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É diretora estadual da Associação Brasileira dos Advogados (ABA)

Nós, mulheres, não vamos “aquietar o facho”, promotor!

Por mais chocante que seja, esse não é o primeiro caso de desrespeito a uma mulher em um espaço de justiça. Um episódio que ilustra como a representatividade feminina ainda precisa ser debatida aconteceu em outubro do ano passado, em Belém (PA)

  • Érica Neves É diretora estadual da Associação Brasileira dos Advogados (ABA)
Publicado em 06/06/2024 às 17h18

Aconteceu de novo, e desta vez, por mais paradoxal (e chocante) que seja, em um espaço que se propõe à justiça. Durante audiência na Vara da Família de Vitória, o promotor de Justiça Luiz Antônio de Souza Silva disse a uma mulher que solicitava pensão alimentícia ao ex-marido agressor que ela deveria “aquietar o facho” e voltar para o ex-companheiro. É mais um caso de total desrespeito às mulheres.

Sim, “às mulheres”, porque a frase do promotor reproduz o nosso dia a dia. O “aquietar o facho”, proferido nesse contexto e por pessoa que se esperava preparo para a função pública e intelectualidade mínima, é a frase mais chula e desumana para traduzir a expectativa de submissão de uma mulher ao seu abusador ou agressor ou às mínimas e máximas injustiças e constrangimentos.

A cena é de uma mulher, vítima, sendo agredida e humilhada novamente na presença do agressor, com o aval do Judiciário, que deveria abraçá-la e protegê-la. Humilhação e abuso ainda piores.

Por mais chocante que seja, esse não é o primeiro caso de desrespeito a uma mulher em um espaço de justiça. Um episódio que ilustra como a representatividade feminina ainda precisa ser debatida aconteceu em outubro do ano passado, em Belém (PA). O desembargador Georgenor de Sousa Franco Filho negou um pedido de adiamento de uma advogada que estava no estágio final de gravidez e ainda usou a frase “gravidez não é doença” para justificar sua decisão.

Já vivi algumas situações constrangedoras e machistas na política nesses últimos anos, mas não "aquietei o facho" e nem aceitei que os abusos continuassem. Por vezes, fui incompreendida e nem sequer ouvida.

Até quem pensou em pedir pra eu “aquietar o facho” não se sente mais confortável em estar ao meu redor. Não aquieto, não.

O que aconteceu na sala de audiência vai de encontro ao avanço histórico que aconteceu neste mês, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que o histórico da vida sexual ou o estilo de vida de uma mulher não podem ser considerados nos julgamentos contra as mulheres.

A evolução dos entendimentos a fim de sanar impregnações arcaicas do machismo e a punição do promotor mostra que a sociedade e as instituições vêm mudando, mas lembrem-se, mudando pelos nossos próprios esforços na busca por espaços.

Quantas mulheres ainda vão precisar passar por humilhações como essas em Vitória ou em qualquer lugar?!

Aprendam de uma vez por todas: não vamos "aquietar o facho", não!

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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