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É pós-graduado em Diplomacia e Relações Internacionais e mestre em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local

Primavera de Havana: ditadura em Cuba vive seu maior desafio

Opressão do governo, cenário econômico e consequências da pandemia servem de combustível para que as manifestações ganhem as ruas, e povo cubano tem a grande chance de encontrar a liberdade

  • Thomaz Tommasi É pós-graduado em Diplomacia e Relações Internacionais e mestre em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local
Publicado em 18/07/2021 às 10h00
Manifestantes exibem cartazes contra regime de  Miguel Díaz-Canel em Havana, Cuba
Manifestantes exibem cartazes contra regime de Miguel Díaz-Canel em Havana, Cuba. Crédito: Reuters/ Folhapress

Em pleno verão caribenho, a ilha da “revolução socialista” recebe fortes ventos primaveris, que balançam as estruturas do governo ditatorial que comanda o país. Mas essa corrente de ar potente não tem a ver com questões ligadas ao campo da meteorologia ou do meio ambiente. É bem verdade que Cuba muitas vezes sofre por receber a visita indesejada de furacões, mas desta vez, as estações do ano podem ser cambiadas pelas mãos de seu povo e não por algo ligado a natureza.

A primavera foi, em pelo menos três momentos históricos, tema que saiu do campo das ciências ecológicas e passou para as sociais. A Primavera dos Povos, que ocorreu em 1848 e foi uma série de movimentos revolucionários na Europa Central e Oriental, é quem cunha o termo. Teve em seu cerne um povo que cansou dos abusos impostos pelas monarquias, que produziram caos econômico, problemas sociais e dor. No ano de 1968, a Primavera de Praga ganhou as ruas e teve como palco a Tchecoslováquia. Parte da URSS, os tchecos, liderados por intelectuais e pelo eslovaco Alexander Dubcek, que ascendeu ao posto máximo do país quando se tornou líder do Partido Comunista, decidiram fazer reformas, promovendo uma “desestalinização”, por meio de novos arranjos ao sistema comunista local.

Outro fenômeno marcante foi a Primavera Árabe, que ocorreu nos países do Norte da África e se alastrou por todo Oriente Médio. O estopim é na Tunísia, com a autoimolação de Mohammad Bouazizi, de 26 anos, que por meio da venda de frutas e legumes em um carrinho de mão sustentava sua família com 8 integrantes. Ele foi o retrato do tunisiano médio, que sofria nas mãos de uma ditadura corrupta. Esse ato ocorreu após um fiscal, sistematicamente, cobrar propina para que ele pudesse trabalhar. A revolta de Bouazizi foi o combustível para o país entrar em ebulição, o ditador Bem Ali, que ficou por mais de 23 anos no poder, caiu e teve de fugir às pressas.

Sentimos a Primavera Árabe até hoje, seja pelo número de ditaduras que ruíram, seja pela Guerra da Síria, que permanece sangrando seu povo. Nesses três momentos relatados, governos autoritários e populações revoltosas se chocaram, causando desde pequenos estremecimentos até derramamento de muito sangue. Mas os ares primaveris podem estar dando as caras outra vez no Planeta Terra, numa região paradisíaca do globo e num país que se orgulha de ser o bastião do socialismo idealizado por Marx.

Desde o domingo do dia 11 de julho, o povo cubano tomou as ruas, clamando por liberdade política, econômica e social. Por serem raros os momentos de ruas tomadas após a Revolução Cubana, imaginou-se que apenas traumas institucionais pudessem ser um risco para rebeldia popular. Um momento de atenção foi quando Fidel Castro morreu e o mundo se perguntou como seria a Cuba pós-Fidel. Mas o Partido Comunista conseguiu seguir seu projeto, mantendo as rédeas da nação e passando o poder das mãos de outro Castro, o Raúl, para o atual presidente do Conselho de Estado, Miguel Díaz-Canel.

Como o regime cubano foi instalado em 1959, suas bases de sustentação sofrem por desgaste natural. O Estado interfere em tudo, as regulações invadem direitos individuais e a forma com que a população convive com isso parece ter chegado à exaustão. O que é marcante nessa possível Primavera de Havana é o fato de, em mais de 60 anos, esta ser essa a primeira vez que os cidadãos tomam as ruas de ponta a ponta da ilha. Além disso, os gritos e o clamor são expressos nas palavras de ordem: “liberdade” e “abaixo a ditadura”.

A opressão por parte do governo, o cenário econômico e as consequências da pandemia servem de combustível para que as manifestações ganhem as ruas. Tudo por lá encontra muita semelhança com as outras “primaveras”, além de Díaz-Canel dar sinais parecidos ao de outros ditadores, seja por tentar controlar a internet, seja por conclamar que seus apoiadores tomem as ruas, para confrontar os “contrarrevolucionários”. Não sabemos o que reserva o futuro, mas uma coisa é certa: eis que a ditadura cubana vive seu maior desafio e eis que seu povo tem a grande chance de encontrar a liberdade, mas para isso é fundamental que consigam trocar as estações do ano, saindo do verão e entrando na primavera.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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