Nos primeiros meses de 2020, os principais telejornais brasileiros exibiram imagens estarrecedoras vindas da China e da Itália sobre as consequências da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Como vivemos a chamada “globalização” – marcada, sobretudo, pela grande circulação de pessoas e mercadorias em âmbito planetário – era praticamente inevitável que o temível vírus também chegasse ao nosso país. Portanto, tivemos tempo suficiente para melhor nos preparamos para enfrentar essa desconhecida moléstia. Infelizmente, não foi o que aconteceu.
No Brasil, o coronavírus encontrou o que podemos qualificar de “tempestade perfeita” – expressão que se refere à uma situação na qual um evento, em geral não favorável, é drasticamente agravado pela ocorrência de uma rara combinação de circunstâncias, transformando-se em um desastre de imensa proporção. Nossa “tempestade perfeita” tem como protagonista a autoridade máxima do país, o presidente da República.
Desde a chegada da pandemia de Covid-19 por aqui, Jair Bolsonaro tem atuado em favor do vírus: nega a gravidade da doença, critica medidas de isolamento social, faz propaganda de um tratamento precoce sem nenhum tipo de comprovação científica, estimula aglomerações e sabota a vacinação. Já as atuações de governadores e prefeitos, salvo honrosas exceções, ficaram mais no campo discursivo do que propriamente surtiram efeitos positivos.
Quando tiveram que optar entre os poderosos interesses econômicos e as medidas sanitárias para evitar a propagação do coronavírus, não titubearam em aderir à primeira posição. Abertura do comércio no auge das contaminações, volta às aulas presenciais e lockdowns inócuos (aos finais de semana ou às madrugadas) são exemplos de que o capital ainda fala mais alto do que a saúde.
Além da incompetência do poder público, há os chamados “negacionistas”, que contribuem substancialmente para a proliferação da Covid-19, seja compartilhando fake news nas redes sociais, seja se aglomerando em festas clandestinas país afora. Não por acaso, nas semanas posteriores às grandes comemorações, como réveillon ou carnaval, o número de contaminados cresceu vertiginosamente.
Para completar a “tempestade perfeita”, não há como deixar de mencionar o colapso do sistema público de saúde, consequência da nefasta agenda neoliberal, que visa, principalmente, à privatização do SUS, transformando o direito à vida em mais uma mercadoria, acessível somente a quem possui recursos suficientes para bancar.
E assim, enquanto países com situações econômicas similares ao nosso têm apresentado resultados positivos no enfrentamento à Covid-19, permanecemos quebrando recordes de médias semanais de contaminações e óbitos. Tradicionalmente, o Brasil é conhecido pela receptividade aos forasteiros. Se tivesse a oportunidade de optar por um país para “crescer e se multiplicar”, o novo coronavírus não teria dúvidas, escolheria o “acolhedor” Brasil. Seria cômico, se não fosse trágico.
O autor é doutorando em Geografia pela Unicamp, mestre em Geografia pela UFSJ, Especialista em Ciências Humanas (Brasil, Estado e Sociedade) pela UFJF e articulista do Observatório da Imprensa
* Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta
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