Os defensores da Batalha Espiritual, conceito muito comum entre as igrejas evangélicas brasileiras, especialmente neopentecostais, afirmam que há uma guerra entre as forças do Bem contra o Mal. Alicerçados em alguns textos bíblicos e um dualismo radical, essa visão de mundo religiosa defende também que as escolhas terrenas podem colocar as pessoas do lado de Deus ou do demônio.
Por influência especialmente dos EUA, essa perspectiva teológica alimenta o que James Hunter chamou, na década de 1990, de “guerra cultural”, que nada mais é do que a secularização da sua forma religiosa, pois afirma haver um risco de destruição maligna dos valores cristãos na cultura. Daí vem expressões do tipo “marxismo cultural”, “globalismo” e outras formas de teorias conspiracionistas.
Aplicada à política, a batalha espiritual, encarnada na guerra cultural, é um verdadeiro desastre, porque se instala o terrorismo ideológico, a sacralização ou demonização de personagens político-partidários e, como consequência, são deixadas de lado as questões importantes em uma disputa eleitoral.
Infelizmente, na reta final do pleito pela Presidência da República, essa estratégia tem se intensificado no nosso país. Se de um lado Lula é identificado com práticas satanistas, por outro, desesperam-se alguns cristãos por desconfiarem que o atual presidente tem relações com a maçonaria, o que para parte dos evangélicos e católicos seria fazer aliança com ritos ocultistas.
Como bem explicam Roberto Dutra e Karine Pessôa, no artigo “Guerras culturais e a relação entre religião e política no Brasil contemporâneo”, na esfera política essa narrativa é então direcionada aos que estão do lado oposto. Ou seja, o outro deixa de ser somente alguém com posicionamento diferente e assume o lugar de soldado do “reino das trevas”.
Tal interpretação instalada no imaginário político dos brasileiros acaba por acirrar a intolerância e fortalecer a violência. Por isso, o uso da religião nesse contexto belicoso pode ajudar na instauração do terror, enfraquecendo o caráter político da discussão e abrindo as portas para a irracionalidade do medo como instrumento de convencimento.
Talvez seja óbvio, mas cabe aqui repetir: Lula e Bolsonaro são sujeitos políticos e não guerreiros de Deus contra as forças do mal.
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