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Ele é advogado, professor da FDV, pós-doutorado em Direito (Universidad de Sevilla). Ela é advogada, professora e doutoranda em Direito pela FDV

Não existe democracia sem direitos humanos

Não há que se retroceder quanto a conquistas civilizatórias mínimas. Ao contrário, nesse campo, o caminho – democrático - só pode ser para a frente. Mais democracia com direitos humanos. Sempre

  • Nelson Camatta Moreira e Lara Lorenzoni Ele é advogado, professor da FDV, pós-doutorado em Direito (Universidad de Sevilla). Ela é advogada, professora e doutoranda em Direito pela FDV
Publicado em 02/02/2023 às 15h21

Em nome da “liberdade”, no Estado Democrático de Direito, é permitido promover-se uma “cruzada” contra as próprias instituições do Estado encarregadas de proteger a democracia e os direitos fundamentais? Em outras palavras, seria a democracia uma parcimoniosa tolerância com absolutamente tudo e todos?

Antes de uma resposta direta, é preciso lembrar que a democracia é, na política, uma forma de controle institucional e popular de poder, o que, logicamente, dá espaço a críticas e à liberdade de expressão e manifestação. Isso não significa, no entanto, tolerar todo e qualquer empreendimento contrário ao poder democraticamente instituído. Toda organização social e todo regime político têm o seu ponto de inflexão, sua linha-limite que não pode ser ultrapassada.

É impossível qualquer proposta de organização de um convívio social na qual um governo deva suportar todas as formas de manifestação dos membros da sociedade. E mais: nenhum agrupamento humano subsiste sem consensos mínimos. Se a política é a vida na pluralidade, a memória coletiva é ingrediente fundamental à construção de um ambiente comum estável.

A história revela uma luta perene da democracia contra autoritarismos de diversos matizes. Dado essencial da democracia, portanto, é a defesa das liberdades individuais.

Nesse sentido, se olharmos especialmente para as revoluções liberais do século XVIII, diversos textos oficiais proclamaram que todos os homens devem ser tratados igualmente perante a lei. É a chamada igualdade mínima, formal. Logo, a partir da modernidade, não deveriam ser mais apenas alguns homens merecedores de uma vida digna, como era divinamente preestabelecido na Idade Média, e sim, todos os homens (detalhe aqui para a linguagem da época que chamava “todos os seres humanos” de “homens”).

Esse é o processo pelo qual se desencadeou a invenção dos direitos humanos em constituições e tratados internacionais. Com ele, evoluiu-se humanística e intelectualmente a ponto de se reconhecer que não é admissível um direito divino desde logo excludente e determinista. Tratou-se de um primeiro salto rumo a uma conformação social mais igualitária e fraterna. Essa é a base daquilo o que hoje chamamos de democracia.

Nessa esteira, o Estado Democrático de Direito é erigido como paradigma ocidental após virem à tona as atrocidades promovidas no holocausto, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 é considerada filha direta desses acontecimentos (e da necessidade de jamais repeti-los).

Sistema Internacional dos Direitos Humanos opera em favor dos mais fracos
Sistema Internacional dos Direitos Humanos opera em favor dos mais fracos. Crédito: Ilona Shorokhova/ Freepik

Por isso, entenda-se: não existe democracia sem direitos humanos. Esse é um dado histórico sobre o qual não cabem revisionismos.

Não se pode atentar contra as instituições que viabilizam a democracia (e, por conseguinte, contra os direitos humanos). Quem o faz necessita ser devidamente responsabilizado, na forma da lei. Para não repetir erros do passado, é preciso ter memória. Essa é uma lição histórica. Esse é um trabalho incansável de todas e todos.

Não há que se retroceder quanto a conquistas civilizatórias mínimas. Ao contrário, nesse campo, o caminho – democrático - só pode ser para a frente. Mais democracia com direitos humanos. Sempre.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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