Em meio à maior pandemia do século, tendo o isolamento social como única medida eficaz para diminuir a propagação do coronavírus, foram proibidas as aglomerações humanas, fechados restaurantes, bares, shoppings e impostas sérias restrições ao funcionamento das tradicionais feiras livres.
Muitos ainda não perceberam que os maiores prejudicados dessa pandemia são os agricultores familiares, heróis anônimos e invisíveis. Responsáveis diretos pela rotina diária nas lavouras, não conseguem vender nas feiras, pelas distâncias e também pela falta de organização deles. No entanto, mesmo numa situação de extrema gravidade como a atual, correndo riscos do contágio e diante de tantas incertezas, eles estão garantindo a oferta desses produtos. Por sua vez, o segmento do agronegócio, menos impactado, continua sustentando a balança comercial brasileira.
Importante relembrar que, entre 1970 a 2000, foram implantadas no Brasil as Centrais de Abastecimento - Ceasas, com objetivos de organizar a distribuição atacadista e estimular a produção hortigranjeira. No entanto, essa política pública foi mais benéfica para os atacadistas, atravessadores e caminhoneiros, que, além de isentos dos riscos inerentes à produção de perecíveis, continuaram explorando os pequenos agricultores.
A partir de 1990, a principal mudança nesse setor foi o incremento das vendas pelas grandes redes de supermercados, que passaram a comprar direto nas zonas de produção, criando seus próprios centros de distribuição, sem passar pelas Ceasas. Mais recentemente, houve grande expansão das feiras dentro dos shoppings, priorizando a oferta de produtos orgânicos.
Portanto, esses últimos 50 dias de pandemia foram mais benéficos aos agricultores do que os últimos 50 anos, forçando-os a criar novos canais de vendas, diminuindo a intermediação e aproximando-os dos consumidores. Assim, passaram a fazer entregas em casa, através do sistema “delivery”, com uso do WhatsApp e das redes sociais, além do despertar para uma ação mais associativa.
Por último, acredita-se que a tendência de aproximar o produtor do consumidor não tem mais volta, o que deverá levar o aparato governamental também a se adequar à nova realidade. A título de exemplo, as redes estaduais de assistência técnica e extensão rural deverão garantir um apoio técnico gratuito e de qualidade, cada vez mais voltado para a agricultura familiar, com foco na comercialização e na organização dos agricultores, para atuarem de forma associativa e mais solidária.
Este vídeo pode te interessar
O autor é engenheiro agrônomo, diretor administrativo do Incaper.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.