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O impasse entre proteção ambiental e insegurança jurídica

Como são restrições ao uso e ocupação do solo de áreas privadas, as áreas de preservação permanente podem entrar em rota de colisão com o direito à propriedade, especialmente nas áreas urbanas

  • Alan Mori É associado do Líderes do Amanhã
Publicado em 30/05/2023 às 15h44

As áreas de preservação permanente (APP) são zonas de uso restrito da propriedade, que possuem a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. As características e a localização dessas áreas são definidas pelo Código Florestal (Lei 12.651/2012) e podem estar localizadas em áreas urbanas ou rurais.

Como são restrições ao uso e ocupação do solo de áreas privadas, as APPs podem entrar em rota de colisão com o direito à propriedade, especialmente nas áreas urbanas. É muito comum localizarmos lotes que foram devidamente validados e aprovados pelos órgãos competentes no passado, e se tornaram completamente inutilizados, em razão de restrições que passaram a existir com os conceitos ambientais mais modernos.

No Espírito Santo existem diversos exemplos de controvérsias dessa natureza, um deles é o entorno da Lagoa de Interlagos, em Vila Velha. Nesse caso, há diversos loteamentos construídos entre um conjunto de lagoas, sendo esse o principal atrativo comercial dos imóveis. O caso específico, trata de empreendimento que foi devidamente aprovado pelo município de Vila Velha, através do decreto nº 78/77, já contemplando o loteamento das margens dos corpos hídricos.

Apesar disso, após a consolidação da situação por mais de trinta anos, entre os anos de 2020 e 2022, teve início uma ofensiva do Ministério Público Estadual e do município de Vila Velha visando a demolição dos imóveis construídos às margens das lagoas, e a proibição de novas construções. É importante destacar que não se tem conhecimento de um dano ambiental concreto causado pelo loteamento, que é abastecido com rede de tratamento de água e esgoto, além de coleta pública de resíduos sólidos.

Praia de Interlagos em Vila Velha
Praia de Interlagos em Vila Velha. Crédito: Vitor Jubini

A ofensiva do MP e do município se baseia na aplicação do mencionado conceito de área de preservação permanente, que, para atingir os objetivos destacados, define que nos entornos de lagoas e reservatórios de água naturais haverá uma restrição de uso e ocupação do solo nos trinta metros adjacentes ao corpo hídrico. Portanto, o município de Vila Velha, que havia autorizado o empreendimento em 1977, resolve, em 2020, determinar a demolição das construções edificados, sobre os lotes vendidos.

Essa contradição revela uma face obscura da legislação ambiental brasileira, que coloca proprietários urbanos e rurais em situação de ampla insegurança jurídica, em razão das recentes modificações visando a ampliação da preservação ambiental em nossos biomas.

De fato, precisamos ampliar as bases de proteção ambiental em nossa sociedade, visando garantir a qualidade de vida das próximas gerações, contudo, há necessidade de ponderarmos acerca das situações já consolidadas, em especial, aquelas que afetem diretamente o direito à propriedade privada.

É possível pensar em um instituto de transição para o zoneamento ambiental nas áreas urbanas, como foi feito com o conceito de área rural consolidada, que mitigou o impacto da nova legislação sobre áreas protegidas a empreendimento rurais.

Dessa forma, defende-se que a aplicação de novas alterações na legislação ambiental a situações fáticas já consolidadas, e que não provocam danos efetivos à fauna, flora ou condições climáticas, não seja automática, mas que exista um mecanismo claro de transição normativa, sob pena de continuarmos a transitar em uma insegurança jurídica ambiental que afasta a condição necessária para o desenvolvimento econômico do Brasil.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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