Qual o cenário atual? Temos um mundo que exige rápidos processos de capturar as informações. O ingresso numa universidade vira questão. Se antes terminar o ensino médio era quase sinônimo de escolher um curso no ensino superior, hoje temos jovens e adultos que poderiam questionar essa necessidade. O tempo gasto em um curso superior se tornou uma argumentação válida para justificar o não ingresso.
Então por que cursar o ensino superior, qual o seu sentido hoje?
Bom, se considerarmos as argumentações de tempo, fácil acesso ao conhecimento pelo avanço da tecnologia, melhores oportunidades de empregos e salários, vamos facilmente perder em nossas argumentações, temos de fato um crescimento significativo de “profissões” que não exigem um diploma universitário de forma rápida e rentável. Podemos então argumentar essa resposta indo por outro caminho, desnaturalizando algumas ideias prévias sobre a eficácia do ensino superior, trazendo luz sobre a importância que ultrapassa uma lógica óbvia. Vamos lá!
Primeiro, os centros universitários e faculdades são palco de promoção social desde os tempos medievais. Neles, além do grupo social, os universitários, composto de professores e alunos, temos um ambiente regulatório feito de pluralismo e estímulos a autoinovação. A sala de aula sozinha não faz compreender a faculdade. As faculdades resultam tanto do ensino formalizado e regrado quanto das relações pessoais, socioemocionais, culturais e livres que cercam e dão verdadeiro significado ao ensino. A universidade não é apenas tijolos e cimento, um ambiente climatizado com divisórias. Trata-se da imaterialidade da escola.
A cultura, as igualdades e desigualdades, as ambições, os medos, as ideologias, tudo circula ali por dentro como comunicação e interesse múltiplo. Como vírus que se espalha rapidamente, um vírus bom que leva quem foi contaminado a uma experiência de autoconhecimento em busca de um objetivo salvador, o conhecimento alavancado pela manivela do questionamento. Assim, temos algumas considerações acerca de nossa questão:
1. O ensino superior não é para um único propósito, o ensino superior é para descobrir propósito, isso vai muito além da escolha de uma profissão;
2. O ensino superior é um laboratório de autoconhecimento, de inovação e criação;
3. O conhecimento é um elemento de fácil acesso, claro, certamente. No entanto, existe uma esfera que ultrapassa o conhecimento que é: saber pensar! O ensino superior é um ambiente fértil, preparado para desenvolvimento dessa habilidade humana, uma habilidade que não se adquire instantaneamente.
De modo geral, sem ensino superior sucumbimos ao distanciamento do estímulo, perdemos a nascente do “querer saber mais” e fragilizamos os laços afetivos que o ambiente acadêmico proporciona para vivência da pluralidade da experiência social de se relacionar com os pares e aprendermos com a diferença, ser diferente e aceitar aquele que é diferente de nós.
O papel do ensino superior também é desenvolver habilidades sociais e emocionais para conhecer a si e ao outro, resultando na equivalência básica da sobrevivência humana. Ultrapassamos os limites do pensamento para argumentar a importância do ensino superior como fonte não só de objetivos pessoais, atingimos então uma camada que se ramifica para o papel multifatorial, questionando de forma mais profunda as inferências que envolvem determinada questão.
Finalizo com a abertura de uma ensaio que Geoffrey Boulton e Colin Lucas escreveram exatamente sobre para o que servem as universidades:
“É o complexo e interagente todo da universidade que é a fonte dos distintos benefícios econômicos, sociais, culturais e utilitários apreciados pela sociedade. Ela precisa ser entendida, valorizada e administrada como um todo. Essas percepções são um desafio direto não apenas para governos, mas também para gestores universitários, que têm sido ou assombrados ou seduzidos pela lógica inadequada que está levando a demandas que universidades não podem satisfazer, enquanto obscurecem suas mais importantes contribuições”.
O papel do ensino superior não é entregar apenas um objetivo, um diploma, uma carreira, seu papel é também estimular o aluno a criar, pensar os objetivos sob uma ótica implicatória que vai além de atingir objetivos pessoais. Argumentar o formato do ensino superior e suas atuais demandas forja um discurso contraditório de estatísticas irrelevantes para o cenário brasileiro.
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