Marco zero do bairro de Jardim da Penha, os galpões do IBC há tempos estão sob risco de desaparecimento pelos demolidores de plantão. Aparentemente não havia dissenso quanto a sua importância afetiva e simbólica para população capixaba. Identificado como “local-símbolo” de processos históricos e urbanísticos, que representam tanto a prosperidade econômica gerada pelo café para o Estado, como a gênese de fundação do bairro onde se insere, esse espaço pode ter seu potencial ampliado como um laboratório de novas sociabilidades. Desde que a população continue se mobilizando para tanto, buscando impedir sua venda em leilão ao investidor imobiliário.
De arquitetura modesta, porém inspiradora, é possível imaginar múltiplos usos coletivos para o lugar, independentemente daquele que for empreender a sua reconversão a novos usos, seja o setor público, seja o privado. Vamos imaginar a retirada dos muros e a integração das ruas internas do terreno dos galpões com as ruas do bairro. Teremos com isso permeabilidade e acesso a espaços que podem ser compartilhados apenas por pedestres e ciclistas quanto aos modais de deslocamento.
Mais distinções podem gerar novos modos de ocupar um sítio tão excepcional como esse. Sabemos que não são apenas galpões, são parte da identidade, memória e imagem coletiva do lugar, que podem ativar novos encontros públicos e vivências coletivas com o outro. A diversidade do outro ampara, acolhe, multiplica e pulsa a vida nas cidades!
Como arquiteta urbanista defensora do tombamento dos armazéns de modo parcial ou integral, integrante de entidades da sociedade civil organizada que solicitaram o tombamento provisório dos galpões à Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo (Secult), com objetivo de ampliar o debate sobre o destino de uso dos mesmos, convocamos a população ao debate e à imaginação sobre as potencialidades de se proteger e dinamizar a memória paisagística desses que são bens imóveis públicos pertencentes a toda a população. A palavra chave mobilizadora pode ser, entre outras, a economia criativa, solidária e sustentável.
Assim podemos imaginar um lugar intergeracional, com crianças, jovens, adultos e idosos, antirracista e democrático. Um polo gerador de emprego e renda, com comércio e serviços de rua para todos os bolsos, do restaurante ao boteco, do centro cultural às escolas de formação artística e cultural, das feiras livres às feiras de artesanatos, da academia de ginástica à moradia estudantil, do centro de inovação e tecnologia ao parque de recreação e lazer, citando uma pequena amostra do potencial desse laboratório urbano que poderemos experimentar localmente. Para isso é preciso resistir, pois sabemos que os interesses do mercado imobiliário, que tudo monetariza, pode recuar onde a resistência for maior.
A autora é arquiteta urbanista, professora doutora da Ufes e participante do BrCidades ES
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