poderes de um amplo espaço aberto para que pudesse conter manifestações populares diante dos três edifícios monumentais que representam os três poderes da República.
Contudo, é seguro imaginar que Lúcio jamais imaginaria que sua praça se tornaria palco de um dos mais tristes episódios de nossa democracia.
Vestidos nas cores de nossa bandeira, milhares de vândalos atacaram os prédios projetados por Oscar Niemeyer: o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. Suas fachadas envidraçadas, projetadas para fazer pública a democracia, foram estilhaçadas, e suas instituições vilipendiadas.
A destruição do patrimônio segue sendo contabilizada e seus números não param de crescer. A escultura “O Flautista” de Bruno Giorgi foi destruída; outra escultura, “Galhos e Sombra” de Frans Krajcberg também foi severamente danificada; a tela “Mulatas”, do artista plástico Di Cavalcanti, foi rasgada; o relógio de Balthazar Martinot, peça barroca do século XVII, foi destruído; vasos da delegação chinesa foram destruídos, a peça “The Pearl” presente da Assembleia Nacional do Sudão foi furtada; nem mesmo a escultura Maria, Maria de Sônia Ebling foi poupada das pauladas. O relatório preliminar da Superintendência do Iphan no Distrito Federal tem mais de 50 páginas e estima mais de 140 itens danificados, furtados ou destruídos.
Contudo, o ataque não representa apenas um atentado contra o patrimônio, mas também as próprias instituições que o Niemeyer propositalmente privou de muros. Assim como a democracia não pode se acastelar contra a população, cabe ao povo sempre defendê-la. Afinal, para além dela, resta-nos apenas a tirania.
Nesse sentido, é mister a recuperação e restauração desses prédios e obras de arte, pois são parte indissociável da história democrática brasileira. Mais do que bens materiais, nosso patrimônio representa o triunfo de uma democracia que venceu guerras e ditaduras para que hoje gozemos de direitos como a livre expressão.
Nesse sentido, o urbanismo de Lúcio Costa e a arquitetura de Oscar Niemeyer configuram em Brasília mais que uma cidade, nossa capital é a expressão máxima do conceito democrático: do povo, pelo povo para o povo. E por isso mesmo deve ser preservada a todo custo.
Os responsáveis pelo vandalismo devem ser punidos com todo o rigor da lei e a recuperação prédios e do patrimônio deve ser rápida para que não paire dúvida quanto ao vigor democrático de nosso país. Que esse triste episódio seja mantido na memória coletiva como uma ameaça que superamos enquanto nação, reestabelecendo a esperança no futuro do Brasil que Brasília representa.
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