Em março de 2016, no que seria o desfecho de um dos episódios mais importantes da política nacional, o ministro do STF Gilmar Mendes anulou a indicação do ex-presidente Lula para a Casa Civil. Na ocasião, investigado pela Operação Lava Jato, a nomeação tiraria o petista da jurisdição do então juiz Sergio Moro, dando-lhe foro privilegiado e uma consequente sobrevida política para disputar as eleições no ano seguinte.
O áudio de uma conversa entre a então presidente Dilma Rousseff e Lula, divulgado ilegalmente pelo juiz Moro e veiculado em horário nobre, foi utilizado como prova na decisão monocrática de Mendes para alegar desvio de finalidade naquele ato. Todos sabemos que era isso mesmo, mas embora muitas pessoas tenham protestado contra uma decisão política do Supremo, a maioria dos brasileiros comemorou o acontecimento como o apogeu de uma operação que parecia estar dando fim à impunidade da corrupção política no Brasil.
Ato contínuo, em 2017 Lula foi preso, impedido de disputar as eleições e o país entrou em transe. Jair Bolsonaro foi eleito, numa convulsão popular jamais vista, como o “mito” que salvaria o país da corrupção e da degeneração moral que nos assolava. Seus eleitores simplesmente ignoraram os 28 anos de sua vida pregressa como um parlamentar boca-rota, machista e improdutivo, envolvido em polêmicas no próprio parlamento, onde chegou a homenagear torturadores da época da ditadura militar, ou em programas sensacionalistas de televisão que lhe davam palanque para destilar seus preconceitos.
Suas promessas populistas de campanha tinham o mote do combate à corrupção e falavam a língua do povo. Não haveria "toma lá, dá cá", "mamata", "baderna", "politicagem" e outros tantos termos para designar o fisiologismo da política nacional.
Estamos em julho de 2021 e, em seus três anos e meio de mandato, Jair Bolsonaro já se distanciou tanto de suas promessas populistas que chegou ao momento em que indica, para a mesma Casa Civil, o nome do senador Ciro Nogueira (PP), um desafeto de 2017. Ciro responde a três inquéritos no STF no âmbito da mesma Lava Jato que prendeu Lula, mas que hoje é aliado do presidente no Centrão, junto a outros nomes da ruína política do país, como Eduardo Cunha, Roberto Jefferson, Fernando Collor, Waldemar da Costa Neto, Arthur Lira, Ricardo Salles, Ricardo Barros (o dos rolos com a vacina) e Michel Temer. E para comprar o apoio dessa turma, terá que abrir a mão com um indecoroso fundão eleitoral bilionário para 2022.
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Como já possui foro privilegiado, desta vez a indicação não será tratada como obstrução de Justiça, mas como um tapa na cara de quem ainda defende o "mito" do político honesto e salvador da pátria.
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