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É capixaba, mãe, engenheira, gestora e participante do Arena Mulher, um grupo que busca se fortalecer através do compartilhamento de experiências ante os desafios de ser mulher neste mundo. As participantes do Arena são signatárias deste manifesto. ([email protected])

Estupro em Vitória: quantas vezes será preciso repetir a palavra inaceitável?

Por todas nós, nossas filhas e filhos, por nossas famílias, não toleramos nem uma violação a mais. Nem uma mulher a menos

  • Liliane Emília Souza É capixaba, mãe, engenheira, gestora e participante do Arena Mulher, um grupo que busca se fortalecer através do compartilhamento de experiências ante os desafios de ser mulher neste mundo. As participantes do Arena são signatárias deste manifesto. ([email protected])
Publicado em 27/07/2023 às 11h56

Na semana em que celebramos o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, em 25 de julho, como marco global de luta e resistência, um crime de máxima crueldade contra uma mulher cometido no coração de nossa capital Vitória se soma a uma longa lista de atrocidades semelhantes.

Às 20h30 da segunda-feira (24),  uma jovem de 22 anos, após cumprida sua jornada de trabalho, aguardava no ponto de ônibus de uma movimentada avenida da Capital quando foi obrigada por três homens a entrar em um veículo, onde foi, por horas, vítima de toda sorte de violência e abusos. Ao fim, num ato de profundo, cruel e derradeiro simbolismo foi deixada desacordada em um valão da cidade vizinha, Vila Velha.

A notícia propagada pelos jornais, redes sociais e grupos de WhatsApp deixa, dentre tantas outras perguntas inevitáveis, as seguintes:

Como seguir tolerando? Como seguir vivendo e convivendo com a dor das que restaram vivas para contar? Com a dor das famílias que enterraram os corpos das que não sobreviveram? E com o medo de todas as outras nós, que podemos ser as próximas vítimas?

Esse manifesto não se resigna a repudiar tamanha barbaridade contra uma mulher, filha, mãe e esposa. Ele convoca à ação para todas as urgências que esse crime evidencia.

A primeira delas, que essa mulher e sua família sejam acolhidas com toda a assistência e máxima prioridade, não só para estancar as feridas iminentes, também as que ainda virão, fruto do trauma e suas múltiplas sequelas.

A segunda urgência, a de reconhecer a gravidade da realidade que gera essa longa e abominável cadeia de mortes, violências e violações, e agir à altura para evitar uma próxima vítima. É intolerável pensar que haverá outra vítima, ou outras, ou milhares delas (de nós!) em nossas cidades, em nosso país. As estatísticas apontam para números de uma guerra, não num sentido figurado, mas absolutamente real. E nessa guerra, o Espírito Santo tem se destacado no vergonhoso ranking de violência de gênero.

Quantas vezes será preciso repetir a palavra inaceitável? Tantas quantas for necessário, gritar se preciso. Ir às ruas. Constranger. Nada é mais constrangedor que conviver pacificamente com essa realidade, traduzida de forma contundente pela jornalista e escritora gaúcha Eliane Brum:

Vítima de estupro
Vítima de estupro . Crédito: Oliveira Alves

“Demorei a entender que a violência de ter um corpo sempre em risco não é um dado a mais na trajetória de uma vida. Não é um trauma ou uma história triste. Ou vários traumas ou várias histórias tristes. A violência é tão constituinte do que é ser uma mulher nisso que chamamos mundo como ossos, órgãos, sangue. A violência é estrutural no ser e estar no mundo de uma mulher. Compreendemos o que somos pela ameaça aos nossos corpos. Ser mulher é ser um corpo que não se sente seguro em lugar nenhum.”

Diante dos fatos e do pavor em que eles nos mergulham, é urgente:

A manifestação contundente das máximas autoridades do estado sobre a gravidade e tratamento desse crime.

O mais absoluto rigor e agilidade na apuração, julgamento e punição dos responsáveis e envolvidos.

Uma ampla mobilização e articulação do Estado com a participação da sociedade civil visando resultados efetivos de prevenção de violências contra a mulher.

Uma campanha intensiva nas escolas, redes pública e privada de saúde, entidades públicas, templos religiosos, imprensa, comércio, nas ruas e onde mais preciso for. É preciso chamar a atenção de cada pessoa, de cada cidadã e cidadão, de cada habitante para a urgência que vivemos todas e todos.

Por fim, retomamos o derradeiro simbolismo desse crime porque ele comunica com máxima clareza a percepção de mundo que é causa-raiz deste absurdo: de que nós mulheres e nossos corpos valemos menos, para muitos valemos tanto quanto excrementos que correm a céu aberto. E que por isso não há limites para as mais perversas violações.

É crucial atuar estruturalmente, tanto nas causas quanto nas consequências. É preciso, sobretudo, prevenir enquanto se remedia. Prevenção e agilidade são atitudes centrais neste chamado à ação. Não há como prevenir sem agir com urgência. Não há como tolerar a possibilidade de uma próxima vítima.

Por todas nós, nossas filhas e filhos, por nossas famílias, não toleramos nem uma violação a mais. Nem uma mulher a menos.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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