O Brasil é um dos países com uma das maiores taxas de juros reais do mundo. No momento ocupamos a 3ª posição. O juro real é formado, entre outros pontos, pela taxa de juros nominal do país subtraída da inflação prevista para os próximos 12 meses.
A trajetória dos juros reais na história recente do país teve apenas dois momentos de redução. No período entre 2008 e 2017, a taxa de juros média caiu para 5,2% ao ano, e entre 2018 e 2019, antes da pandemia, caiu para 2,3% a.a. E ainda caiu mais durante a pandemia, quando voltou a subir para chegar aos patamares atuais.
Mas a situação é muito pior. Dados do Banco Central mostram que a taxa de juros sobre novas concessões de crédito alcançou 27,7% a.a. Ou seja, a taxa de juros praticada no mercado é muito maior.
Há várias causas possíveis para os juros altos no Brasil. Alguns analistas apontam questões estruturais, como a permanência de algum nível de indexação e coexistência entre segmentos de alta e baixíssima produtividade operando no mesmo ambiente econômico. A conjuntura econômica local e internacional pode gerar pressões inflacionárias e causar aumento dos juros.
E há causas que derivam diretamente da administração do governo federal, tais como os excessos de gastos, a trajetória da dívida pública e a percepção do risco país. E essas últimas têm um papel ainda mais perverso, na medida em que o descontrole dos gastos públicos e a irresponsabilidade fiscal tornam mais difícil a vida das famílias, a saúde das empresas e a própria qualidade dos serviços ofertados pelos governos.
Para a maioria das famílias os juros altos tornam tudo mais difícil. Do dia a dia, até a realização de sonhos. O percentual de famílias endividadas e inadimplentes caiu um pouco em 2024, mas ainda é muito alto, respectivamente de 76,9% e 29,3% em outubro, segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio.
A Caixa Econômica Federal mudou as regras para o financiamento da casa própria. Reduziu os percentuais a serem financiados e limitou o valor dos imóveis. Entre os fatores que levaram as alterações se destaca o aumento dos saques da caderneta de poupança, que é a principal fonte de crédito para os imóveis.
As retiradas de recursos da poupança aumentaram devido à inflação e à alta de juros, que tornaram outros investimentos mais atrativos para os poupadores. Isso tornará mais difícil o sonho da casa própria para uma parcela significativa da população.
Para as empresas a situação não é melhor. Os juros altos inibem investimentos e tornam muito cara a busca de empréstimos para financiar o capital de giro. O que reduz o potencial de crescimento das empresas. Quando não comprometem a sustentabilidade da operação pelo impacto que tem sobre os custos, em especial sobre insumos adquiridos a prazo.
Relatório global da Allianz Trade, seguradora especializada em seguro e melhoria do processo de crédito e cobrança de empresas, prevê um aumento de 33% nos casos de insolvência neste ano, com 3,5 mil empresas em situação de recuperação judicial ou mesmo de falência.
O impacto sobre os governos é monumental. Tanto o tesouro nacional como estados e municípios pagam uma taxa mais cara que a Selic para financiar a dívida pública. Em agosto a (DBGG) Dívida Bruta do Governo Geral somou R$ 8,9 trilhões, chegando a 78,3% do PIB. Em 2023, as despesas com juros da dívida do governo federal foram de aproximadamente R$ 700 bilhões. Dá para imaginar? Mais do que todas as despesas do governo federal com saúde, educação e assistência social. Em junho último, o setor público como um todo gastou R$ 94,9 bilhões com serviços da dívida. Isso corresponde a seis vezes o gasto mensal com o Bolsa Família.
Na semana passada, o Copom elevou a taxa de juros para 11,25%. Uma combinação de fatores contribuiu para essa nova alta. O conturbado cenário externo, o aquecimento da economia e o aumento da inflação no Brasil. Mas a incerteza fiscal teve papel decisivo. A hesitação permanente do governo federal em admitir a necessidade de cortar gastos estressou ainda mais uma situação já difícil.
No limite, pressionado pela alta do dólar e pela ameaça de uma reversão da situação econômica, o governo resolveu se mexer. E voltou a anunciar um pacote de corte de gastos.
Há quase dois anos escutamos bravatas sobre as elevadas taxas de juros. Enquanto isso, piorou o déficit público e a dívida pública entrou num perigoso processo de alta. E quem paga a conta dessa mistificação somos todos nós.
E pensar que basta fazer o óbvio, o que é certo. Aqui no Espírito Santo o governo do Estado dá o exemplo. Nota A no Tesouro Nacional por 13 anos consecutivos, agora Nota A+, e o menor endividamento líquido da série histórica.
Chega de mitos. Ninguém aguenta mais os juros altos. Basta falar a verdade e fazer o que é certo.
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