Em 1914, o arquiduque Francisco Fernando foi assassinado em Sarajevo, um fato que marca o início da Primeira Guerra Mundial, mas o que moveu o mundo para a beligerância foi o imperialismo e o expansionismo das nações europeias. Nos anos 1980 houve uma disputa por mercados entre as marcas de refrigerantes à base de cola e, na década de 1990, foi a vez das franquias de fast-food se enfrentarem. Mas o que isso tem a ver com a morte de uma estudante de direito no bairro Ibes e do jovem mecânico em Santa Mônica, ambos em Vila Velha?
Os eventos são diferentes e distantes, mas os interesses que os moveram são os mesmos: a disputa pelo domínio dos territórios e dos mercados, valendo-se da utilização dos meios disponíveis e de força, não se importando com os danos colaterais.
A disputa de território e a prevalência no domínio do tráfico não é um evento local, ela se insere no mercado global das disputas e interagem entre si, como vemos com os cartéis colombianos, os cartéis mexicanos e a expansão do PCC na “cadeia produtiva e logística de drogas” na América do Sul.
O que, ao fim e ao cabo, representa marcar posição no “narcobusiness”; que se compara ao mercado das “commodities”, pois o mercado de drogas movimenta bilhões de dólares, os quais financiam, inclusive, campanhas eleitorais de políticos.
A resposta para a violência desenfreada que acomete o Espírito Santo é fácil e simples – a guerra do tráfico de drogas. As razões, porém, são mais complexas e ocorreram ao longo dos anos, como a falta de investimentos nas polícias (em equipamentos, em armamentos, nos serviços de inteligência e perícia), a recomposição dos efetivos, e a valorização dos policiais e das suas carreiras. Tudo isso acarretou no sucateamento das agências de segurança e por conseguinte na diminuição dos efetivos policiais nas zonas de maior vulnerabilidade social, bem como políticas sociais e de segurança que não cumpriram seus objetivos.
Soma-se a isso uma legislação débil que facilita o entra e sai de bandidos do sistema de justiça criminal, os quais continuam se articulando e comandando as ações de dentro das carceragens.
Há que se dizer ainda que em nada ajuda a romantização de criminosos feita por setores da sociedade, como pastorais e a academia, buscando justificar o injustificável, principalmente dos traficantes que são tratados como benfeitores das comunidades com as suas “ajudas sociais” e com a promoção dos bailes do Mandela, que no imaginário gera renda para essas pessoas diante da ausência de ações do Estado; ou ainda fechar os olhos para a conduta dos consumidores de drogas que alimentam esse mercado e aumentam as disputas.
Com todo esse cenário e um mundo interconectado, criou-se um terreno fértil para que as facções criminosas como o PCC e o Comando Vermelho abrissem as suas filiais aqui, cooptando os criminosos locais e se instalando em nossas comunidades, trazendo consigo as seus ‘salves’ (normas e regras), o tribunal do crime (sem direito a ampla defesa e ao contraditório) e os modelos de ações para dominar a região.
Não é difícil encontrarmos em nossas comunidades pessoas andando livremente de tornozeleira eletrônica e armamento pesado fazendo a contenção e o tráfico de drogas para um público ávido a consumir o produto que se conta pelos pinos deixados caídos nas ruas.
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A receita para melhorarmos a situação da violência descontrolada vai muito além de discursos de ordem e arroubos embusteiros. Deverá passar necessariamente pelo endurecimento da legislação e ações multidisciplinares para o enfrentamento ao narcotráfico e ao microtráfico, mas precisaremos mudar o modelo mental que acha normal essa relação espúria entre traficante e usuário.
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